Música. Quem paga aos artistas na era digital?

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Poucos meses depois de

reeditarem "The Dark Side of the Moon", os Pink Floyd tomaram uma

posição muito dura contra a rádio online Pandora, a mais popular

do género nos Estados Unidos. Basicamente, disseram que rouba os

artistas e criadores e apelidaram o seu comportamento de pouco

escrupuloso.

Isto foi o mês passado,

mas o mesmo podia ter sido dito há anos sobre as editoras

discográficas - as mesmas que agora tentam a todo o custo inventar

novas formas de ganhar dinheiro. Processar consumidores por descargas

ilegais claramente não funcionou. Os agentes em que se baseia esta

indústria estão a perceber que não há volta atrás e é preciso

recriar o sistema de receitas provenientes da música.

Qualquer executivo de uma

discográfica dirá que o futuro está no digital: iTunes e Google

Play são canais privilegiados de venda, mas os serviços de

streaming são a grande esperança. Spotify, Rdio, Pandora, Deezer, o

próprio Napster, Grooveshark. Suportados por publicidade e por

assinaturas premium, oferecem aquilo que, no fundo, os consumidores

querem: acesso gratuito ou barato, em qualquer momento, a catálogos

gigantescos de música.

O problema, como tem

vindo a público recentemente, é arranjar um modelo de divisão de

receitas que seja justo para os artistas. Os Pink Floyd, no artigo

que publicaram em junho no USA Today, contam que 90% dos artistas

com música disponível em streaming recebem menos de 3800 euros por

ano. Qualquer coisa como 316 euros por mês. Garantem que, para muitas bandas, corrigir o sistema é uma questão de sobrevivência.

É certo que não

são as rádios online nem os serviços de streaming que devem

sustentar os músicos, mas valores como este são irrisórios. A Pandora está a ser mais visada que os outros serviços

porque paga comparativamente menos - e tem até uma proposta

no Congresso norte-americano para reduzir a fatia paga

aos artistas (pede um corte de 85%).

O que não soa bem, para os Pink

Floyd e mais 130 bandas e músicos que estão em campanha contra a

rádio, é que o CEO da Pandora, Tim Westergreen, encaixou 7,5

milhões de euros com a venda de 'stock options' da empresa (cuja

entrada em bolsa rendeu 180 milhões de euros). Alguém está a fazer

dinheiro.

"Já ouvimos a

Pandora queixar-se de que paga demasiado em 'royalties' para

conseguir ter lucros", escrevem os Pink Floyd. "Mas uma empresa

que existe para distribuir música não pode realmente queixar-se de

que o seu maior custo é a música."

Thom Yorke,

vocalista dos Radiohead, confessou que a banda fez asneira quando

disponibilizou o álbum "In Rainbows" na internet, dando liberdade

aos fãs para pagarem se quisessem. Deram argumentos a quem acha que

a música devia ser toda gratuita, disse ele. Linda Perry recebeu 260

euros depois de a música que compôs, "Beautiful", ter sido

ouvida 12 milhões de vezes. "Low", dos Cracker, rendeu 42

dólares por 1,1 milhões de audições.

No meio de toda esta

polémica com os serviços de streaming, surgiu outra controvérsia -

há cada vez mais bandas a cobrarem uma anuidade aos fãs para terem

acesso a certos privilégios, como idas ao backstage nos concertos,

ou a cobrarem pela oportunidade de os conhecerem e tirarem fotos com

eles. É uma modalidade de receitas que abrange todo o tipo de

artistas, desde Jonas Brothers, Demi Lovato e Justin Bieber a Pierce

the Veil, Mastodon, Marilyn Manson ou Lady Gaga. Há também sessões

de autógrafos a que os fãs só têm acesso se comprarem o CD no

local, mesmo que já tenham um consigo. O merchandising é cada vez

mais caro. E há a monetização da localização no próprio

concerto, com preços muito elevados para a zona que rodeia o palco.

Com todas as

transformações que a indústria tem sofrido, uma coisa é certa: a

maioria dos artistas não consegue um pagamento justo pela sua arte e

criatividade. Nem todos se chateiam com a pirataria - os Imagine

Dragons dizem que o que interessa é terem concertos esgotados -

mas a transição para os novos modelos não beneficia em primeiro

lugar aqueles que são os responsáveis por tudo isto: os

compositores, músicos e cantores que tornam possível uma indústria

milionária.

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