O modelo de concessão de patrocínios a profissionais de saúde por parte de empresas de dispositivos médicos, como o conhecemos até hoje, acaba durante este ano com a recente entrada em vigor do novo Código de Ética Europeu, promovido pela MedTech Europe, uma associação não-governamental que representa o sector dos dispositivos médicos.
Com o intuito de promover uma maior transparência e independência entre as empresas deste sector e os profissionais e as instituições de saúde, o novo código, que apenas vincula os associados da MedTech, consagra a proibição dos pagamentos feitos directamente aos profissionais de saúde para assistirem a eventos e congressos médico-científicos organizados por terceiros.
As empresas que queiram conceder apoios à formação dos médicos terão de fazê-lo através de organizações de saúde (hospitais, ordens profissionais, sociedades científicas, etc.), sendo estas que, por sua vez, seleccionam quem serão os profissionais de saúde a receber o patrocínio para assistir aos referidos eventos. Em paralelo, cabe à organização de saúde beneficiada e organizadora de um evento definir o seu programa, seleccionar o painel de oradores e proceder ao pagamento dos respectivos honorários, quando estes forem devidos.
Com o novo código prevê-se também que os profissionais de saúde beneficiários dos apoios não possam ser identificados nem identificáveis, devendo as empresas diligenciar no sentido de assegurar que estes apoios não são atribuídos a organizações de saúde relativamente às quais seja possível reconhecer antecipadamente os beneficiários, evitando-se, deste modo, situações de conflito de interesses.
Por cá, a MedTech tem duas associadas: a Apormed e a Apifarma. Para as empresas associadas da Apifarma esta nova regra já está em vigor desde o dia 1 de Janeiro e para as da Apormed começará a partir do dia 1 de Julho de 2018 (esta diferença deve-se ao facto de a MedTech Europe ter concedido a todas as associações nacionais um prazo de três anos para a transposição do Código, sendo que, posteriormente, cada associação decidiu qual o prazo de implementação que iria adoptar).
Mais do que o cumprimento deste código, que procura assegurar que não há uma forma de induzir os profissionais de saúde a comprar, prescrever ou recomendar os produtos de determinadas empresas, importa discutir e avaliar o impacto que esta proibição poderá ter na formação contínua dos profissionais de saúde, em grande parte patrocinada por empresas do sector, e nos últimos beneficiários destas formações, os doentes. A proibição agora estabelecida já não volta atrás, por isso importa dotar as organizações de saúde das ferramentas necessárias para a organização deste tipo de eventos para que continuem a ser acessíveis aos médicos e profissionais de saúde. Só assim será possível que a inovadora indústria dos dispositivos médicos continue a contribuir para melhoria dos cuidados de saúde.
Joana Silveira Botelho e Luís Ribeiro Telles, advogados de Direito da Saúde da Cuatrecasas