O órgão brasileiro que possui verbas a serem aplicadas no resgate da cultura negra é presidido por um racista. Por esse motivo, todas as iniciativas sobre o tema no país estão paralisadas. E deverão ficar sem dinheiro por muito tempo..Enquanto o mundo ergue o punho em apoio ao movimento negro, o Brasil assiste envergonhado a Sérgio Camargo, presidente da Fundação Cultural Palmares, classificar o movimento negro como “escória maldita”. Camargo, acredite, é negro e sobre o assassinato de George Floyd – vítima de uma brutalidade cometida por policiais estadunidenses – ele afirmou que “nosso inútil movimento negro tenta importar para o Brasil os atos anarquistas e criminosos do Black Lives Matter, a antifa negra dos EUA”..Mas afinal, o que é a Fundação Palmares? Trata-se de um órgão vinculado à Secretaria Especial da Cultura e foi criado em 1988, na altura em que se comemorava os 100 anos da Abolição da Escravatura no Brasil. A fundação deveria promover, debater, criar e apresentar políticas de governo focadas na compensação às desvantagens sociais históricas impostas aos pretos no país. Há verba federal destinada para isso. Cumpriu esse papel ao longo dos anos. Já agora isso não acontece..Seu presidente atual faz piada com o tema. Ridiculariza os pretos, minimiza o sofrimento de seus antepassados, ignora que foram covardemente sequestrados de suas vidas em África e transformados em animais domesticados. Em suas redes sociais, Camargo se autodenomina um “negro de direita, contrário ao vitimismo e ao politicamente correto”. Chegou a dizer que “embora terrível, a escravidão foi benéfica a seus descendentes”. Estamos a ver....Enquanto deputado federal a fazer campanha para a presidência, Jair Bolsonaro foi perguntado sobre de que forma pretendia reparar a dívida histórica existente com os negros por conta da escravidão. Ele respondeu: “Que dívida? Eu nunca escravizei ninguém na minha vida”. Camargo sofre da mesma miopia de seu chefe, líder e referência intelectual..Nesta semana uma reportagem do diário O Estado de S Paulo revelou áudios de uma reunião na Fundação Palmares onde Camargo faz críticas ao Dia da Consciência Negra, um feriado nacional. Falou mal de Zumbi dos Palmares – o negro que lutou contra a escravidão e foi o último líder da comunidade quilombola que dá nome à fundação que Camargo preside. “Não tenho que admirar Zumbi dos Palmares, que para mim era um filho da p que escravizava pretos. Não tenho que apoiar o Dia da Consciência Negra. Aqui não vai ter (verba)! Aqui vai ser zero para Consciência Negra.”.Só para relembrar de novo: Camargo é negro..O Brasil possui a maior população de negros fora da África, mas o que menos existe no país são referências à cultura negra. Nas escolas pouco se fala aos jovens estudantes sobre o quão doloroso foi esse processo e, justamente por isso, eles crescem sem entender a seriedade da responsabilidade social que implica nos dias de hoje. Parece, no fundo, que não ensinar é o melhor caminho para abafar o caso..A Fundação Educafro - instituição que trabalha pela inclusão de negros e pobres em universidades - solicitou ao Ministério Público Federal (MPF) em Brasília a abertura de uma ação penal pelo crime de racismo por conta das recorrentes declarações de Camargo. Segundo a Educafro, o caso se enquadra em crime de racismo previsto em lei com pena de um a três anos de reclusão..Na noite desta quarta-feira a Defensoria Pública da União (DPU) entrou com pedido de tutela provisória de urgência no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para suspender a nomeação de Camargo. Em dezembro de 2019 essa decisão já havia sido tomada pela justiça, mas fora suspensa pelo presidente do STJ que permitiu a recondução de Camargo ao cargo até o fim do julgamento das acusações daquela ocasião. E quais eram mesmo as acusações? Ele defendeu a extinção do movimento negro e alegou que no Brasil existe um “racismo nutella”, minimizando o racismo no país..De onde menos se espera, é de lá que não vem nada mesmo..Paulo Cardoso de Almeida, jornalista e designer brasileiro