Imagino que o leitor esteja a pensar que fui eu que inventei este conceito, mas a verdade é que uma das áreas de aplicação do marketing se prende com pedidos de desculpa. Trata-se, aliás, de uma temática que tem vindo a merecer uma atenção crescente não só por parte de gestores mas também de académicos, em particular na Escandinávia, onde esse assunto é objeto de estudo e investigação.
No mundo dos negócios há variadíssimas empresas que souberam pedir perdão por erros que cometeram. Fazê-lo a tempo e horas e da forma mais correta é a grande receita para ultrapassar situações que, doutro modo, podem ficar fora de controlo. Bons exemplos disso são a forma como a Volkswagen, Samsung, Mercedes e Wells Fargo lidaram com falhas e erros cometidos. Maus exemplos também os há. Basta recordar o modo como a BP lidou com a catástrofe ambiental que causou na sequência de um derrame de petróleo num furo que possuía no Golfo do México em 2010.
Com a crescente "marketização" da política, o mesmo tipo de comunicação de crise tem sido adotado por todos aqueles que, quando pressionados para se demitirem por terem cometido falhas consideradas graves, apostam num pedido de desculpa.
Há casos em que um único pedido de perdão é marcante. Foi o que aconteceu com Bill Clinton quando se viu envolvido no escândalo com Monica Lewinsky. Há, no entanto, outros políticos que se desculpam até à exaustão. Boris Johnson é um grande fã desta técnica de tal modo que já se perdeu a conta a quantas vezes ele o fez no âmbito do Partygate. Só no passado dia 20 de abril numa sessão parlamentar pediu desculpa trinta e cinco vezes em menos de duas horas.
Mas, e chegamos à segunda parte do título deste artigo, a semana que agora finda também foi rica em pedidos de perdão. No início da semana Marta Temido pediu desculpa aos portugueses por todo o caos que se instalou no SNS. Recorde-se que não é a primeira vez que a Ministra da Saúde o faz - em novembro do ano passado fez a mesma coisa em relação aos médicos depois de ter sugerido na Assembleia da República que era necessário contratar profissionais de saúde mais resilientes.
Mas a semana não iria terminar sem um pedido de desculpa decorrente da tragicomédia criada por Pedro Nuno Santos que vai ficar nos anais da política portuguesa. Não vou analisar toda essa situação do ponto de vista político pois outros muito mais habilitados do que eu já o fizeram até à exaustão. Vou antes centrar-me numa perspetiva de marketing.
Qualquer manual dessa área nos ensina que a gestão de reclamações dos clientes envolve quatro fases: reconhecer a falha, fornecer uma explicação para o sucedido, manifestar arrependimento e, last but not least, garantir que isso não voltará a ocorrer. A este respeito, Pedro Nuno Santos - ou os seus assessores de comunicação - demonstraram ter a lição bem estudada.
Em cinco minutos apenas, o ministro reconheceu que errou ("queria desde logo lamentar toda esta situação", foram as suas primeiras palavras), forneceu uma explicação para o sucedido ("erros de comunicação"), mostrou que estava arrependido ("estas falhas tiveram consequências pelas quais obviamente eu me penalizo profundamente") e procurou recuperar a confiança assegurando que uma situação idêntica não voltará a acontecer ("queremos ultrapassar este momento, reconstruir a nossa relação de confiança ... obviamente nós queremos trabalhar, vamos continuar a fazer esta caminhada que já leva quase sete anos, uma caminhada de sucesso").
A tudo isto até acrescentou uma pitada de emoção, ou não fosse Pedro Nuno Santos um político nato, ao assegurar que a ligação a António Costa não é só profissional mas também "uma relação de amizade" (perguntar-se-á o que é que a amizade tem a ver com o assunto, mas enfim). Todavia, e por outro lado, o orgulho do ministro impediu-o de utilizar as palavras "desculpa" ou "perdão". Em substância, fez um pedido nesse sentido, mas teimosamente (não, não foi um lapso) recusou-se a exprimi-lo dessa forma clara.
Em suma, pedir desculpa pode ser um ato de humildade e arrependimento. Mas é apenas o que se coloca num dos pratos da balança. No outro prato estão a responsabilidade, a integridade e a verticalidade. Mais do que a forma e o timing, a verdadeira sabedoria está em saber quando é que se deve pedir desculpa... ou quando é que se deve assumir que a falha foi de tal modo grave que a única forma de lidar com ela é honradamente sair.
Carlos Brito, professor da Universidade do Porto - Faculdade de Economia e Porto Business School