A chegada da pandemia a Portugal, em março de 2020, obrigou as empresas do retalho e da logística a adaptarem-se a uma realidade que, para muitas, era desconhecida. "O impacto que sofremos com a pandemia mostrou um crescimento exponencial da presença digital das nossas pequenas e médias empresas (PME)", afirma André de Aragão Azevedo. O secretário de Estado para a Transição Digital, que falava na abertura do CTT e-Commerce Day, na passada terça-feira, considera que esta adaptação teve "um resultado muito positivo", ainda que permaneçam desafios que importa endereçar. "Em 2020, apenas 25% das empresas nacionais com presença na internet tinham uma integração efetiva da loja online com a loja física. Há aqui um espaço de progressão muito significativo", acredita.
Os dados apresentados pelo responsável político vão ao encontro dos números divulgados pelo CTT e-Commerce Report 2021, que aponta um crescimento do mercado do comércio eletrónico de 46%, atingindo um valor global de 4,4 mil milhões de euros nas vendas de produtos B2C. "Os produtos de e-commerce cresceram, mas um dado muito relevante é que o mercado doméstico cresceu muito mais rápido do que o mercado global", aponta Alberto Pimenta. O diretor de e-commerce dos CTT reconhece que o ponto de partida de Portugal era baixo, ainda que os 70% de aumento do peso das vendas digitais com origem nacional sejam boas notícias para os vendedores digitais.
Ainda assim, destaca André de Aragão Azevedo, o tecido empresarial português tem vindo a registar uma evolução positiva no desempenho digital, como demonstram os mais recentes dados do Digital Economy and Society Index (DESI) 2021. "As nossas PME ocupam a quarta posição em termos de volume de negócios via comércio eletrónico", diz, sublinhando a subida de uma posição no ranking geral. Por outro lado, alerta, existem obstáculos a ultrapassar. "Apenas 27% das empresas declarava ter uma estratégia digital definida", observa, o que significa que "três quartos do nosso tecido empresarial precisa de mais formação" e apoio na transição para o online. Neste campo, o governo pretende implementar mecanismos para impulsionar o mercado, nomeadamente através do Plano de Ação para a Transição Digital e do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). "Decidimos alocar [através do PRR] 135 milhões de euros exclusivamente para o comércio digital", reforça.
Entre as medidas a adotar, destaque para a criação de "50 bairros comerciais digitais" que pretendem apoiar o comércio local tradicional a complementar a sua oferta física com oferta digital. "Também o apoio à internacionalização através do e-commerce, em que iremos apoiar 1500 empresas", acrescenta ainda o secretário de Estado.
A par da transição para o comércio eletrónico, um dos maiores desafios sentidos por empresas de diferentes dimensões prende-se com a gestão logística e com a entrega dos seus produtos. João Bento, CEO dos CTT, acredita que é preciso "tirar partido dos ensinamentos que todos recolhemos ao longo destes dois anos" e apostar no fortalecimento das redes logísticas, em particular no desafiante last mile. Para a empresa de distribuição postal e encomendas, uma das soluções passa pelo reforço dos cacifos automáticos que tem vindo a instalar por esse país fora. "Temos a maior rede de lockers do país com cerca de 150 unidades. Estaremos aqui, no fim do ano que vem, com números mais perto dos mil cacifos", afiança. Em simultâneo, as entregas disponíveis em várias cidades nacionais no período máximo de duas horas serão, igualmente, prioritárias e essenciais para melhorar a experiência do consumidor. "O nosso volume de encomendas e pacotes distribuídos com origem no e-commerce cresceu, em 2020, cerca de 30%", declara o gestor.
João Bento acredita ainda que os CTT são parceiros de referência para as empresas e pequenos negócios que se querem lançar no comércio digital, um mercado que Alberto Pimenta prevê crescer, em 2021, perto dos 30%. O responsável de e-commerce destaca um dado particularmente revelador da mudança de comportamento dos clientes no digital. "Portugal passou a ser a principal origem dos produtos comprados e vendidos no e-commerce, a Espanha também ganhou importância e a China. São claramente os três principais países", diz.
Do ponto de vista da logística, Pimenta atesta que a falta de "previsibilidade e conveniência", assim como o tempo de entrega das encomendas, são os principais obstáculos a um crescimento mais visível deste mercado. Parte do gigante do e-commerce Alibaba, a Cainiao é o braço logístico que tem vindo a apostar na criação de parcerias locais e regionais para tornar as suas entregas mais rápidas e eficientes. "Queremos atingir as 72 horas [de tempo de entrega] na Europa, acho que será aqui que conseguiremos chegar primeiro a esse objetivo", afirma David Bu. O general manager para a União Europeia explica, no entanto, que essas entregas devem ser, tendencialmente, cada vez mais verdes. Para isso, "estamos a introduzir carrinhas de hidrogénio" e a usar a tecnologia para tornar as rotas mais eficientes.
Objetivo semelhante assume a Ikea, que garante querer chegar a "2025 com 100% de entregas em veículos elétricos". Malcom Haylett, digital manager da empresa em Portugal, recorda os desafios enfrentados na primeira fase da pandemia, em especial na resposta a encomendas. "Não estávamos, de todo, preparados para este tipo de trabalho. Tínhamos 5% de vendas online e passámos para 100% durante o confinamento", reconhece, acrescentando que foi necessário investir na digitalização da atividade. Já a Worten disponibiliza, há alguns anos, um marketplace próprio que reúne hoje mais de 1500 vendedores com mais de três milhões de produtos à venda. "Queremos chegar rapidamente aos dez milhões", garante Pedro Chainho, head of supply.
"Vimos que o setor de startups e do empreendedorismo resistiu muitíssimo melhor e esteve em contraciclo económico", aponta o secretário de Estado André de Aragão Azevedo, que se diz confiante no crescimento expressivo do e-commerce em Portugal.