O bullying entre crianças e jovens não pode ser desvalorizado

Em 2023, a GNR registou 140 crimes de bullying e cyberbullying nos espaços de ensino. A violência física e psicológica também existe nas escolas.
Célia Oliveira, psicóloga. Foto: Paulo Alexandrino/Global Imagens
Célia Oliveira, psicóloga. Foto: Paulo Alexandrino/Global Imagens
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“Os adultos não devem jamais desvalorizar o bullying e muito menos normalizá-lo”, defende a psicóloga e professora universitária Célia Oliveira. A investigação científica mostra o impacto do bullying na saúde mental e no desenvolvimento dos mais novos, facto que torna ainda mais preocupante a subida no número de casos registados. O bullying e o modo como família e sistema educativo devem lidar com a questão estiveram em análise no Educar tem Ciência, um projeto da Iniciativa Educação em parceria com a TSF e Dinheiro Vivo.

O bullying é “uma forma de agressão repetida, que se prolonga no tempo, e que é exercida entre pessoas que têm perceções desiguais de poder, seja ele físico ou de integração social”, explica Célia Oliveira. Entre crianças e jovens pode traduzir-se em comportamentos como insultos, depreciação, agressão física ou agressão relacional. E se o recreio é o espaço de excelência para o bullying, este também existe na sala de aula, nas imediações da escola e na internet. “São situações que envolvem uma agressão intencional e continuada”, alerta a psicóloga, que sublinha que este é um fenómeno transversal a ambos os sexos e a todos os níveis de escolaridade, embora seja mais prevalente no segundo e terceiro ciclos.

Em 2023, a GNR registou 140 crimes de bullying e cyberbullying no espaço escolar e, em março, o relatório Escola Segura, divulgado pela PSP, registava um aumento de 9% de aumento das queixas no ano letivo 22/23, embora nem todas sejam relativas a bullying. E, já em 2019, o relatório da UNICEF, abrangendo 30 países e 170 mil jovens entre os 13 e os 24 anos, referia que cerca de 30% dos adolescentes entre os 13 e os 15 anos reportava ter sofrido bullying nos últimos meses.
“A investigação começa a falar em trauma na sequência do bullying”, alerta Célia Oliveira, que sublinha os impactos no longo prazo: “Afeta a sua

autoestima, produz sentimentos depressivos, é altamente gerador de ansiedade, compromete a socialização saudável, a autoconfiança. O impacto pode ser duradouro e com repercussões na vida adulta”. Além do mais, como mostra o estudo publicado em 2021 no International Journal of Environmental Research and Public Health, o bullying está associado a um menor sucesso académico.

Sinais de Alerta
Certas características físicas e psicológicas estão associadas a um maior risco de sofrer e de cometer bullying. A introversão, as dificuldades de socialização, a tendência para o isolamento, bem como limitações sensoriais, perturbações psiquiátricas e a pertença a minorias étnicas ou de género são fatores de risco para se ser vítima. Já problemas de comportamento relacionados com agressividade, impulsividade, dificuldade de autorregulação e autocontrolo estão associados a um maior risco de cometer bullying. “É importante que as famílias estejam atentas e sensibilizadas para este problema e o incluam nos seus diálogos diários”, defende Célia Oliveira.

“Quando se detetam situações de bullying, a família não deve incentivar a criança a resolver o problema por si própria, deve apoiá-la, validar os seus sentimentos, ajudá-la a encontrar estratégias para se proteger”, continua a psicóloga. Da mesma maneira, quando os pais se apercebem de que o filho tem características que o podem colocar em risco de praticar bullying devem abordar o assunto, “passando a mensagem de ‘tolerância zero’ à agressividade como meio de resolução de problemas”.

Manifestações de ansiedade incomum, oscilações de humor, com predomínio de humor deprimido, recusa ou evitamento do contexto escolar, alterações dos padrões de sono ou apetite e isolamento ou irritabilidade, podem ser indícios de bullying. Pais e comunidade escolar também devem estar atentos a material escolar ou vestuário destruídos ou o aparecimento de nódoas negras ou feridas sem explicação plausível.

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