
“Com inteligência artificial generativa, a pesquisa fará mais por si do que alguma vez imaginou”, começou por dizer Liz Reid, a nova líder de Pesquisa da Google, durante o evento anual I/O. “O Google vai fazer o googling por si”, anunciou.
Aquilo que Reid mostrou no palco em Mountain View (Califórnia, Estados Unidos) é o início de uma revolução no motor de busca, que vai mudar a forma como pesquisamos informação online. A gigante usou uma versão customizada do Gemini, o seu modelo IA, para criar uma nova camada que vai aparecer na página de resultados.
Chama-se AI Overview (Resumos de IA) e é um painel em que a informação está pesquisada, digerida e organizada automaticamente. Em vez de obter páginas com links que têm de ser visitados um a um, o utilizador recebe um resumo com as melhores opções e passos seguintes. A novidade começa a ser expandida para todos os utilizadores nos Estados Unidos esta semana e “em breve” chegará a mil milhões de pessoas que usam o motor de busca Google, prometeu Liz Reid.
“Toda esta área de pesquisa de informação está a ser revolucionada e transformada através da utilização da inteligência artificial”, sintetizou Francisco Jerónimo, vice-presidente associado da divisão de dispositivos na IDC EMEA, que assistiu ao evento e falou ao Dinheiro Vivo no rescaldo.
“Vamos deixar de perder tempo na pesquisa, porque essa análise vai-nos ser oferecida automaticamente por ferramentas de IA”, salientou. “É uma forma completamente diferente de trabalhar e vai exponenciar a nossa capacidade mais criativa, porque deixamos de ter de passar horas e horas a pesquisar informação e analisá-la.”
Com uma alteração tão grande, teremos um apocalipse na área de SEO - Search Engine Optimization?
“Não diria que vai arruinar quem se dedica à otimização de motores de busca, vai obrigar a que tenham de reformular a forma como trabalham”, consideru Francisco Jerónimo. “Até agora, toda essa otimização estava direcionada ao motor de pesquisa e vai ter de ser feita para as ferramentas de IA, porque vão ter essa capacidade de interpretar os dados.”
A questão também foi colocada pelos jornalistas à diretora de gestão de produto Hema Budaraju, que explicou a estratégia da empresa numa mesa redonda à margem do evento.
“O AI Overview não é apenas para ajudar as pessoas com um bom ponto de partida, também é para o ecossistema e para garantir que recebe tráfego”, afirmou. “Os links aparecem como parte do AI Overview.”
Budaraju admitiu que “há muitas camadas” nesta mudança, quando foi questionada sobre se os editores de sites vão perder visualizações e se a Google tem planos para partilhar receitas com esses sites aonde irá buscar a informação apresentada, mas que podem receber menos visitas.
“Estamos muito empenhados em assegurar que temos um ecossistema vibrante”, reiterou. Sobre partilha de receitas, nada de novo. Mas a responsável salientou que os seus testes não indicam uma quebra de visitas nos sites, pelo contrário. “Esses sites e links incluídos tendem a receber mais tráfego”, garantiu.
Ainda assim, a AI Overview não vai ser apresentada sempre. Budaraju disse que há questões complexas que não têm apenas uma resposta e em que a funcionalidade pode não ser a melhor forma de mostrar resultados.
Certo é que esta é uma transformação fundamental que mostra as capacidades do Gemini em termos de raciocínio, planeamento e multimodalidade. O utilizador pode até passar a fazer perguntas com vídeos: por exemplo, apontar a câmara para uma torneira com problemas e perguntar como resolver.
“A Google está a demonstrar não só as capacidades da IA mas também como é que elas vão estar embutidas nas aplicações e naquilo que fazemos no dia-a-dia”, frisou Francisco Jerónimo, que considerou várias das demonstrações muito interessantes. “É trazer essa inteligência para as ferramentas que usamos no e-mail, nas fotografias, no telefone, de uma forma que é percetível, simples e útil.”
Uma notícia relevante para o mercado português é que a funcionalidade “Help me Write” (ajuda-me a escrever) no Google Docs e Gmail vai passar a estar disponível em português e espanhol, depois de ter sido lançada em inglês no ano passado. Aparna Pappu, diretora-geral do Google Workspace, disse que começará por ser português do Brasil e depois será adicionado português europeu, quando garantir o nível de qualidade adequado. Com Gemini, o Gmail também será capaz de condensar informações de grupos de e-mails e organizar melhor a informação.
Outras novidades saídas do I/O são o lançamento do gerador de vídeos Veo, que vai concorrer com o Sora, a visão de assistentes digitais personalizados do Project Astra, o Gemini 1.5 Flash e adições de segurança e privacidade no Android alimentadas por IA. A app Gemini terá um funcionamento muito mais natural e próximo do utilizador.
“A própria aplicação do Gemini poder interagir com o telefone e com a câmara de uma forma mais avançada do que vimos com o ChatGPT, é algo que vai ser muito bem recebido por parte dos utilizadores”, considerou Francisco Jerónimo. A IDC acredita que haverá um super-ciclo de renovação de smartphones por causa da IA. “Aquilo que a Google demonstrou é que este conceito de um assistente digital permanente nas nossas mãos está a materializar-se”.
O analista disse que é crítico a empresa combater a perceção de que a OpenAI vai na frente, porque “isto é uma guerra que quem avançar primeiro vai ganhar”.
Jerónimo considerou que esta versão do Gemini é mais interessante do que o GPT-4o apresentada pela OpenAI um dia antes do I/O, mas que o ChatGPT tem maior reconhecimento.
“No momento em que as pessoas utilizam o ChatGPT, é muito difícil irem a outro quando essa alternativa não é muito melhor”, afirmou. “Esse é o grande risco que a Google corre neste momento. Se eu, como utilizador, passo a usar as aplicações da OpenAI e da Microsoft em vez de usar as da Google, o negócio deles vem todo por aí abaixo, porque baseia-se na pesquisa e na publicidade.”