O investigador Telmo Morato lidera a partir desta terça-feira uma equipa que garantiu financiamento do projeto europeu Eurofleets+ para a realização de uma expedição científica a zonas do mar profundo "nunca antes visitadas". Ao Dinheiro Vivo, o investigador açoriano ligado ao Centro de Investigação Okeanos da Universidade dos Açores admitiu o "entusiasmo para o que serão 17 a 18 dias de exploração no navio holandês Pelagia", até 3 de junho.
A missão que deverá custar mais de 500 mil euros - o custo é suportado pelo projeto Eurofleets+ (Horizonte2020) após candidatura do grupo de investigação de Telmo Morato - vai explorar zonas desconhecidas da Dorsal Médio-Atlântica, que é "a maior e mais extensa cordilheira do planeta, já que o atravessa do Árctico até à Antártida". "É uma zona muito pouco conhecida, mas muito relevante e que divide a placa tectónica euroasiática, da plataforma norte-americana (onde já estão as ilhas do Corvo e das Flores) - nos Açores temos ainda a sul do Faial a presença da plataforma africana".
Telmo Morato admite que é difícil de antecipar já que "há muito ainda por descobrir no mar profundo", mas "de certeza que vamos encontrar coisas novas", deixando mesmo a hipótese de repetir o feito de 2018, com descoberta de potenciais novas fontes hidrotermais.
"O Gigante" foi o nome dado ao primeiro campo hidrotermal "diferente de todos os outros" descoberto numa expedição totalmente portuguesa, que mais não é do que um monte submarino (entre as Flores e o Faial, a 570 metros de profundidade) "que emite fluídos a baixa temperatura, ricos em ferro e hidrogénio" que "são essenciais para a produtividade do oceano a nível global". "Os ingleses chamam-lhes oásis de produtividade, porque são esporádicos e ajudam a manter a biodiversidade do oceano, sendo zonas de grande concentração de vida marinha por ter um boost extra de nutrientes, daí atrair peixes predadores"
Certo é que a expedição vai cartografar os fundos da região e caracterizar as comunidades de corais e esponjas que habitam as cristas e montes submarinos na tal dorsal. Será possível descobrir "novas espécies nunca antes vistas, bem como a dinâmica de verdadeiras florestas do mar profundo".
Citaçãocitacao "Nos Açores o mar profundo é o nosso quintal".centro
O investigador doutorado em Vancouver, no Canadá, e com experiência não só no Atlântico mas também no Oceano Pacífico, explica ainda: "da mesma forma como conhecemos bem as florestas na superfície de Portugal, devemos conhecer melhor o que está debaixo de água e que desconhecemos, temos muitos pinhais de Leiria no mar profundo e também fazem parte do país". Morato lembra que "nos Açores o mar profundo é o nosso quintal".
O que alimenta a missão é a ciência e proteção dos oceanos e do meio ambiente, mas também a sustentabilidade do planeta, daí que na busca pelos padrões no mar profundo a missão irá "identificar zonas mais vulneráveis, bem como ecossistemas marinhos mais sensíveis e trazer informação científica de apoio às decisões". Quais? Será possível identificar melhor áreas prioritários de apoio à gestão de conservação, "de forma a aumentar as áreas marinhas protegidas dos Açores".
Morato lembra que Portugal está ainda longe de atingir as metas internacionais de aumento das áreas marinhas protegidas no âmbito da estratégia das Nações Unidas para o desenvolvimento sustentável, "algo que só se consegue com este tipo de base científica". O objetivo é de 30% até 2030 (estará hoje nos 14%), sendo 10% no regime de estritamente protegidas, ou seja, serão áreas de não extração, sem pesca, nem exploração mineral, por exemplo.
A missão cujo nome completo é "iMAR: Avaliação Integrada da Distribuição dos Ecossistemas Marinhos Vulneráveis ao longo da Dorsal Médio-Atlântica na região dos Açores" dará assim ao Governo Regional dos Açores e à Fundação Oceano Azul dados relevantes para os próximos passos.
A expedição volta à ilha da Horta a 3 de junho. Será possível apresentar alguns dados preliminares de como correu a missão, começando depois a partilhar dados com os parceiros - os resultados irão sair nos próximos meses. Embora o foco seja a biodiversidade e biogeografia, a informação recolhida é partilhada com a chamada economia azul.
"As amostras de sedimento que vamos recolher vão ser analisadas pelo colegas de biotecnologia, pode ser úteis para desenvolver bactérias e para tentar perceber se há bactérias novas, se podem ter algum tipo de utilização como material genético, o que é possível e pode ter usos comerciais". Ainda assim Telmo Morato lembra que a missão "é pelo conhecimento e proteção dos oceanos e do planeta".