O governo continua a considerar que haverá "muita dificuldade" em eliminar quotas de avaliação de desempenho que atualmente limitam as melhores pontuações a 25% dos trabalhadores dos serviços públicos, mas avança que quer ligar a avaliação de serviços à avaliação dos trabalhadores, admitindo um "ganho de quota" para os serviços que tenham as melhores notas.
A majoração de quotas nos serviços com melhores avaliações "não estará longe dos nossos objetivos", indicou em conferência de imprensa o secretário de Estado da Administração Pública, José Couto, nesta sexta-feira, após a primeira reunião com os sindicatos da função pública para discutir a revisão do subsistema integrado de avaliação de desempenho da Administração Pública, uma discussão que o governo pretende estender até ao final do ano para, em princípio, ter efeitos práticos apenas em 2023.
Segundo José Couto, o governo admite a possibilidade de "a distribuição de quota poder ser feita de acordo com a avaliação dos próprios serviços e, portanto, poder haver um ganho de quota para os serviços que tenham melhores avaliações, porque temos de estar centrados na prestação de serviços públicos". "É esse o objetivo: que os resultados tenham consequências, e que os trabalhadores sintam que esses resultados dependam também deles".
Num memorando de princípios para a revisão do SIADAP entregue aos sindicatos, o governo refere o objetivo de "recuperação dos efeitos da distinção de mérito dos serviços", que assegurava uma majoração para 35% das quotas de avaliação de desempenho nos melhores serviços até 2013, ao mesmo tempo que fala no "eventual aumento de quotas".
José Couto não indicou, porém, se a ideia é recuperar essa mesma majoração, nem tão pouco revelou, para já, como a proposta de anualização de avaliações - atualmente, bienais - se vai refletir numa aceleração de progressões, que tem vindo a ser referida como objetivo pela ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, Alexandra Leitão.
"Sobre essa matéria, direi apenas aquilo que já foi dito, sem prejuízo de fazer todas as clarificações quer entender convenientes. A própria anualização tem um efeito de aceleração das progressões. Se tenho um ciclo de dois anos e passo para um, tenho uma aceleração das progressões pela lógica do sistema", respondeu aos jornalistas, sem clarificar a forma como a anualização de avaliações se repercutirá nos saltos salariais permitidos pela Tabela Remuneratória Única.
"Teremos de ver em que termos exatos o podemos fazer, porque todas as atitudes e as decisões que temos a tomar têm de ser sustentadas, também tendo em conta o momento em que vivemos", afirmou. "Reconhecemos que dez anos, com os atuais ciclos bienais é muito tempo para que as pessoas tenham uma perspetiva de carreira, mas todas as decisões têm de ser ponderadas no âmbito da sua sustentabilidade e da correlação com outros instrumentos: financeiros, orçamentais, estratégicos e outros".
O documento do governo entregue aos sindicatos também propõe a simplificação das etapas de avaliação, e um sistema informático novo para que seja realizado o processo. José Couto assegura que tal não vai reduzir as instâncias em que os trabalhadores podem contestar eventuais deficiências de avaliação (atualmente, a contestação é assegurada com a eleição de uma comissão paritária onde estão representantes dos trabalhadores e dos serviços).
"É ponto de honra não diminuir garantias aos trabalhadores", afirmou."O que está em causa é rever o modelo, que facilite o procedimento, mas não eliminar garantias. Isso não, muito claramente".
O SIADAP, no seu modelo atual, recebe várias críticas dos sindicatos, e também da Missão Pública organizada, uma organização de trabalhadores, que não estando nas reuniões desta sexta-feira também pretende contribuir com propostas para o processo de revisão. A existência de quotas de avaliação é a maior crítica, mas também se pede maior transparência e participação dos trabalhadores nas avaliações de serviços de chefias num mecanismo que é visto como ineficaz e não poucas vezes negligenciado pelos próprios serviços públicos.
No atual processo de revisão, o governo reconhece que "há um conjunto de situações que atrapalhou a aplicação do SIADAP". Desde logo, o congelamento de carreiras da função pública na sequência da última crise e até 2019.
"A própria experiência histórica que fomos tendo com o SIADAP defraudou algumas expectativas gestionários que se pretendia ter com o sistema de avaliação. Isto, só por si, fez com que se desvalorizasse de alguma forma o sistema. Por outro lado, encontramos hoje um sistema burocrático e pesado que queremos simplificar", referiu José Couto.
O objetivo do governo é prosseguir negociações até ao final deste ano, mas mantendo a previsão, para já, de que quaisquer mudanças apenas tenham efeito em 2023, ano de início do próximo ciclo avaliativo. Em 2021, iniciou-se um novo ciclo de dois anos. "Não faz sentido interromper ciclos de gestão", diz José Couto, mas sem descartar a discussão de outras possibilidades com os sindicatos.
*Com Paulo Ribeiro Pinto