"Tal como Inglaterra veio buscar enfermeiros a Portugal há uns anos, estão a vir buscar os nossos alunos”. O cenário é traçado pelo presidente da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril (ESHTE), Carlos Brandão, que garante que a procura internacional pelos estudantes portugueses de turismo está a aumentar..Grécia, Espanha, Inglaterra, Itália, Croácia, Moçambique, Malta, Alemanha, Bélgica, Brasil, Países Baixos, República Checa, Costa Rica, São Tomé e Príncipe, Tunísia e Dubai são alguns dos países que procuram estagiários na escola superior. Convencer os futuros profissionais do setor a ficar em Portugal é cada vez mais difícil e os salários oferecidos são o principal argumento..Depois da pandemia, a Grécia começou a olhar para a escola do Estoril como uma mina de ouro nos recursos humanos e, no ano passado, cerca de 80% dos estágios internacionais de alunos finalistas de licenciatura foram realizados neste país. “São cadeias hoteleiras de luxo que dão condições excelentes, pagam entre 800 euros a 1200 euros a um estagiário, com alojamento incluído. São contrapartidas muito boas para um estagiário”, admite o presidente da instituição de ensino..Este ano, o grupo hoteleiro de luxo do Dubai, Jumeirah Hotels and Resorts, fez frente à Grécia com uma oferta de 100 vagas de estágios nas suas unidades. Aos alunos portugueses oferece as viagens, alojamento, seguros, alimentação, ginásio e uma remuneração mensal de 500 euros. Os estágios decorrem durante os meses de verão, depois do fim das aulas. Carlos Brandão admite que está sem mãos a medir e que a oferta começa a ser superior aos alunos disponíveis, cerca 140..“Espero que consigamos ter o número de alunos suficiente para preencher todas as vagas no Dubai. Penso que nos vamos aproximar, até agora temos 80 inscritos. É muita gente para a nossa dimensão, mesmo que colocássemos quase todos os estagiários de gestão hoteleira, iriam praticamente todos e ainda temos os outros protocolos”, diz. Para o presidente, a qualidade do ensino e as capacidades técnicas dos alunos da ESHTE são a grande mais-valia que as várias empresas internacionais reconhecem nestes estudantes..Os estágios de final de curso são a primeira porta que se abre para o mundo profissional e muitos dos que vão para fora acabam por ficar a trabalhar no estrangeiro. “Um assistente de sala, por exemplo, consegue ganhar quatro mil euros na Inglaterra ou na Alemanha. Em Portugal, num cargo de assistente de direção hoteleira vai receber pouco mais de mil euros. Há sempre muitos alunos que vão querer ir para fora porque os salários são mesmo muitíssimo superiores. Estamos a falar de duas ou três vezes mais”, aponta..No mês passado também a Emirates realizou uma ação de recrutamento para tripulantes de cabine nas instalações da escola. O responsável da ESTHE admite que a companhia aérea dos Emirados Árabes Unidos está de olho nestes alunos pela formação sólida que têm e pelas competências linguísticas. O objetivo, diz, será transferi-los posteriormente para outras funções operacionais dentro da empresa e para as quais são necessárias aptidões mais vastas no turismo. Atualmente, está também a ser fechado um protocolo com os Estados Unidos para encaminhar estudantes para a Walt Disney World Resort, na cidade de Orlando..São cerca de dois mil os alunos que frequentam os vários cursos da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril (ESHTE), como direção e gestão hoteleira, gestão turística ou produção alimentar. Todos os anos há mais procura do que oferta e as vagas, cerca de 410, são todas preenchidas. “Há muitos, infelizmente, que já não consideram sequer ficar em Portugal. Entram para os cursos já com o objetivo de sair”, lamenta. .Aumentar salários para fixar portugueses.A falta de recursos humanos no turismo em Portugal não é um problema novo e, nos últimos anos, tem sido a mão-de-obra estrangeira a sustentar as necessidades do setor. Apesar de as escolas de turismo do país estarem cheias, o destino final de grande parte dos estudantes portugueses é fora de portas. O também professor da ESHTE considera que está a “haver uma descaracterização” do serviço e alerta que é preciso mudar o paradigma para fixar os estudantes..“Os grandes grupos nacionais começam a sentir já a falta da qualidade e da identidade nacionais. Há, claramente, fatores que nos distinguem: a bonomia, a capacidade de adaptação e a simpatia, Aquele desenrasque que é tão valorizado noutros países e que se começa a sentir falta. Tal como nós estamos a emigrar, há muita gente que está a emigrar para Portugal. Agora interessa saber é se é essa a mão-de-obra que as empresas querem e julgo que não. Os nossos grupos têm de começar a perceber que, se querem reter, têm que oferecer melhores condições”, alerta..Carlos Brandão não tem dúvidas de que “a questão remuneratória” é a primeira que tem de ser revista, mas há outros pontos a considerar. “O setor tem de começar a olhar a sério para a questão da gestão dos recursos humanos. Pensarem que os trabalhadores não podem servir só para resolver problemas nos picos no verão. Se querem fixar mais ativos nacionais, têm de pagar, oferecer planos de progressão de carreira, horários melhores e olhar para as questões de bem estar social”, sugere.