Há anos que não vejo um anúncio português hilariante. Desde o Gato Fedorento e do Último a Sair, que não vi mais nenhum programa de televisão capaz de me deitar a rir.
Comédias publicadas não me lembro de nenhuma; pelo menos referida pela crítica, que é avessa ao sentido de humor e é, tendencialmente, de esquerda. No parlamento, o sarcasmo e a ironia são recursos praticamente ausentes tanto à direita como à esquerda: o que se vê, quase sempre, é um teatrinho de emproadas e artificiais indignações, uma coisa velha, do tempo das outras senhoras. Não. O problema não é excesso de humoristas de esquerda, é deficit de humor.
Eu só conheço dois humoristas com piada; dois que são três: o Ricardo Araújo Pereira e o Bruno Nogueira/João Quadros. Os outros são todos muito fraquinhos e só têm piada muito de vez em quando. Claro que são quase todos de esquerda, e aí o historiador tem razão. Mas a ausência de humoristas de direita não me parece ser sintoma de uma conspiração da esquerda que governa as redacções para parar o pungente humor conservador. É antes um sinal de que a direita é débil no desafio das convenções; e não há humor sem desafiar convenções. Ridendo castigat mores, dizia-se lá mais atrás.
Ora se não há humoristas de direita é porque os de direita não castigam os costumes. Ao contrário, tendem a fazer deles a sua causa, como é da cartilha do bom conservador.
Brincar com os disparates e as convenções da esquerda seria tarefa para a direita, se a direita fosse capaz. Mas o humor de direita não é um humor público, é um humor de salão. Faz-se entre amigos, longe de ouvidos indiscretos e das senhoras, e nunca à frente da mãe. Para se ter piada é preciso ser-se mauzinho, refilão, malcriado, ordinário, até, e a direita, a nossa direita pelo menos, tem na boa-educação, nas boas maneiras, o mais central dos seus valores. E fazer humor bem educado é uma contradição. Humor bem educado é humor de catequese, de tribunal, de academia; é o humor do respeitinho, da facécia fina e não da gargalhada.
Mas também à esquerda há muito humorista do respeitinho. Também as elites de esquerda são conservadoras. Também, para elas, há muita coisa com que não se brinca, e por isso os seus humoristas fazem pouca piada das convenções da esquerda - talvez com medo de serem banidos do convívio dos seus pares. Nesse aspecto, tanto o RAP como a dupla Bruno Nogueira/João Quadros, são os mais livres.
Seria muito bom sinal que a direita tivesse um sentido de humor público. Seria sinal que tinha perdido a vergonha - que é a primeira e a mais necessária das qualidades para se fazer humor - e que as muitas, inúteis e improdutivas convenções da esquerda (que são tantas como as da direita) estavam a ser devidamente sovadas.