Quase 30 anos depois, a Herdade da Matinha passou de uma casa com quatro quartos para um estabelecimento com 36 quartos, áreas diferenciadas para adultos, famílias, jovens ou grupos, espaços comuns que parecem casa, um restaurante que recebe, não raras vezes, consumidores que não são hóspedes, e um espaço natural de fazer inveja a muitos refúgios naturais.Implementada numa área de 110 hectares, que foi crescendo ao longo dos anos, consoante a capacidade de investimento - ou, como Alfredo Moreira da Silva costuma dizer, consoante o entendimento dos bancos que lhe deram os créditos -, a Matinha tem garantido reconhecimento internacional pela sua intervenção na natureza. Ou pela sua não-intervenção, no caso. O projeto Re-Gen, que foi iniciado em 1995, tenta precisamente regenerar o território, fazendo voltar ao Alentejo aquilo que são a flora e a fauna autóctones, que garantem a sustentabilidade dos solos e o equilíbrio ambiental. Com a ajuda de Universidades e especialistas, a Matinha tem-se focado na reflorestação com espécies nativas e práticas de conservação da biodiversidade, o que se tem revelado muito eficaz para restaurar habitats, promover a biodiversidade e criar ecossistemas mais resilientes às mudanças climáticas. E, no ano passado, a iniciativa foi nomeada para o Earthshot Prize, uma iniciativa do príncipe William e da The Royal Foundation que destava e premeia soluções criativas que enfrentam os desafios ambientais globais mais urgentes.Apesar de não ter ganhado, Alfredo Moreira da Silva reconhece a sua importância. E é por isso mesmo que, conta ao Dinheiro Vivo, quer dedicar-se mais a este projeto e também à divulgação artística que sempre fez questão de ter na Herdade da Matinha. O que significa deixar a parte da hospitalidade e restauração entregue aos filhos mais novos: Mateus e Santiago voltaram da Austrália, onde viveram nos últimos anos, e hoje assumem a cozinha e a direção da sala do restaurante. “O Mateus é formado em Gestão, pela Universidade Católica, o que descansa muito os bancos”, atira com uma gargalhada Alfredo. “O Santiago é formado em Turismo, e passou por hotéis como o Ritz. Precisamos deles para ter um melhor serviço, mais consistência”, admite. “Eu estudei na Escola de Artes Decorativas Soares dos Reis. Trabalhei na indústria têxtil e depois dediquei-me à pintura.” E, mais tarde, foi acumulando a regeneração ambiental a estes interesses. Por isso mesmo, o empresário prepara-se agora para ficar responsável, sobretudo, por estas áreas - que incluem transformar a Matinha no ponto de Turismo Cultural para a região, não apenas com obras suas, mas também de artistas que possam ser convidados, e que vão até contar com a curadoria de uma personalidade ainda a anunciar. “Paguei grande parte da dívida que tinha acumulado, sobretudo durante a pandemia, e que nos estava a estrangular mensalmente, e quando os meus filhos me disseram estar dispostos a pegar no negócio, o que aconteceu no mês passado, já o receberam com uma dívida perfeitamente gerível”, conta ainda ao DV. O facto de o restaurante, com um conceito farm to table, estar a conseguir dar um maior contributo na faturação está também a ajudar positivamente a operação, que Alfredo espera vir a manter-se, mais do que sustentável, positiva e a crescer durante os próximos anos.Para isso, espera, vão também contribuir os projetos da área ambiental - encontra-se atualmente em conversações com a várias empresas, vizinhas de território da Herdade da Matinha, para a elaboração de iniciativas comuns que incluem Educação, troca de conhecimento e de recursos para ambos os lados - e da área artística.“O Santiago e o Mateus nasceram aqui, na Herdade. Esta é a casa deles. Acho que têm a vontade e a capacidade de fazer disto um projeto para durar. E eu posso dedicar-me, mais tranquilamente, àquilo que também sei fazer melhor”, diz, enquanto se recosta na cadeira, pronto para se ir juntar aos filhos que têm um grupo de amigos a jantar consigo, na noite em que falámos com o proprietário da Matinha.“Aprende-se imenso com estes miúdos, não é?”, atira-nos em jeito de pergunta retórica antes de se levantar para dar seguimento ao negócio que criou, quando ainda ninguém falava de sustentabilidade, e que voltou a trazer o verde à Serra do Cercal.