O Orçamento do Estado vai ser aprovado

Publicado a

Apesar de todo o circo político em torno das negociações do Orçamento de Estado (OE), não tenho quaisquer dúvidas de que o Orçamento será aprovado. Se Pedro Nuno Santos cumprir a sua promessa de aprovar o OE, se as medidas do IRS jovem e de redução do IRC forem retiradas, o Orçamento está, então, garantido. Nem preciso de recorrer à teoria política de que o PS precisa de um OE aprovado para que as câmaras socialistas consigam aumentar a despesa em obras, com vista às eleições autárquicas de 2025. Basta comparar os poucos números disponíveis do cenário macroeconómico com o programa da AD para perceber que o Governo já parece ter deixado cair essas duas medidas do Orçamento.

Antes de entrar na análise dos números, permita-me fazer um desvio para felicitar a classe política pela exigência de conhecer os números antes de iniciar as negociações. Alguns jornalistas e políticos do PSD lembraram, com razão, que o Governo só está obrigado a divulgar os números do cenário macroeconómico e dos quadros de despesa quando entrega o OE no Parlamento. Mas, ao contrário de décadas passadas, em que as negociações aconteciam sem grande preocupação com as contas públicas, hoje os partidos exigem conhecer os números. Por isso, a antecipação da divulgação dos números pelo Governo, em resposta à exigência da oposição, demonstra uma maior maturidade dos nossos políticos em questões orçamentais. E é com base nesses números antecipados que posso fazer esta análise. Todos ganhamos.

Vamos, então, aos números. O saldo orçamental previsto para 2025 é de 0,2% do PIB, exatamente o mesmo valor que consta no programa eleitoral da AD. É de elogiar a obstinação de Miranda Sarmento em cumprir este objetivo final. Mas, apesar de o fim ser o mesmo, os meios para lá chegar são ligeiramente diferentes, e é aqui que reside a chave para descortinar a estratégia orçamental do Governo. No que toca à despesa, o crescimento parece estar ligeiramente acima do previsto no programa da AD. E, se o excedente orçamental é para ser mantido, a receita terá de aumentar: Miranda Sarmento já anunciou que a receita fiscal crescerá, pelo menos, 4% em 2025. E é precisamente neste ponto que o programa da AD se desvirtua significativamente, e só uma mudança nas políticas permite conciliar estes números.

Neste ponto, o programa da AD previa um crescimento económico de 2,5% em 2025 e assumia que, devido às políticas de redução de impostos (IRS, IRS jovem, IRC e IMT), a receita fiscal se manteria constante face a 2024. No entanto, com a economia a crescer apenas 2%, o consumo aumenta menos (o IVA aumenta menos), os salários sobem menos (o IRS aumenta menos) e os lucros das empresas crescem menos (o IRC aumenta menos). Ou seja, mantendo as mesmas políticas, com um crescimento económico inferior, a receita fiscal só poderia descer, e não aumentar 4%.

A única forma de conciliar esta previsão de crescimento da receita fiscal é com o recuo nas medidas de redução de impostos. Ou seja, o Governo parte para as negociações já assumindo que deixará cair estas medidas do Orçamento.

PS: Pedro Nuno Santos deveria prestar atenção ao mea culpa de João Galamba sobre o excesso de entusiasmo com o hidrogénio verde. A presunção de que os governantes sabem para onde vai a economia esbarra constantemente na realidade, e quem acaba por pagar a fatura são os contribuintes. Pedro Nuno Santos ainda vai a tempo de evitar esse erro com a sua proposta de redução setorial do IRC.

Docente convidado da Porto Business School e especialista em Economia

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt