Durante décadas o mercado foi invadido, influenciado, e até por vezes dominado, pelos marketeers. Especialistas em promover e em conseguir vender este mundo e o outro, criaram as maiores campanhas, conceitos, narrativas e o storytelling. Hoje tudo isso ainda é válido, inclusive o contar de histórias com coração, paixão e propósito. Mas atualmente os consumidores pedem mais do que grandes campanhas de marketing e publicidade, mais do que vendilhões, publicitários e teorias dos ditos gurus.
Cansados da pandemia, traídos pelos vírus e por tantas promessas e previsões macroeconómicas, os consumidores procuram hoje lealdade e confiança. Tal como precisam de um porto de abrigo na família e no emprego, procuram-no nas insígnias que conhecem e em quem depositam a tal confiança, mas também a credibilidade, o interesse e a intenção de compra.
A confiança passou a valer mais, ou mesmo a não ter preço, desde que a pandemia nos assolou e a guerra fez tremer o nosso chão e o nosso (já parco) poder aquisitivo por efeito da subida do custo das matérias-primas e, consequentemente, da subida da taxa de inflação. E se esta é um trampolim para o crescimento das marcas próprias (também conhecidas por marcas brancas) devido aos baixos rendimentos das famílias, a economia comportamental pede mais referências, história, sustentabilidade, credibilidade e transparência.
Esta semana numa brilhante palestra que proferiu no II Congresso das Marcas (numa iniciativa da Centromarca), o conferencista Kevin Roberts, ex-CEO da Saatchi&Saatchi, abanou o "elefante na sala" questionando o verdadeiro poder das marcas na conexão entre as pessoas e pondo em causa os egos e as ideias aparentemente geniais que, alegadamente, têm a assinatura dos melhores marketeers do mundo. "Hoje todos são storytellers, mas isso não chega", ironizou. "A marca não pertence a um criativo ou a um diretor de marketing, a marca não pertence ao público mas ao consumidor. E o consumidor não é só cliente, é antes o nosso parceiro e temos de saber antecipar o que ele está a pensar e vai procurar antes dele próprio o saber".
Olhar o consumidor - e no caso dos jornais, o leitor -, como parceiro é condição sine qua non para continuar a construir uma relação de confiança que ultrapassa ventos e tempestades, venham elas de dentro ou de fora, como por exemplo da Rússia.