A mobilidade dos cidadãos tornou-se nos últimos anos global e Portugal destacou-se no mapa mundial. Os estrangeiros com elevada capacidade financeira têm entrado no país à boleia dos vistos gold e do regime de residentes não habituais, mas também ao abrigo de outros modelos de autorização de residência. Prova disso é que desde 2018 e até 10 de abril foram emitidos 26 525 vistos D7, documento atribuído a pessoas que comprovem a existência de rendimentos próprios (pensões, remunerações de investimentos, e também salários) obtidos no seu país de origem. Entretanto, a 30 de outubro do ano passado, foi aberta uma porta exclusiva para os nómadas digitais e por onde já entraram cerca de 800 trabalhadores remotos. Em ambos os casos, as nacionalidades com mais vistos emitidos foram a norte-americana, britânica e brasileira. Estes dados, facultados pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, vêm comprovar a atratividade do país na esfera internacional e, em consequência, a pressão existente no mercado habitacional..No ano passado, os estrangeiros compraram quase 11 mil casas, gastando um total de 3,6 mil milhões de euros, conforme divulgou o Instituto Nacional de Estatística. O Algarve e a Grande Lisboa foram as regiões que captaram a grande fatia do investimento, num exercício em que o preço da habitação apresentou uma subida de 12,6% - o maior aumento de que há registo. Na capital, o mercado internacional valeu 37% dos 2,4 mil milhões aplicados na aquisição de imobiliário residencial, ou seja, quase 900 milhões, avançou a Confidencial Imobiliário. E se os estrangeiros continuam a gerar um volume de compras significativo, também no arrendamento estão muito ativos. Toda esta procura, a que se soma a nacional, tem resultado num incremento das rendas. No final de 2022, registou-se nos novos contratos um aumento de 10,6%. Outro sinal de um mercado em ebulição é que em Lisboa as casas para arrendar já são alvo de disputa..Segundo Eduardo Miranda, presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP), "nas zonas centrais de Lisboa, o principal motor da procura no arrendamento são os estrangeiros". A demanda é de tal forma elevada que "a maior parte das casas que saem do Alojamento Local (AL) são imediatamente absorvidas". O mercado está tão pressionado que o mesmo imóvel é alvo de várias propostas. "Tentam subir o preço. Não são leilões, mas as casas são muito disputadas", afirma. Desde a pandemia, saíram do AL mais de três mil casas em Lisboa e não regressaram. "Uma grande parte dedicou-se ao arrendamento de média duração (mais de 30 dias)", tendo em vista esta população estrangeira móvel..Para Eduardo Miranda, estas casas "têm pouca atratividade para as famílias portuguesas, não têm elevador nem estacionamento, enquadram-se melhor no estilo de vida dos estrangeiros". O preço das rendas também está longe do orçamento da larga maioria dos nacionais. Uma das principais causas deste movimento são os benefícios, nomeadamente fiscais, à entrada e permanência dos estrangeiros no país, como o regime de residentes não habituais, diz. Entre 2016 e 2021 (últimos dados disponíveis), a população estrangeira em Lisboa quase duplicou, totalizando mais de 108 mil pessoas, com destaque para os brasileiros, franceses e italianos..Mundo digital.Estes cidadãos do mundo tendem a procurar casa no universo digital, desde plataformas profissionais dedicadas ao arrendamento às redes sociais. A Spotahome, há quatro anos a operar no país, tem uma oferta muito centrada em apartamentos, a maior parte mobilados, embora também anuncie estúdios, quartos em habitações partilhadas e residências de estudantes. A oferta está concentrada em Lisboa e no Porto, embora já esteja a trabalhar Coimbra. Segundo Pedro Franco Caiado, diretor da plataforma em Portugal, "os preços são definidos pelos senhorios e variam, normalmente, entre os 300 e os 3000 euros". Embora não admita a existência de disputas pelos imóveis, reconhece "a possibilidade de uma mesma casa reunir as preferências de mais do que um arrendatário". Os inquilinos mediados pela Spotahome vão desde estudantes (40% dos clientes da plataforma), a nómadas digitais e a pessoas que querem arrendar casas por um longo período de tempo. Em média, o tempo de contrato é de 150 dias. "São muitos os estrangeiros" que procuram este portal para arrendar casa, com destaque para os espanhóis, italianos, alemães, holandeses, brasileiros e norte-americanos..De origem checa, a plataforma de arrendamento de casas Flatio reconhece que quase metade (46%) dos seus utilizadores são nómadas digitais e trabalhadores remotos, 36% pessoas que pretendem mudar-se para Portugal e 7,5% slow travelers (viajantes lentos). A empresa anuncia imóveis em todo o país, embora os principais mercados sejam Lisboa, Porto e Madeira, os centros de excelência dos trabalhadores-turistas. Segundo Radim Rezek, CEO da Flatio, a maioria dos imóveis são casas e apartamentos, mas a oferta também integra espaços de co-habitação, casas de campos e vilas, quartos e hotéis, sempre mobilados. A oferta é diversificada. Como adianta, "temos cabanas de surf em Ferrel com um quarto a partir de cerca de 191 euros, e apartamentos com vista para o mar para nómadas digitais na Lourinhã por menos de 1000 euros por mês, até às luxuosas penthouses de quatro camas em Lisboa por cerca de 7500 euros". Radim Rezek não tem conhecimento de disputas por casas na plataforma, pois "o nosso sistema permite aos potenciais inquilinos falar diretamente com os potenciais senhorios, antes de qualquer pedido de reserva ser feito, pelo que ambos sabem o que esperar". Mas uma coisa é certa, quando "uma oferta está online na plataforma é reservada muito rapidamente". Os inquilinos da Flatio tendem a ficar entre 1 a 3 meses em média.