Medir o progresso

Igor Martins/Global Imagens
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Após as últimas eleições legislativas, inicia-se no país um novo ciclo governativo. Como qualquer outro, os novos ciclos são fundados na esperança de quem acredita que pode melhorar as condições de vida dos seus concidadãos, através das políticas que preconiza. A criação da Comissão sobre a Medição do Desempenho Económico e do Progresso Social pelo executivo francês, apenas alguns meses após o começo do mandato de Nicolas Sarkozy, assim o exemplifica, visto ter surgido como resposta à necessidade, previamente identificada, de garantir um desenvolvimento duradouro.

Coordenada por Joseph Stiglitz, Amartya Sen e Jean-Paul Fitoussi, tal comissão era composta por outros académicos renomados, à semelhança de Anthony Atkinson, Daniel Kahneman ou Kenneth Arrow, e visava a compreensão dos limites do Produto Interno Bruto (PIB) enquanto indicador do desempenho económico e do progresso social, da informação em que podiam assentar alternativas mais relevantes e de formas adequadas para as apresentar. No seu entender, a distância entre o que as variáveis espelhavam e as perceções dos cidadãos era tão significativa que comprometia a confiança nas estatísticas oficiais.

A reflexão acerca do que o PIB representa é particularmente importante numa época em que se debatem modelos de organização social a partir da variação de tal indicador. Não raras vezes, afirma-se que Portugal foi ultrapassado pela Estónia, Lituânia, ou Roménia, ainda que, por exemplo, no último ano em que é possível traçar comparações desse cariz, a taxa de risco de pobreza ou exclusão social fosse superior em qualquer um desses países. No relatório da comissão supramencionada, os autores explicitam que a distribuição do rendimento, bem como as mudanças que nesta ocorrem, nem sempre são refletidas no PIB, de forma mais específica no PIB per capita, ou em variáveis similares.

Além de considerarem que tais medidas da produção mercantil são, erradamente e com frequência, tidas como indicadores de bem-estar económico, os membros da comissão também enaltecem o facto de serem omissas no que concerne ao impacto ambiental gerado. Das possibilidades que nomeiam para ultrapassar esta lacuna consta a correção ou o alargamento da noção convencional de PIB. Assim, o designado “PIB verde” constitui uma alternativa, permitindo acautelar o consumo de capital natural, ora em termos de exaustão de recursos, ora ao nível da degradação ecológica.

Praticamente quinze anos após a publicação do relatório, a expressiva maioria das recomendações continua a não conhecer tradução material. Apesar das limitações salientadas, a subordinação de diversas opções governamentais ao PIB mantém-se, bem como a primazia que lhe é concedida no momento da avaliação dos resultados. A adoção de uma perspetiva mais abrangente, que conjugue a produção, o rendimento e o consumo, é premente, por se adequar às respostas que urge dar a vários problemas contemporâneos. Só com um conhecimento preciso da realidade se definem melhores políticas públicas.

João Moreira de Campos, docente na Católica Porto Business School

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