Mário Monti tem piada. A meio da semana, o primeiro-ministro
incendiou Itália com a ideia de que nenhum transalpino devia ter um
emprego para a vida. "Que monótono que é. Mudar de trabalho é
bello. Os jovens têm de se convencer disso." Monti, um
tecnocrata empedernido e homem do aparelho estabelecido, tem um
ponto: não esperem que o Estado vos dê o que deu aos vossos pais.
A
frase puxou um coro de refilões. Queixaram-se os filhos, os pais e
os avós, uns porque não têm emprego e desejam estabilidade, outros
porque já a conseguiram e não abdicam dela. Nas redes sociais, o
assunto explodiu - "és um palhaço", "tecnocrata",
"homem da Goldman Sachs" -, mas, entre quilos de lixo
verbal, houve quem levantasse um bom ponto: "Sim, é monótono
trabalhar no mesmo sítio, mas os bancos, quando concedem
empréstimos, gostam de pessoas monótonas."
Os bancos. Em 30 anos, evoluímos das recomendações por
afinidade (família, conhecidos) para um julgamento numérico
estampado numa folha de IRS (rendimento coletável, entidade
patronal). Nessa transição, o Estado tornou-se o melhor dos
fiadores, um capital de confiança de que nenhum banco, nenhuma
empresa duvidava. Em 20 anos, o sistema mudou. De repente, já
ninguém precisava de avaliações de risco. Já ninguém precisava
de avaliador quando os bancos (que emprestavam) viviam na dependência
direta do fiador (o Estado, que pagava). E fomos andando até cair
nesta crise.
Monti, como Passos, sabe duas coisas: 1. Que o Estado
está de rastos. 2. Que a transição entre duas gerações (a que
aproveitou o crescimento do Estado democrático e a que terá de
concorrer num mercado liberalizado) terá de ser muito rápida.
Senão, os descontentes prometem ficar presos entre o desejo de
conseguir um lugar num Estado falido e o problema de concorrer num
mercado competitivo. Quanto aos bancos, o dilema é outro. Sem aval
público, o futuro será como na América: presos entre cartões de
crédito e empregos a prazo, cada um de nós terá direito ao seu
rating pessoal, medido entre as poupanças e o rendimento corrente.
Olá instabilidade, adeus monotonia.