Lyoness: O negócio de milhões que ninguém conhece

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É raro que uma pesquisa no Google

sobre uma multinacional com 2,6 milhões de membros praticamente não devolva notícias sobre ela. A maioria dos resultados, além dos sites nacionais da empresa, são discussões em fóruns e sites de análise, cujo

tópico mais comum é: alguém já ouviu falar disto? Será que isto

é uma fraude?

A pergunta debruça-se sobre a Lyoness,

empresa austríaca que em 2012 se instalou em Portugal, num

escritório alugado pela Jones Lang LaSalle no Atrium Saldanha. No

site português, as vantagens são explicadas assim: "a Lyoness

oferece aos seus membros dinheiro de volta a cada compra" e

"consegue uma situação única win-win-win para todos os

participantes."

Ou seja, lucram os utilizadores finais - "os

membros recebem dinheiro de volta" - e os parceiros, visto que

"as empresas aderentes ganham clientes habituais e concedem-lhes

benefícios especiais."

Fernando Grave, diretor geral da

Lyoness Portugal, revela ao Dinheiro Vivo que a empresa conquistou

três mil membros do Cartão Cashback no primeiro ano, "sendo

expectável atingir os vinte mil membros no final de 2013." Em

termos de lojas aderentes, estão registadas "três cadeias de

lojas que funcionam com cartões presente originais", representando

450 locais de venda, 49 pequenas empresas "que são pontos de

aceitação do Cartão Cashback" e ainda 46 lojas online, "a sua

maioria a funcionar num sistema de marketing de afiliação."

Segundo explica o responsável, a

condição base da relação entre a Lyoness e as empresas aderentes

é a atribuição de um desconto, que se transforma numa percentagem

de dinheiro de volta aos consumidores. Por cada compra que faz dentro

da rede, o cliente recebe 2% de volta. "Assim acumulam-se

continuamente na conta de pagamentos pessoal uma quantia crescente.

Esta é depositada, a partir de um certo valor, sem deduções na

conta privada do membro", lê-se no site. Melhor ainda: quem

recomendar a Lyoness recebe 0,5% das compras do membro angariado

(bónus de amizade direto) e se ele recomendar a Lyoness a um novo

membro, recebe mais 0,5% das compras (bónus de amizade indireto). O

registo é gratuito, sendo no entanto "dada a possibilidade de

efetuar um pré-pagamento, e com isso construir a sua equipa de uma

forma mais ativa." Este pagamento pode ir dos 150 aos dois mil

euros e dá posições diferentes no esquema de bónus, a equipa de

que fala o diretor.

Há quatro modalidades de compras a que

o utilizador final pode aderir: "Cartão cashback", um cartão

que se mostra na loja e permite a recuperação dos 2%; "Cashback

móvel", em que a pessoa compra usando o smartphone; "Compras

online", na rede de lojas disponíveis na internet; e "Vales de

compras cashback", com vales compra originais das empresas

aderentes da Lyoness.

Algumas das empresas que estão

listadas no site da Lyoness Portugal negaram, em declarações ao

Dinheiro Vivo, uma relação contratual com a empresa. "Isto

não tem nada a ver connosco", afirmou fonte oficial da Apple, que

se encontra no site. Também a marca de brinquedos Toys"R Us

garantiu que não trabalha com os cartões Lyoness. A cadeia de

eletrónica Fnac, por outro lado, responde que "não aderiu aos

cartões Lyoness nem estabeleceu nenhuma parceria com esta entidade."

A cadeia refere que "o único contacto que houve com a Lyoness foi

uma venda de cartões oferta Fnac para ações de marketing junto dos

seus clientes." Fernando Grave diz que isto se deve ao facto de

muitas vezes a relação da Lyoness ser "com um afiliado

devidamente autorizado e não diretamente com as empresas anunciadas,

pelo que será normal que algumas empresas desconheçam este facto."

Entre as empresas que confirmaram

trabalhar com a Lyoness, a Adolfo Dominguez do Amoreiras Shopping

referiu que quase não há clientes a usar o cartão, tendo feito a

parceria há seis meses. "Temos a máquina da Lyoness aqui mas

praticamente ninguém usa", explica uma funcionária da loja,

referindo que os clientes habituais não se mostraram interessados.

A Papelaria Charneca Press, na Charneca

da Caparica, aderiu aos cartões "há cerca de 15 dias, por isso é

uma experiência muito recente", segundo a responsável Marisa

Palmeira. Os acessórios estão no balcão e alguns clientes já

utilizam, mas ainda estão "a fazer uma seleção de clientes

habituais para propor o cartão". Alguns demonstram curiosidade e

decidiram aderir por acharem "que é um bom investimento. Os

portugueses gostam de saber que ao gastar estão a ganhar algum."

Na Óptica Infante, a experiência, de três meses "é indiferente,

é apenas mais um pormenor", diz Isabel Costa, referindo que os

clientes "não têm aderido muito".

O que diz a Deco?

Ana Sofia Ferreira, jurista da Deco -

Defesa do Consumidor, diz que não se pode afirmar que se trate de um

esquema em pirâmide, acusação frequente na internet. "Para ser

considerado um sistema em pirâmide, é necessário que exista um

serviço ou bem que é colocado à disposição do consumidor

mediante a redução do preço ou mesmo a gratuitidade se o

consumidor angariar, direta ou indiretamente, mais clientes para o

fornecedor." A Deco resolveu uma única queixa relacionada com a

Lyoness, de um consumidor que pagou os dois mil euros para ganhar

posição no esquema de bónus e acabou por se arrepender, dentro do

prazo de 14 dias de resolução livre. Como o reembolso demorava, a

Deco interveio. A jurista é clara: "O consumidor não pode entrar

com o único intuito de ir angariando clientes e com isso ser

remunerado." Aconselha os consumidores a verificarem se é um

serviço que lhes interessa, quais as empresas aderentes e perceber

se o objetivo de aderir é obter os benefícios do cartão e não de

se tornarem angariadores daquela empresa - é isto que constitui a

"bola de neve" proibida por lei.

(act.)

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