IKEA. Como entrar em casa de clientes inspira o negócio dos nórdicos

Oito meses depois de ter chegado a Portugal, o diretor de marketing da IKEA apresenta a primeira campanha sob sua orientação. E explica os detalhes.
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Em janeiro, quando Riccardo Navone aterrou em Portugal, em vez de ir direto a casa meteu-se em casa dos portugueses. Bem, pode não ter sido exatamente assim, mas quase. Uma das prioridades do novo diretor de marketing da IKEA em Portugal foi arrancar com as home visits - as visitas que a equipa da multinacional faz a casas de locais - no Porto e em Lisboa, onde a marca já tem lojas, e no Algarve, onde a empresa de mobiliário se prepara para abrir a quinta loja portuguesa, já em 2017.

Foi dessas visitas que veio a nova campanha da IKEA, “Na minha casa eu só tenho de ser eu”, uma verdadeira afirmação de liberdade - criativa e pessoal -, e o primeiro trabalho visível do novo diretor de marketing, pelo menos aos olhos dos clientes. “O filme reflete a missão da empresa: contribuir para uma vida melhor em casa, para a maioria das pessoas”, esclarece. “De um lado, queremos oferecer soluções para a maioria das pessoas, dos consumidores. Não somos elitistas, isso vem da história da empresa. Por outro lado, na vida do dia a dia. Não oferecemos um fim de semana de felicidade. Focamo-nos nos 365 dias que ficam depois do fim de semana. E, para fazer isso, temos de conhecer as pessoas”, sublinha.

Riccardo viveu no Brasil durante quatro anos, regressou a Itália aos 11, mas a língua de Camões e Pessoa ficou. A escolha da IKEA para que o italiano assumisse a direção de marketing para o mercado português foi justificada, não só pelo domínio do idioma como pela experiência. Passou pela Unilever, Tupperware e Lavazza, o gigante do café, antes de se juntar a outro gigante, desta feita do mobiliário. O que, aos 53 anos, levanta dúvidas até a um veterano do marketing. A oportunidade de vir para Portugal surgiu casualmente, “como quase tudo na vida”.

“Participei numa seleção para uma posição para diretor de marketing em Itália e acabei por vir trabalhar para Lisboa porque alguém descobriu que eu falava português. Para uma grande empresa, com tamanho global, é quase impossível recrutar alguém de fora com mais de 50 anos. Recrutar um diretor de marketing de fora, sénior... Não quero dizer que não faça sentido mas é estranho. Nem sei se eles percebem isso internamente mas esta cultura, para mim, vem da sociedade sueca. Os valores da empresa, a relevância e o peso que se dá às pessoas, isso reflete-se em tudo nesta empresa”, conta.

Mal chegou a Lisboa, nos planos do diretor de marketing para um mercado como o português num universo IKEA, estava consolidar a notoriedade da marca, indo ao encontro dos diferentes - e em constante mutação - tipos de clientes.

Daí a importância das home visits, as visitas às casas das pessoas. “Há coisas que são comuns a todos os países e outras muito específicas”, conta. “Com as visitas descobrimos que a casa funciona verdadeiramente como uma embaixada, um território neutral. Quando as pessoas estão em casa estão na sua própria dimensão. Sentem-se livres de fazer aquilo que lhes apetece”, detalha.

Daí à escolha de uma mulher - a personagem central do anúncio - com superpoderes que vão desde a gestão e organização de tarefas, passando pelas artes marciais e pelo peso de um saco permanentemente às costas - foi um trabalho de poucos meses. “Quisemos passar a mensagem de que apesar das pressões da sociedade na qual vivemos, que nos reclama o desempenho de muitos papéis e distintas personagens, a casa é uma área de liberdade. E cada um pode ter a sua maneira de ver a casa”, diz Riccardo. É aí que entra o papel da empresa: no impacto que pode ter ao nível dos consumidores. “Gostamos de dizer que a IKEA é um facilitador para uma melhor vida em casa, para que cada um viva da melhor maneira a sua casa”, assinala.

A campanha focada na casa enfatiza a importância do espaço como área onde cada um pode viver livremente através de “uma linguagem mais dinâmica mas, ao mesmo tempo, voltando ao território de ação da marca que é a casa”, detalha.

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Riccardo Navonne, director de marketing do IKEA.
(Leonardo Negrão/Global Imagens)[/caption]

O filme - gravado pela JWT Lisbon sob o comando do realizador Lance P. Soares Kelleher - acompanha o lançamento do catálogo que começou a ser distribuído pelas caixas de correio na última semana de agosto, e parte dessa ideia de que as pessoas são “o centro da atuação da empresa no desenvolvimento dos produtos, na tentativa de perceber o estilo de vida, a expectativa, os sonhos” em todos os países onde a marca está presente. “O conteúdo do catálogo tem muito de editorial e integra cada vez mais histórias e pessoas. Temos uma base de dados de imagem gigante mas acreditamos que há histórias que precisam de ser contadas”, explica Riccardo, sobre a estratégia que vem sendo seguida pela empresa.

Em todo o mundo, a empresa produz e distribui mais de 211 milhões de cópias do catálogo, que serve como preparação para as coleções lançadas pela marca a nível mundial e local, a cada três meses. “Considero esse meio global o ‘milagre laico’ da marca. Acho-o uma ferramenta que nenhuma empresa poderia replicar facilmente. É uma enorme vantagem competitiva. E é por isso também que muita gente espera com grande expectativa o seu lançamento”, explica.

Nem só de móveis se vive a IKEA

Mas, se para conhecer as novidades anuais, os clientes esperam ansiosamente pelos catálogos em papel, a IKEA arrancou já em 15 países com o negócio online e espera lançar a loja portuguesa em breve.

A ideia é que a venda online funcione como complemento às lojas físicas e faça, ao mesmo tempo, mudar a experiência dos clientes em cada uma das plataformas. “Quanto mais os consumidores se habituam a comprar online, mais a loja tem um papel que vai além de vender coisas. Deve ser mais um local de inspiração e serviços, e a experiência de compra deve ser melhor. Caso contrário, as pessoas vão pensar que é mais fácil comprarem em frente ao computador. Temos de nos habituar a uma realidade cada vez mais multifacetada: com a tecnologia, a realidade não é uma, é feita de muitas realidades mais pequenas e diferentes, muitos cinzentos. E isso, do ponto de vista do marketing, é um desafio enorme”, diz. Também por isso, o negócio da IKEA abre cada vez mais o leque de atuação: agora, não se trata só de mobiliário, design e decoração de casa.

Este ano, Portugal aposta na área dos pequenos negócios, um nicho já explorado noutros mercados. E continua a apostar na aproximação à culinária e ao modo de vida dos portugueses, um objetivo óbvio quando se olha para a aposta deste ano nos restaurantes das lojas: uma francesinha vendida a 4,95 euros.

Em 2015, a IKEA Food (área de negócio que inclui o restaurante, a cafetaria, a loja sueca e a cantina para colaboradores, teve um volume de negócios de 1,57 mil milhões de euros, a nível global. “A iluminação é perfeita, o som é agradável e há pessoas que vêm de propósito para comer. Comem mas não compram nada nas lojas.”, brinca Riccardo, talvez nem desconfiando de que há um ditado português que bem explicaria esta conquista pela boca.

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