Mais de um terço dos trabalhadores domésticos em Portugal ganham abaixo do salário mínimo nacional (SMN), indica uma estimativa da Organização Internacional do Trabalho (OIT) publicada ontem num relatório que assinalou dez anos da Convenção do Trabalho Digno para o Trabalho Doméstico.
A estimativa considera remuneração por hora, com 36,4% dos trabalhadores aquém do patamar mínimo legal. A OIT calcula que 15% dos trabalhadores recebem o valor do SMN, presumindo que os restantes recebam valores acima deste patamar.
Caso fosse cumprido o valor da retribuição mínima a todos os trabalhadores domésticos, a desigualdade salarial enfrentada por este grupo profissional seria reduzida em 11,4%, de acordo com os cálculos da organização. Essa desigualdade exprime-se em menos 42,3% de salário que os restantes trabalhadores, ou menos 7,6% do que outros trabalhadores pouco qualificados.
No relatório, Portugal surge também entre os países que continuam a permitir o pagamento em espécie a trabalhadores domésticos, com alojamento e refeições a poderem representar até 50% da retribuição para domésticos que vivem em casa dos patrões. Por outro lado, ainda, a proteção da Segurança Social em situação de desemprego aplica-se apenas aos trabalhadores com horário completo.
O documento de balanço da OIT destaca que os trabalhadores do serviço doméstico se mantêm como um dos grupos mais vulneráveis da economia, sendo que em muitos países não gozam de enquadramento na legislação laboral ou na proteção social. Noutros, a implementação das regras deixa a desejar.
A OIT estima que mais de quatro quintos dos trabalhadores domésticos em todo o mundo - 61,4 milhões num total de 75,6 milhões - sejam informais, e a fraca implementação das leis é causa de 34% da informalidade.
O relatório avança também dados sobre o impacto da pandemia, e aponta que em Portugal, pelo menos, um em cada dez trabalhadores dos serviços domésticos ficou sem trabalho na primavera do ano passado. A quebra no emprego foi de 13,5%, comparando informação do fim de 2019 com o segundo trimestre de 2020. Entre os restantes trabalhadores, a diminuição do emprego não foi além dos 3,5%.
Os dados para Portugal refletem apenas o impacto no emprego formal, embora a OIT ofereça estimativas relativamente a outros países. Por exemplo, na Sérvia, no continente europeu, a quebra terá sido de 59,9%. Nos EUA também a perda de trabalho terá sido de 37,7%.
No caso português, mesmo para quem não ficou sem trabalho houve ainda quebras profundas nas horas trabalhadas, que caíram 47,6%. Para os restantes trabalhadores, a diminuição foi de 26,6%.
Em resultado da quebra de emprego e horas trabalhadas, o valor total dos salários pagos a trabalhadores domésticos recuou 6,3%. Excluindo os trabalhadores domésticos (um universo de cerca dos 109 mil pessoas, nos dados da OIT, com apenas 2697 homens), o volume de salários pagos em Portugal avançou 4% no mesmo período.