Transpor para a legislação nacional em 2020 o Código Europeu das Comunicações Eletrónicas (CECE) era uma ambição do governo conhecida desde novembro de 2019. Cerca de um ano depois, em finais de outubro, depois de nove meses de trabalho do grupo CECE - com representantes do regulador (Anacom), dos operadores (Apritel) e dos consumidores (Deco e Secretaria de Estado de Comércio e Serviços e Defesa do Consumidor) - a opção foi fazer a transposição direta, sem os contributos nacionais, para cumprir o prazo, que terminava a 21 de dezembro. Mas não chegou a acontecer, nem está ainda definida uma data.
"O projeto de diploma de transposição do CECE já entrou no circuito legislativo do governo, esperando-se para breve o agendamento e aprovação em Conselho de Ministros e posterior remessa à Assembleia da República", diz fonte oficial da Secretaria de Estado das Comunicações, liderada desde setembro por Hugo Santos Mendes.
Apesar de não contar com os contributos nacionais, o governo assegurava em outubro que os direitos dos consumidores não seriam afetados. "Relativamente às matérias relativas aos direitos dos utilizadores (como as regras das fidelizações e cessação antecipada dos contratos), todas as matérias que decorrem efetivamente da legislação comunitária são de harmonização máxima e portanto serão integradas no ordenamento jurídico português, beneficiando os utilizadores de comunicações eletrónicas dos mesmos direitos que os restantes cidadãos europeus", garantia a Secretaria de Estado das Comunicações.
De fora está o serviço universal (SU) de cabines telefónicas. "O projeto de transposição não inclui a oferta de postos públicos no âmbito do serviço universal, a qual, nos termos do CECE, teria de ser justificada de acordo com circunstâncias nacionais", adiantou a mesma fonte ao Dinheiro Vivo.
A dona da Meo, antiga prestadora do serviço das cabines telefónicas, não concorda. "A Altice Portugal entende que a disponibilização de postos públicos deve permanecer incluída no serviço universal, devendo tal solução ficar consagrada na transposição do CECE para a legislação nacional, ainda em curso", defende a operadora.
O serviço previa o pagamento de 2,5 milhões de euros para 8222 postos públicos instalados em hospitais, prisões, tribunais, escolas ou centros de dia. Um financiamento assegurado pelo Fundo de Compensação, para o qual contribuem todos os operadores.
O fim deste serviço - à semelhança do da rede fixa - foi proposto pela Anacom, dada a baixa utilização dos serviços. Em abril de 2019, o governo decidiu prorrogar por mais um ano o contrato com a Meo encarregando a Anacom de lançar um concurso público. Motivo? "Ainda que estatisticamente não muito relevante em relação ao número de postos públicos, a verdade é que no último ano ainda se fizeram 3,1 milhões de chamadas a partir desses postos. Importa por isso melhor avaliar se este serviço deve continuar a ser oferecido, com que características e âmbito geográfico", justificava a Secretaria de Estado, à data liderada por Alberto Souto de Miranda. Em novembro, o Constitucional chumbaria a prorrogação do contrato com a Meo.
"Atualmente não existe nenhum serviço universal de comunicações eletrónicas em vigor. Sem prejuízo do exposto, o governo mantém a possibilidade de determinar a sua reinstituição caso, em função dos critérios legalmente aplicáveis, tal mecanismo se revele como necessário e adequado a garantir que toda a população portuguesa possa aceder aos serviços essenciais de comunicações eletrónicas", admite a Secretaria de Estado das Comunicações ao Dinheiro Vivo.