Grandes marcas internacionais em busca das joias portuguesas

A pandemia roubou negócio, mas trouxe também novos clientes em busca de soluções de proximidade. Uma "oportunidade única" que o setor não quer deixar fugir.
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A pandemia foi especialmente dura para os setores da ourivesaria e joalharia nacionais que, com os mercados fechados e as lojas encerradas, perderam mais de 30% do seu volume de negócios e metade das exportações. Em contrapartida, a covid-19 trouxe oportunidades, com as grandes marcas internacionais a procurarem a produção nacional como alternativa aos mercados asiáticos. Recuperar o "brilho" perdido é a grande aposta do setor, que conta com um programa de apoio à internacionalização de 30 milhões de euros para os próximos três anos.

"Acreditamos cegamente que o futuro das joais portuguesas está na internacionalização e na capacidade das empresas em fazerem esse percurso, agregando mais valor", explicou ao Dinheiro Vivo o novo presidente da Associação de Ourivesaria e Relojoaria de Portugal (AORP). João Faria quer ajudar as empresas a recuperarem a projeção externa perdida com a pandemia, através de uma "presença constante e regular" nas feiras e outros palcos da moda internacional.

"Quem não está é facilmente esquecido. Já somos um país pequeno, se não começarmos a marcar presença regular, como os outros países fazem, nunca vamos conseguir consolidar nada", refere. O programa de apoio à internacionalização prevê o envolvimento de cerca de 60 empresas, tendo sido escolhidos quatro mercados - Reino Unido, França, Itália e Estados Unidos - como prioritários. "Temos de marcar presenças nas semanas da moda de Londres, Paris, Milão e Nova Iorque, e nas principais feiras de referência, como a Vicenzaoro, em Itália, e a Inhorgenta Munich, na Alemanha. Além de que pretendemos organizar um evento em Nova Iorque nos próximos dois anos", avança o responsável. Ainda este ano, em junho, o setor pretende marcar presença na JCK, em Las Vegas, certame que é uma referência na joalharia nos Estados Unidos, com um pavilhão de Portugal.

Oportunidade "única"

João Faria reconhece que a ourivesaria nacional nunca será uma grande indústria, como o calçado ou o têxtil, quanto mais não seja porque "toda a gente usa sapatos e roupa, mas nem toda a gente usa joias", contudo, não tem dúvidas que Portugal tem todo o potencial para ser "o fornecedor de joias" das grandes marcas internacionais na Europa, mesmo sendo um setor de microempresas. "Eu próprio tive marcas francesas que me procuraram porque faziam tudo na China e na Tailândia e passaram a produzir tudo na Europa. E esta é uma oportunidade única de que temos de tirar partido, não os deixando voltar para a Ásia", diz.

Para o presidente da AORP, a proximidade, que permite poupanças importantes nos custos de transporte, além da redução substancial do tempo de espera, são fatores que favorecem Portugal. "A rapidez com que conseguimos assegurar as entregas e a qualidade que temos fazem com que o preço deixa de ser o primeiro fator de desempate na escolha do fornecedor", garante. E a tradição do made in Portugal na ourivesaria e joalharia é um ponto importante a favor, sustenta.

Mas nem tudo é fácil. A falta de mão-de-obra é um problema que impede muitas empresas de crescerem. O setor conta com dois grandes pólos industriais - Gondomar e Póvoa de Lanhoso -, a que se juntam cerca de uma dezena de empresas no centro de Guimarães. Em estudo está a abertura de um novo pólo formativo do Centro de Formação Profissional da Ourivesaria e Relojoaria, que funciona em Gondomar.

João Faria não consegue estimar quantas pessoas estão em falta na indústria, mas dá conta que, por exemplo, o Instituto do Emprego e Formação Profissional de Guimarães não tem nenhum inscrito da área da joalharia. "Há uma grande falta de profissionais. Por exemplo, nos cravadores, que é uma seção ainda mais difícil do que a de ourives-joalheiro, qualquer um que apareça, no dia seguinte está contratado", refere. A solução tem sido tentar contratar funcionários da indústria metalúrgica, que já têm algum contacto com metais, e formá-los.

Expansão

A digitalização é outra das grandes áreas de aposta. "Este foi, durante muitos anos, um problema do nosso retalho. As lojas não estavam preparadas para estar nas redes sociais e muito menos para ter uma loja online. Hoje já perceberam, muito graças à campanha de digitalização que a AORP empreendeu, que podiam ter as suas joias a serem mostradas ao mundo à distância do simples clique de uma fotografia. A partir do momento em que perceberam, começaram-se a criar muitas lojas online", diz João Faria. Admite que as vendas no exterior por e-commerce não representam ainda uma grande percentagem, mas assume que o objetivo é reforçar esse caminho.

Sem números ainda de 2022, a AORP estima que as vendas do setor se tenham aproximado já dos valores pré-pandemia, embora as exportações estejam ainda aquém dos 208 milhões de euros exportados em 2018 e 2019. "Neste momento, estamos a exportar cerca de 60 milhões de euros, com um grande peso do mercado francês e alguma coisa para o Brasil, Suiça e Estados Unidos, mas temos que muito rapidamente chegar, no mínimo, aos 100 milhões. É um número ambicioso, mas acho que temos potencial para lá chegar nos próximos dois anos", frisa João Faria.

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