Em tempos como este, é difícil pensar para além do dia de amanhã. Em tempos como este, é forçoso pensar para além do dia de amanhã. Nem que seja olhando para o passado, mais ou menos longínquo. Em 1918, por exemplo, ainda havia guerra e a chamada gripe espanhola grassava. Acabada a guerra, nem por isso os governos, e o Estado, perdem protagonismo, convocados, agora, por propósitos de reconstrução, mas também devido à necessidade de combater os efeitos da "influenza".
Finda a guerra, conquistara-se a paz. Ou talvez não. Por essa altura, emergia uma personagem que marcaria a economia política: John Maynard Keynes. Conselheiro nas negociações da paz, abandona os trabalhos antes de ser assinado o Tratado de Versalhes. As razões expõem-nas em "As consequências económicas da paz", um libelo em que antecipa as terríveis consequências que a humilhação da Alemanha terá, a prazo. No seu entender para, realmente, se ganhar a guerra era necessário ganhar a paz. Saber ganhar. Uma empreitada difícil, no rescaldo de um conflito marcado por atrocidades inomináveis, em que a célebre trégua, no Natal de 1914, simboliza quanto o "homem comum" de ambos os lados é, realmente, nestas guerras, na guerra, "carne para canhão".
Aconteceu um armistício, calaram-se as armas, não se ganhou a paz. Faltaram estadistas capazes de irem além do rancor, da humilhação, da vingança cruel, impondo à Alemanha condições económicas e financeiras impossíveis de serem cumpridas, indutoras da hiperinflação (1921-1923) que marcaria o subconsciente do povo alemão para sempre. Em poucos anos, o partido nazi haveria de conquistar o poder, primeiro por um expediente e, depois, num misto de terror e apoio popular.
Voltemos ao presente, sem esquecer este passado, estranhamente paralelo. Guerra e pandemia. Guerra e paz. Inflação. E essa ideia: para se ganhar a guerra é necessário ganhar a paz. Um conflito que começou com um discurso de ódio, que vencerá se se tornar recíproco. Antes disso, e por isso, haverá quem comece a pensar a paz? Candura? Para que haja futuro.
Alberto Castro, economista e professor universitário