Medidas eram "necessárias". Apoios têm de ser "muito rápidos a chegar"

O país não aguenta novo confinamento, disse Costa há um par de meses, mas é obrigado agora a fazer precisamente isso. Empresas estão preocupadas e aguardam divulgação de apoios que possam ajudar. Supers já se prepararam com online mais robusto e plataformas reforçadas.
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Não podemos repetir hoje a metodologia de março", sublinhava António Costa em novembro, perante o crescimento brutal da pandemia por toda a Europa, uma segunda vaga que se sabia que viria mas "chegou mais cedo" do que se esperava. Assegurava então o primeiro-ministro que a capacidade de resposta do SNS fora revista, "em termos de chamadas da linha SNS 24, testagem e camas de internamento. Aumentámos muito a capacidade". Tudo para assegurar a resposta na saúde e não ter de fechar a economia, cujo "impacto económico e de desemprego no primeiro confinamento foi brutal".

Ontem, não só o governo anunciou o fecho do país, previsto pelo menos por um mês, como a ministra da Saúde enviou aos hospitais um despacho que ordena a suspensão de toda a atividade não urgente, mas também "o diferimento de atividade cirúrgica programada de prioridade normal ou prioritária" -, dado o estado de saturação do SNS e a necessidade de concentração na resposta à covid. Um cenário tornado mais negro pelo avassalador número de casos graves e uma vez que não se organizou uma resposta que integrasse todas as vertentes do sistema de saúde: público, privado e setor social - com o próprio bastonário dos médicos a denunciar que a vacinação não está a chegar aos médicos que exercem fora do SNS.

Como o governo vai ajudar as empresas a aguentar mais um embate brutal, só hoje se saberá - o anúncio caberá ao ministro da Economia, Siza Vieira, e à da Cultura, Graça Fonseca. Mas Costa já foi adiantando qualquer coisa, incluindo o regresso do lay-off simplificado, com acesso automático a empresas que fecham e salário pago a 100% aos trabalhadores.

E assumiu que, ainda "sem estimativas sobre o impacto económico", este será "seguramente bastante relevante" nas contas públicas. "As atuais medidas são adotadas formalmente para 15 dias, mas seria iludir as pessoas não dizer que devemos todos assumir que a perspetiva é que as tenhamos de manter um mês", afirmou o primeiro-ministro.

Ainda sem medidas concretas, vários setores já se assumem "preocupados" com os efeitos de novo fecho semelhante ao da primavera.

Imobiliário receoso, serviços pedem horário diferente

Horários alargados para o comércio que permanecer aberto, para evitar a pressão na afluência dos consumidores, e medidas para evitar que nos supers se venda outros bens cuja comercialização se encontra proibida, como roupa e sapatos, são medidas que o presidente da Confederação do Comércio e Serviços espera ver amanhã. João Vieira Lopes entende que se assim não for se estará perante uma situação de "concorrência desleal" e lembra proibições semelhantes impostas noutros países europeus.

O setor do comércio e serviços, na primeira linha do embate das novas medidas, entende também que o governo terá de aumentar o volume de apoios às empresas forçadas a encerrar e pretende, até ao final do mês, apresentar um conjunto de propostas transversais às atividades que representa. "Não acreditamos que os dinheiros europeus cheguem antes do verão. Neste momento, não se pode estar com grandes pruridos em relação ao défice", defende Vieira Lopes, lembrando que nesta altura muitas empresas já não dispõem da almofada financeira que tinham na primavera (ler ao lado). E estão ainda por disponibilizar apoios prometidos no início de dezembro, como o subsídio às rendas dos estabelecimentos comerciais, sublinha.

O turismo preferiu guardar para hoje reações, depois de conhecer as contrapartidas previstas pelo Estado para apoiar as empresas neste novo período de confinamento.

Para o presidente da APEMIP (Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária), Luís Lima, "adivinham-se tempos verdadeiramente difíceis" para o imobiliário, já que "o negócio da mediação "é feito de pessoas e com pessoas, implica visitas a imóveis e mesmo que as empresas encontrem alternativas por via das visitas virtuais, é muito difícil vender casas sem os interessados as visitarem presencialmente". Luís Lima lembra que desde setembro o setor tem registado "algum arrefecimento decorrente da incerteza promovida pela segunda vaga de covid, com efeitos mais efetivos na estabilidade económica e laboral das pessoas e famílias, o que cria uma tendência de adiamento da decisão da compra de casa".

Sindicato elogia coimas no teletrabalho e escolas abertas

Para a UGT, as novas medidas para o teletrabalho - com coimas agravadas e imposição sem acordo de qualquer das partes - vão ser positivas para aliviar a pressão nos transportes públicos em hora de pontas, preocupação que a central tinha já manifestado na reunião da Concertação Social, na passada semana. "O teletrabalho é fundamental para retirar pessoas deste fluxo de casa-trabalho-casa. O agravamento das coimas vem fomentar a sua aplicação", defende o secretário-geral adjunto, Sérgio Monte, que também vê com bons olhos a continuação das atividades letivas presenciais. "Não podíamos pôr em xeque o futuro. As aulas presenciais ajudam a combater desigualdades que há nas aulas à distância". Mas, "os trabalhadores docentes e não docentes deviam ser prioridade na vacinação", ressalva.

"Concordamos genericamente com as medidas, alguma coisa tinha de ser feita" contra a pandemia, diz Sérgio Monte, juntando que as medidas de apoio já dadas a conhecer - lay-off simplificado e majoração de subsídios Apoiar - são positivas. Faltam agora "medidas de apoio aos trabalhadores e às famílias". A CGTP, confederação sindical também na Comissão Permanente da Concertação Social, irá reagir às medidas do estado de emergência apenas ao final da tarde de amanhã.

Comércio e shoppings esperam apoios rápidos

"Não discutimos as medidas tomadas por cientistas/médicos, se tem de ser tem de ser. O que pedimos é que os apoios às empresas fechadas sejam muito rápidos. É muito importante o lay-off nos moldes do anterior, uma medida fundamental à sobrevivência de muitos negócios", reage também Miguel Pina Martins, presidente da Associação de Marcas de Retalho e Restauração (AMRR). Do outro lado, a Associação Portuguesa de Centros Comerciais lembra que os shoppings são "lugares seguros, pelo que estas medidas, embora compreensíveis, são difíceis de aceitar". Agora, "o Estado tem de avaliar medidas de ajuda", reforça a associação.

Para Gonçalo Lobo Xavier também não há surpresa nas medidas, saudando "o bom senso de deixar cair o limite de horário aos fins de semana" no retalho alimentar, "uma questão de saúde com grande impacto operacional nas cadeias". "Temos indicação de que será permitido o click and collect, que vai permitir que empresas que fecham, como imobiliário e moda, podem manter algum funcionamento", diz o diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED). "Esperamos que o online ajude os associados, mas não compensa a perda do negócio físico.

"Confinamentos extremados só agravam o problema", diz o representante do setor da metalurgia, Rafael Campos Pereira, elogiando escolas abertas e a manutenção em funcionamento do setor. Menos otimista está o representante das empresas do vestuário e confeção, César Araújo. O presidente da ANIVEC lembra que os cancelamentos de encomendas estão a regressar em força e as empresas, que tentam quase há um ano sobreviver, estão "descapitalizadas". E pede "apoios urgentes aos setores exportadores". Em situação semelhante está Paulo Gonçalves, que vê com "apreensão" a situação do calçado. "Temos expectativas quanto ao lay-off simplificado, mas falta informação adicional para avaliar apoios", diz.

Super preparados para novo confinamento

Nos supers já se sente algum aumento da procura, mas as prateleiras vazias do início do primeiro confinamento não deverão repetir-se. Passado quase um ano e duas vagas pandémicas depois, "estamos agora mais preparados", garante o porta-voz da Sonae MC, dona do Continente. Martinho Lopes, administrador do Intermarché, reforça: "Entre o aumento dos stocks de segurança pelo retalho e maior capacidade de resposta pela indústria, a escassez de bens alimentares será a menor das preocupações dos portugueses." Talvez por isso o anúncio de novo confinamento geral não tenha gerado uma corrida às prateleiras. "Não registamos até agora nenhuma alteração nos padrões de consumo, exceto, há várias semanas, uma transferência do fim de semana para os dias úteis, sobretudo a sexta-feira". Na hora de encher o cabaz "conservas e congelados continuam em alta, há mais tickets e o cesto de compras médio é superior em produtos e valor, consequência de mais consumo no lar", junta Acácio Santana, diretor-geral da Coviran Portugal.

Também a Mercadona nota "maior procura nos últimos dias, mas nada comparado com o "açambarcamento" que se verificou antes, e o abastecimento está assegurado", diz a cadeia espanhola, com duas dezenas de lojas em Portugal. Lidl e Dia confirmam e todos asseguram que nem os nevões em Espanha estão a dificultar operações. Há de tudo e tudo funciona normalmente.

Antecipando a necessidade, o Continente ajustou horários para "maximizar segurança e conforto dos clientes", e reforçou a parceria com Uber Eats e Glovo para que os clientes possam encomendar refeições e compras, sem ir ao super.

E o online terá filas digitais?

"Estamos preparados para acompanhar a procura, naturalmente dentro de determinados limites que não poderemos exceder, sob pena de não conseguirmos responder às expectativas dos clientes", sublinha fonte oficial da Auchan, que no primeiro confinamento teve filas digitais na loja online. "Temos vindo a acompanhar o crescimento da procura com mobilização de recursos." Nascida em pandemia, a loja online do Minipreço já previa "dar resposta a picos e excessos de procura", diz Helena Guedes. "Temos um serviço testado em Lisboa e no Porto a crescer acima das expectativas e que tem sido ajustado em função disso. Além de parcerias com as maiores empresas do setor de entregas domiciliárias", acrescenta a diretora comercial do DIA Portugal.

Ao longo do ano passado, no Mercadão - marketplace que, entre outras marcas, assegura entrega rápidas do Pingo Doce - foi reforçando "com centenas de personal shoppers", tendo as entregas crescido oito vezes. "Temos mais de 600 shoppers a fazer entregas no mesmo dia em mais de 100 cidades", diz o CEO, Gonçalo Soares da Costa. "O reforço garante resposta a um novo pico e continuamos a recrutar ativamente, para integrar mais 100 shoppers nas próximas semanas."

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