Governo. Novo programa finta guerra e leis laborais

Documento entregue aos deputados é, grosso modo, o caderno com que o PS foi a eleições. É para cumprir integralmente - se a conjuntura ajudar.
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A invasão russa da Ucrânia, há 37 dias, deixa os planos do governo para os próximos quatro anos praticamente intocados face aos compromissos assumidos frente a eleições. O programa da legislatura, entregue ontem no Parlamento, não deixa cair medidas mas também não dá respostas às ondas de choque do conflito nos mercados da energia e nos preços suportados por empresas e famílias. Não foi feito para responder à conjuntura, diz o Executivo, mas vai depender dela para ser cumprido.

Se o programa é, grosso modo, a plataforma eleitoral conhecida a 3 de janeiro, como reconheceu a ministra da Presidência, Mariana Vieira da Silva, traz algum "reajustamento", antecipado pela ministra dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes. Designadamente no reforço dos compromissos com NATO e União Europeia e nas metas de transição energética e da "soberania alimentar", que poderá ser preciso "acelerar".

De resto, o documento remete para um "um pacote integrado de medidas que tenha em conta a preservação da capacidade produtiva do país, a ajuda às empresas com dificuldades de tesouraria e às famílias e a defesa contra os aumentos exponenciais do preço da energia e dos bens alimentares". Mas que só vai ser conhecido com a proposta de Orçamento para 2022.

"Não sabemos ainda todos os impactos que a situação na Ucrânia vai ter. Um programa de governo é um conjunto de respostas para o médio e para o longo prazo, que necessariamente é influenciado pela conjuntura, mas não pretende responder à conjuntura", justificou ontem Vieira da Silva.

Certo é que para avançar com as medidas do programa - que incluem desde alívio fiscal ao trabalho a algumas valorizações salariais no Estado e melhorias nos apoios sociais para a redução da pobreza - a conjuntura vai contar. E o governo prevê, até aqui, uma expansão do PIB em 5% e perspetivas melhoradas para procura interna e externa, de acordo com o Programa de Estabilidade ainda preparado pelo ex-ministro João Leão.

"Não abandonámos nenhum dos compromissos. Isso prende-se com a expectativa de que a conjuntura que vivemos não nos impedirá de até ao fim da legislatura poder retomar o caminho de crescimento e de modernização que vínhamos seguindo. Esta é a avaliação que fazemos agora, com o contexto que temos e com o contexto que o cenário macroeconómico nos dá. Não sabemos como é que esta situação evoluirá, quanto tempo durará, que impacto terá", acautelou a ministra da Presidência.

Entre as medidas replicadas no programa que os deputados vão discutir a 7 e 8 de abril está a elevação do salário mínimo para os 900 euros até 2026, assim como a promessa de reduções graduais nas taxas de IRS para trabalhadores e na estrutura de IRC para empresas com boas práticas salariais, num acordo de rendimentos que o governo voltará a pôr na mesa da concertação social. Aqui, o governo compromete-se a abdicar de receita fiscal, falando em "neutralidade orçamental na melhoria dos rendimentos dos portugueses". Este acordo, adiado desde início de 2020, é para fechar até julho.

Estas são medidas fiscais que vão além de desdobramento de escalões de IRS, alargamento do IRS Jovem, atualização do mínimo de existência e extinção do pagamento especial por conta das empresas, que tornam à votação parlamentar em quadro de maioria socialista.

Na Segurança Social, o governo também reforça investimentos em creches e retoma a gratuitidade faseada destes equipamentos até 2024. A garantia para a infância, para um mínimo de apoios às famílias vulneráveis no combate à pobreza infantil, também fará caminho, assim como a unificação das prestações sociais não contributivas. O governo continua a comprometer-se com aumentos extraordinários das pensões mais baixas e quer repor o valor de referência do complemento solidário para idosos e da prestação social para a inclusão acima do limiar da pobreza.

Os compromissos já assumidos com a função pública também são retomados. Já na revisão das leis laborais, interrompida no final de 2021, o programa do governo omite alterações negociadas com PCP e Bloco de Esquerda para revalorização das horas extra e subida da compensação por cessação de contratos. A ministra da Presidência, ontem, também não confirmou se o governo irá mantê-las. "A proposta de lei entregue está em condições de voltar a ser discutida na Assembleia da República", disse apenas, assegurando que o texto não volta à concertação social.

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