O tecido empresarial português é composto por 96% por microempresas e 99,3% por micro e pequenas empresas. Isto é, no fundo o nosso tecido empresarial é constituído esmagadoramente por empresários e/ou empreendedores que, no fundo, são trabalhadores por conta própria.
Contudo, apesar desta supremacia esmagadora não só em número mas também em contribuição para o produto interno bruto nacional, estas empresas não têm qualquer tratamento preferencial sendo, mesmo, tratadas e equiparadas, até, às grandes empresas e/ou multinacionais, contrariando em absoluto o princípio da igualdade que assenta em "tratar igual o que é igual e diferente o que é diferente".
E aqui residem enormes diferenças. Infelizmente o atual "Estado vazio" em que nos tornámos assenta num regime podre, focado na "engorda", através de taxas e de impostos e de uma máquina estatal corrompida, cada vez maior e resilientemente ineficiente.
Em memória de Jorge Sampaio, diria que tem de haver mais vida para além das taxas, taxinhas e dos impostos brutais. Precisamos de inovação e de muito mais inteligência e seriedade na forma de fazer política e
na gestão do nosso país.
Por isso, partilho 5 propostas concretas que podem ser implementadas de imediato, em especial, nesta fase de negociação do Orçamento do Estado para 2022, que visam fortalecer e valorizar esmagadora maioria do tecido empresarial português. Vejamos:
1. Isentar (e/ou, no mínimo, fixar num valor irrisório) as taxas e os emolumentos dos registos notarias e societários
Fará sentido que um ato de incidência jurídico-comercial (atas, mudanças de gerência, alteração de sede, alteração de pacto social, etc.) custe o mesmo valor para uma micro e pequena empresa e para uma grande empresa e/ou multinacional? Claro que não. Tem de existir o devido ajuste,
2. Definir um custo residual para as comissões bancárias
Hoje, qualquer empresa (independentemente do tamanho) é obrigada a ter um IBAN (número internacional de conta bancária) e os bancos, todos, privados e/ou públicos, cobram o que querem aos empresários, em especial os micro e pequenos. O Estado, enquanto regulador, deve e pode impor limites ao preço cobrado por este serviço pelas instituições bancárias ou, até, dar o exemplo (como devia dar!) e apresentar uma solução isenta nas instituições bancárias e financeiras que controla.
3. Primeiro as pessoas, depois as taxas e os impostos
As micro e pequenas empresas têm um papel crucial na economia e na sociedade. Estas empresas devem pagar impostos mas, apenas e só, após a garantia do pagamento dos respetivos salários. Pois, o que importa, antes de mais, são as pessoas e os trabalhadores (claro que não estou a considerar o salário dos sócios, pois isso será outra conversa). Em caso de inexistência de faturação e/ou de tesouraria para fazer face às obrigações tributárias dever-se-á criar uma isenção (não faz qualquer sentido que uma empresa sem vendas registadas num determinado momento, continue a pagar e a antecipar impostos por uma atividade inexistente).
Temos de ter, no mínimo, uma compensação tributária. Não podemos pagar a um Estado que nos deve.
Devíamos pensar num plano de pagamento para o cumprimento das obrigações tributárias sem juros e por um prazo ajustado e dilatado de modo a permitir oxigénio financeiro à realidade de cada micro e pequena empresa é também uma questão básica de viabilidade económica e financeira de um tecido empresarial frágil como o nosso.
Fundamentalmente, não faz sentido que continuemos a consentir que se "saque primeiro dinheiro para os impostos e para o Estado e depois, e se houver, aí sim, pagar-se os salários às pessoas".
4. Não podemos pagar impostos sobre uma fatura não recebida
Uma micro e pequena empresa que faturou mas não recebeu não pode continuar a ter o ónus de lhe serem exigidas taxas e impostos sobre um valor que ainda não recebeu. Não faz sentido que o Estado esvazie a tesouraria das empresas (em especial das micro e pequenas empresas) por um imposto sobre uma receita não recebida e que depois sugira o endividamento bancário subsidiado mas oneroso para fazer face à tesouraria que retira. Não
faz sentido.
O nosso Estado/governo tem de ser, sempre, parceiro das empresas. E, aí, em especial, das micro e pequenas empresas que representam 99,3% do tecido empresarial nacional.
5. Executar e desproteger quem não cumpre
Vivemos num País onde quem fica a dever é protegido. E uma fatura emitida mas não paga não é, por si só, um título executivo bastante para a comprovação e execução de uma dívida. Esta situação para além de não proteger as micro e pequenas empresas, apenas protege o prevaricador, o devedor e quem não cumpre e que, sabendo disto, joga, normalmente, com o sistema aproveitando-se da morosidade dos processos que os favorecem e suportam. Isto não pode ser. Isto não pode continuar.
Porque não pensarmos numa solução, como acontece noutros países, como no Brasil por exemplo, onde as faturas das micro e pequenas empresas são emitidas num sistema centralizado e automaticamente aceites pelas partes envolvidas (credor e devedor) e em caso de incumprimento são, de imediato, pagas e cobradas pelo próprio Estado. É crucial a criação de um mecanismo de cobrança de faturas/créditos vencidos deste género.
Pensemos, o Estado (governo e ministérios), ao invés de estar a criar fundos de pseudo-biliões de euros que não chegam às empresas, criaria um mecanismo de antecipação de créditos vencidos, substituindo-se ao credor (micro e pequena empresa) - aliás como já o faz para o Grupo Mello - garantindo, depois, a respetiva cobrança coerciva (através da Autoridade Tributária).
Se já existe esta experiência porque não fazer dela regra? Se já existe esta exceção para a Via Verde, onde falamos de dívidas mínimas, porque não aplicar este mecanismo ao serviço das micro e pequenas empresas?
Só desta forma geraremos um ambiente empresarial ético em que não compensa nem é vantajoso ser-se devedor. Só desta forma protegeremos e garantiremos a tesouraria merecida (sem endividamento!) do tecido empresarial nacional. Fica um contributo para fortalecermos e protegermos os nossos empresários, as nossas empresas e, por isso, a nossa economia e todos nós.
Para se governar é preciso "descer à terra" e conhecer, pensar, melhorar e resolver os problemas existentes.
Empresário