Lavoro. Aqui nascem as botas dos militares e bombeiros

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Empresa de Guimarães quer duplica os 15 milhões de faturação até 2023. Uma das apostas está em complementar a oferta com vestuário e acessórios de proteção

É em Guimarães, na ICC - Indústria de Comércio e Calçado, a líder nacional no calçado de proteção, que são fabricadas as botas usadas pelos bombeiros portugueses, bem como por diversos contingentes militares portugueses no estrangeiro. A marca é a Lavoro e foi criada por Teófilo Ribeiro Leite, engenheiro mecânico, que fez todo o seu percurso na Campeão Português, o expoente máximo do calçado nacional nos anos 80, e que, em 1986, decidiu autonomizar o calçado profissional na ICC. Hoje fornece desde o setor primário, como as minas, a indústrias variadas e os serviços, como a logística, e fatura 15 milhões de euros. O objetivo é duplicar o valor, em cinco anos no máximo. Estuda já complementar a sua oferta com vestuário de proteção para bombeiros, mas não só.

Sediada em Guimarães, a empresa conta com um quadro médio fixo de 220 trabalhadores, contratando, em média, 15 a 20 trabalhadores novos funcionários por ano para “reforço das equipas”. O CEO, Teófilo Leite garante que a Lavoro contribui, ainda, para a empregabilidade indireta de mais 300 pessoas, pelo menos, em Portugal, mas, também, na Ásia e no Brasil. Com uma produção anual de 500 mil pares, a empresa assegura, em Guimarães, todo o desenvolvimento de produto e fabrico das primeiras séries, mas a escassez de mão-de-obra em Portugal tem-na levado a reforçar as parcerias estratégicas para a produção das gáspeas (a parte de cima do sapato) no Brasil, na China e na Índia, onde tem uma “presença importante” em Chemai, Calcutá e Kaepur.

Exporta quase 90% do que produz para cerca de 50 mercados, nos cinco continentes. Já trabalham como o Canadá, mas pretendem desenvolver ações nos Estados Unidos. A Europa ainda pesa cerca de 60%, pelo que a intenção é reforçar a marca no Médio Oriente, na Ásia e em África: "Vemos com muito interesse e potencial o crescimento nos países africanos de língua oficial portuguesa por via dos setores primários em que estamos especializados, como a agricultura e a floresta, ou a indústria extrativa", refere.

Calçado militar

O calçado militar, um nicho de mercado “difícil”, mas no qual a Lavoro conta com uma experiência de 25 anos, e que representa já cerca de 12% do seu volume de negócios, é outra das áreas em que pretende reforçar a sua presença. “A NATO tem vindo a exigir maior contributo dos parceiros europeus e nós somos parceiros do IDD, o consórcio das indústrias e defesa, a organização governamental que visa desenvolver a indústria da defesa nacional e participar no reequipamento das forças armadas da Europa. Nós queremos potenciar isto com os mercados africanos e do Mercosul”, explica o CEO.

A investigação tem sido uma aposta desde sempre na ICC. “Sem percebermos de pés não entendemos nada de calçado e, desde a primeira hora, privilegiamos as ligações aos centros de saber internacionais do sector”, diz Teófilo Leite. Além de laboratórios próprios, a empresa conta com uma podologista nos seus quadros, responsável pelo seu Spodos Foot Science Center. Todo o calçado da Lavoro é desenvolvido “à medida” das necessidades dos clientes, sendo estudado “anatómica e ergonomicamente” para dar resposta às especificidades do pé feminino e masculino, mas também das diferentes indústrias que fornece, da metalomecânica à construção civil, passando pela logística, pela hotelaria e restauração e pela agricultura e florestas, onde dá especial enfoque aos bombeiros.

Foi no Spodos Foot Science Center que a empresa fez o estudo antropométrico aos pés de 230 militares portugueses, o que permitiu o desenvolvimento da sua Combat Boot, criada em parceria com o Citeve - Centro Tecnológico das Indústrias Têxtil e Vestuário de Portugal. É produzida em duas referências, para clima temperado e para clima tropical, sendo um equipamento de proteção individual “mais ligeiro, ergonómico e de última geração, com capacidade adicionais de resistência ao calor e à chama". É impermeável, anti-perfurante, capaz de regular a temperatura do corpo, e tudo o mais que se imagine que um soldado necessita.

Digitalização 3D dos bombeiros

A Lavoro calça, ainda, os bombeiros nacionais, “a custos reduzidos e com uma bota única de combate a incêndios”. A bota Fénix é um produto que desenvolveu em parceria com a Universidade de Coimbra. O desafio era criar um produto que resistisse a temperaturas da ordem dos 500 graus centígrados, como é habitual nos incêndios florestais. O que obrigava a que não só a borracha das solas fosse resistente à chama, mas as próprias colas teriam de o ser também. A primeira versão das botas fénix chegou ao mercado em 2015, e a segunda, “com uma nova geração de materiais, que lhe asseguram características melhoradas” chegou em 2018. Custam cerca de 150 euros, cem euros menos do que as da concorrência, de origem alemã, e que, ainda por cima só garantem resistência a impactos térmicos da ordem dos 350 graus.

Mas esta parceria com a Associação Nacional de Bombeiros Profissionais não se fica por aqui. A Lavoro está a proceder a um estudo antropométrico dos bombeiros portugueses – digitalização 3D do corpo, incluindo mãos e pés -, com o apoio da Universidade do Minho, para melhorar a proteção, a funcionalidade e o conforto do vestuário e acessórios de proteção individual dos bombeiros. O objetivo é, a médio prazo, alargar a sua atividade a outros equipamentos de proteção individual, numa lógica de complemento da oferta.

O estudo, que está a ser dinamizado em todo o país e se vai prolongar por seis meses, permitirá referenciar medidas e definir padrões médios para o fabrico do vestuário e do calçado de proteção. Teófilo Leite admite que “em equação está a produção de vestuário para bombeiros, mas, também, para outras profissões”. A produção visará o mercado global, estando a decorrer as negociações para a definição de parceiros para a área produtiva. “Prevemos ter os primeiros produtos em comercialização em meados de 2020”, diz.

Entrega em 24 horas

Nos últimos dois anos, a empresa investiu cerca de um milhão de euros, em infraestruturas, em investigação, na conceção de novos modelos e na conquista de novos mercados. Já até ao final de 2020 prevê investir mais três milhões, que incluem um recém-inaugurado armazém na Povoa do Lanhoso, o reforço da robotização da fábrica, em Guimarães, e o novo laboratório de controlo de qualidade. Em curso estão vários projetos de investigação relacionados, por exemplo, com o conforto térmico e com o desenvolvimento de calçado para diabéticos.

“Temos capacidade de produção disponível – contamos com cinco máquinas de injeção às quais temos vindo a fazer upgrades no sentido de as tornar compatíveis com a Indústria 4.0 -, precisamos, apenas, de aumentar a distribuição”, explica Teófilo Leite. Para melhorar esta área, a ICC investiu num novo armazém, na Póvoa do Lanhoso, que lhe permitiu duplicar os stocks. Hoje tem, permanentemente, 70 mil pares de sapatos, para as várias profissões e do tamanho 33 ao 53, disponíveis para entrega, em 24 horas, em qualquer um dos 50 mercados em que opera. Mas o objetivo é chegar aos 100 mil pares em stock, o que representará três milhões de euros, permanentemente, dentro de portas. E, por isso, faz uma monitorização permanente aos seus modelos e produtos, de modo a que aqueles que entram em declínio sejam rapidamente postos de parte e substituídos por novos lançamentos.

O digital é, também, uma prioridade. Além de estar presente nas grandes plataformas de e-commerce, como a Amazon e a Dott, a ICC criou um portal B2B onde os clientes podem encontrar todos os pormenores das especificidades técnicas dos vários modelos da Lavoro, mas também os stocks disponíveis para entrega imediata e a conta corrente do próprio cliente.

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