Muito se tem falado acerca da necessidade de se criar habitação acessível, especialmente em zonas de grande pressão urbanística, onde a procura é maior. Este é um tema que merece a nossa atenção, numa altura em que o Governo propõe que os municípios fiquem encarregues de imóveis devolutos e os coloquem no mercado de arrendamento acessível - uma ideia incluída no decreto-lei "Função Social da Habitação", que reforça que a casa "é um direito de todos" e que o Estado deve fazer parte do processo.
Ao longo do tempo, e ao contrário do que era suposto, a iniciativa pública e a iniciativa privada não conseguiram encontrar um equilíbrio e, hoje, a resposta continua a ser insuficiente. Apenas 2% do atual parque habitacional é público, um valor muito aquém do da média da Europa, já que vários países apresentam números com dois dígitos.
Há uma carência de resultados por parte do Estado no que toca a este assunto. Acredito que as atuais políticas públicas de habitação ainda devem ser trabalhadas para atingirem, finalmente, aquilo que o setor pretende: respostas céleres e adequadas.
Fornecer incentivos a quem constrói para arrendar, e não apenas para quem compra, é algo prioritário, bem como a diminuição da carga fiscal. Depois, claro, deve-se caminhar num sentido de redução dos preços da construção - e não de subida abrupta, como estamos a observar. Caso contrário, toda esta instabilidade permanecerá. As famílias, tanto do segmento médio, como as mais carenciadas, não conseguem suportar custos tão elevados. Se os rendimentos não são compatíveis com os preços praticados, qual a solução?
O desconhecimento acerca dos programas de incentivo existentes ainda é grande, e o mercado desleal continua a persistir. Têm de se unir esforços entre sociedade, setor privado e setor público para que a habitação acessível seja uma realidade.
Com a chegada do Plano de Recuperação e Resiliência, que promete, no total, 2.782 milhões de euros para programas públicos de habitação, aguardo por um maior e mais adequado investimento neste sentido. Apesar de acreditar que a lógica associada à entrega do dinheiro poderia ser aperfeiçoada, já que sai favorecido quem fizer primeiro o pedido de fundos, e não quem mais precisa, penso que Portugal tem várias ferramentas para construir, de forma promissora, o seu caminho.
A economia atual não deve ser um fator impeditivo para que sejam disponibilizados imóveis a quem mais precisa deles. Devemos aproveitar a "bazuca" europeia para dignificar os espaços e ajudar as famílias. Esperemos que se perceba que são dois os conceitos que nos vão ajudar a, finalmente, cumprir o desejo antigo de criar habitação acessível: reabilitar e construir entre parceiros privados e públicos.
Nuno Garcia, diretor-geral da GesConsult