Não é tempo de “folgas”

Da perplexidade do fim dos debates quinzenais com o primeiro-ministro.
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Se é verdade que governar uma organização, uma empresa, ou o país exige tempo, ponderação e reflexão sobre o alcance das decisões a tomar, não é menos verdade que o exercício regular de escrutínio e de esclarecimento em nada diminui ou prejudica o processo de governance.Por isso, não pode deixar de causar alguma perplexidade a alteração do regimento da Assembleia da República, que prevê o fim dos debates quinzenais com o primeiro-ministro substituindo-os por presenças bimestrais, e que foi subscrita por PS e PSD.Desonerar o primeiro-ministro de prestar contas regularmente à Assembleia da República sobre a atividade do governo é um sinal errado de menorização do papel fiscalizador que cabe ao parlamento, e indicia um aligeiramento no exercício de escrutínio que compete ao maior partido de oposição. Substituir o exame quinzenal, a que o governo está sujeito, com uma espécie de condescendência parlamentar não parece, de todo, a melhor forma de avaliar e acompanhar a ação governativa.Por outro lado, se a forma para a alteração regimental merece as maiores reservas, o timing para a concretizar parece absolutamente desajustado. Os próximos meses serão particularmente exigentes para o governo. A crise sanitária desencadeada pela covid-19 ainda muito longe de estar ultrapassada, terá um impacto brutal sobre o emprego e sobre sectores fundamentais para o País. Na saúde, no turismo, no trabalho e na segurança social, nas empresas e na economia, será necessário prosseguir políticas públicas que promovam o crescimento, estimulem o emprego e reanimem os agentes económicos. Hoje, mais do que nunca, é absolutamente imperioso que a Assembleia da república escrutine, acompanhe e debata as diferentes opções estratégicas que o país tem diante de si, em particular com quem tem a efetiva responsabilidade de governar.Durante os próximos anos, Portugal disporá de cerca de 45 mil milhões de euros vindos da Europa para fazer face ao período de enorme exigência económica e social que se avizinha. Nos próximos meses serão definidas as politicas públicas que condicionarão o futuro do país durante a próxima década. É por isso tempo de escrutinar e aprofundar o debate. Não podemos perder tempo com “folgas”.Ricardo Gonçalves Cerqueira, gestor

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