Apesar dos constrangimentos da pandemia e da incerteza quanto ao futuro imediato, há 35 empresas representadas na Micam, correspondentes a 48 marcas distintas. E até há estreantes e 'quem regresse depois de anos de ausência. É o caso da Plumex, marca da empresa Tamancão, de Pombal, que há 15 anos trocou a feira de Milão para de Garda, em Itália também, mas este ano decidiu regressar à Micam em busca de novos clientes.
"Esta feira, por tradição, estava muito vocacionada para o cliente de loja, não para as grandes quantidades e nós trabalhamos essencialmente para o private label, precisamos de volume", explica Pedro Carlos. Esta é uma empresa familiar, com 24 trabalhadores, especializada em calçado de conforto e que, por isso mesmo, teve, em plena pandemia, os seus melhores anos de sempre. "Foram dois anos fabulosos, com os consumidores em casa", diz este responsável, explicando que a Plumex está muito vocacionada para os clientes de vendas online e de catálogo, áreas de negócios que "explodiram com a pandemia".
Com vendas de 1,5 milhões em 2021, a Plumex exporta 90% do que produz, em especial para Alemanha, França, EUA, Israel, Portugal e Reino Unido. Também vende para a Rússia, mas o que preocupa mesmo é o "efeito avassalador" da invasão da Ucrânia, ao nível das matérias-primas e dos preços. "Está tudo muito inconstante, não há qualquer tipo de previsibilidade, temos de navegar à vista", diz. Mesmo assim, a Rússia representa 5% das suas vendas. "Para mim já tem algum significado", admite, sublinhando que recebeu emails dos clientes a perguntarem qual a sua posição quanto à situação atual. "Estávamos a trabalhar já para a nova época, o outono-inverno, mas algo me diz que vai ficar tudo congelado. Estamos à procura de mercados alternativos, um plano b, c ou d", graceja, admitindo que a pandemia deixou a empresa "demasiado dependente de um número restrito de clientes", uma situação que "não é de todo confortável".
Mas o que preocupa mesmo o responsável da Plumex é o aumento do custo das matérias-primas. "É um problema gigantesco, não consigo refletir isto no produto final, não me autorizam", diz o empresário, que está já a dar preços para a coleção de primavera-verão de 2023, quando os seus fornecedores lhe estão a cancelar todos os preços em vigor e apresentar novas tabelas. "Não queria comprar uma quantidade de materiais que não preciso, mas é o que estamos todos a ser obrigados a fazer", sublinha.
Também a Kuru (significa 'cool' em japonês), a nova marca de Nelson Gomes vocacionada para o private label - o empresário lançou, há 12 anos, a Apple of Eden, que assegura o segmento de marca própria - está pela primeira vez na Micam. "Criamos a Kuru, em 2021, para termos total liberdade de criar produtos diferenciados para cada tipo de cliente", explica o empresário. A Apple of Eden assegura já vendas de 10 milhões de euros, mais 12% do que em 2020, e tem na Alemanha, Áustria e Suíça os principais mercados.
A nova marca deverá valer três milhões a médio prazo, muito centrada na Europa, Japão e EUA. "As expectativas são boas, mas temos que ter em conta que vai ser preciso aumentar preços. Ninguém vai fazer milagres. O problema é que o cliente não aceita e o consumidor final não vai ter capacidade financeira para suportar esses aumentos", diz Nelson Gomes, que aponta para aumentos "que podem chegar aos 30%" no próximo ano. "De um mês para o outro o preço da luz quase duplicou, para 1100 euros por mês, fora o custo dos transportes, que era de 2.800 dólares e está nos 18 mil", sublinha. Embora considere que ainda não é possível avaliar as "consequências inevitáveis" da guerra, este empresário não tem a menor dúvida de que "vai ser muito pior do que a pandemia".
Também a Brako está na Micam na sua segunda vida. Vítor Valente foi, durante 30 anos, vendedor da marca espanhola em Portugal, sendo que, nos últimos 15, se tornou responsável pelo desenvolvimento e produção junto de fábricas nacionais. Em janeiro de 2020, Vítor Valente comprou a Brako, bem como outras marcas como a BRK ou a Gold Button, cada uma a atuar num segmento de mercado específico. A aposta no segmento da sustentabilidade levou a empresa a lançar uma palmilha produzida a partir de cana de açúcar e resíduos de cortiça, já devidamente certificada para o mercado europeu. "Cada tonelada métrica de cana de açúcar retira duas toneladas de CO2 do meio ambiente", explica.
* A jornalista viajou a convite da Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e seus Sucedâneos