Passar de país pobre a país rico foi rápido. Passar de país
rico a país inteligente pode demorar três gerações. Para atalhar
caminho, quatro milhões de brasileiros andam a aprender inglês. No
Brasil, ser poliglota vale dinheiro.
Não é necessário levar o assunto tão a peito como Ziad Fazah -
o filho de libaneses nascido na Libéria que chegou ao Guinness Book
por provar que domina 54 idiomas, de albanês a vietnamita - para ser
bem sucedido no mercado de trabalho. Mas falar uma língua além da
língua-mãe é fundamental.
No Brasil, é o tema do momento. Há 60 redes de ensino de línguas
no país, entre elas o grupo Multi, uma franquia líder mundial no
sector com 3500 escolas. Estima-se que perto de quatro milhões de
brasileiros estejam neste momento a aprender uma segunda língua,
quase todos o inglês, movimentando mais de dois mil milhões de
euros ao ano.
O caso não é para menos: o Mundial de futebol e os Jogos
Olímpicos estão a chegar e o Brasil é um dos países em que a
percentagem de falantes de um segundo idioma é menor no mundo
inteiro. De acordo com o Eurobarómetro, apenas 2% dos
brasileiros falam outro idioma além do português - abaixo de
qualquer BRIC e esmagadoramente atrás de Portugal, por exemplo, onde
42% da população comunica numa outra língua.
Dilma Rousseff, que fala português e arranha mais uns quantos
idiomas entre os quais o búlgaro paterno, tem uma paixão à la
Guterres: a educação. À presidente do Brasil não basta que o seu
país seja uma potência económica, isso seria inevitável mais dia
menos dia - quer fazer dele uma potência tout court. Para encurtar
o longo caminho - estima-se em três gerações - que separa o
Brasil, país rico, do Brasil, país rico e inteligente, vai
estimulando os melhores alunos a emigrarem para voltarem experientes,
enriquecidos e, antes de mais, bilingues.
Mas três gerações é de facto um longo caminho. Os alunos que
não ganham bolsas de estudo - isto é, quase todos - continuam
entregues a um ensino público tão medíocre que, ao que consta, nem
os professores de inglês dominam o inglês. A prática da dobragem
de filmes e séries também não ajuda e está longe do fim - as
novas grelhas das redes a cabo anunciam mais e mais dobragens a
partir do slogan assustador de que "em português o filme fica mais
gostoso". E com tudo isso a aprendizagem do inglês reduz-se a
pequenos grupos - o dos tais bolsistas e o dos quatro milhões (num
universo de 200) que têm dinheiro para pagar uma rede de ensino
paralela.
Para se ter uma ideia da importância de falar outras línguas no
Brasil, basta dizer que aquele tal Ziad Fazah do início do texto
escolheu o Rio de Janeiro para viver e vai enriquecendo a dar aulas
de inglês, alemão, francês, dinamarquês e sueco à elite carioca, além de acumular um part-time na polícia federal do Aeroporto
Internacional do Rio a identificar a nacionalidade dos emigrantes
ilegais. Não precisa de dominar baluchi, butanês, quirguiz ou
papiamento como ele, mas se é um dos muitos portugueses que sabe
inglês tem uma vantagem no mercado de trabalho garantida em relação
à maioria dos nativos. Think about it.
Jornalista
Escreve à quarta-feira