As eleições europeias costumam despertar pouco interesse entre os eleitores portugueses. No entanto, acredito que este ano tenha sido ligeiramente diferente. Os temas abordados geralmente são muito técnicos, de natureza financeira e macroeconómica, compreendidos por poucos, apesar de nos afetarem. Desta vez, dois temas destacaram-se entre candidatos com caraterísticas menos comuns do que o habitual: um novo, a guerra, e outro com importância renovada, a imigração.
É sobre imigração que gostaria de tecer algumas considerações. O Sudoeste Alentejano, frequentemente associado a Odemira, revelou-se no último censo como a região de maior crescimento demográfico em Portugal. Portanto, num cenário em que o país se encontra em declínio populacional, a região cresce. E cresce não apenas em número de pessoas, mas em bem-estar, riqueza, exportações e turismo. Esse crescimento deve-se, em grande parte, ao contributo da imigração.
É importante recordar que há 20 anos, 2000 estrangeiros habitavam no município. Hoje, estima-se que sejam 12 000, sendo que 10 000 novos habitantes, oriundos de 80 nacionalidades, tiveram um impacto assinalável na geração de riqueza. Tal como os 6000 hectares de regadio (1% da área regada nacional) de Odemira representam 15% das exportações de frutas, legumes e flores de Portugal, estes imigrantes contribuíram significativamente para a recuperação de uma região em declínio. Como alguém dizia, é como se 40% do mundo estivesse ali representado.
Refira-se que a maioria dos recém-chegados vêm do Nepal, da Índia e do Bangladesh, representando nacionalidades que se adaptaram bem às necessidades da região àquilo que esta tem para oferecer. Esse ponto é ainda mais relevante quando consideramos a retórica chocante de André Ventura, que classificou esses imigrantes como indesejáveis.
É preocupante ver a escalada no discurso do Chega que num primeiro momento, cautelosamente, apenas referia a necessidade de regular a entrada de imigrantes (com a qual de uma forma ou de outra, todos concordamos) que mais tarde, em Espanha, aconchegado pelo conforto de partidos congéneres, defendia barrar a entrada de imigrantes islâmicos. Mais recentemente, afirmou que a nossa imigração deveria centrar-se na entrada de falantes de português com uma matriz cultural próxima da nossa, em detrimento dos asiáticos.
Só quem não conhece a realidade de Odemira é que pode negar a forma genericamente pacífica, equilibrada e de crescente integração com que estas comunidades convivem com a realidade local. Imigrantes de língua portuguesa têm a vantagem do entendimento mútuo do idioma, mas muitas vezes não possuem as características de trabalho adequadas à agricultura. Já os imigrantes asiáticos trazem consigo uma delicadeza e simpatia oriental, além de uma sensibilidade para manusear produtos frescos e frágeis. São geralmente pacíficos, cordatos e trabalhadores, utilizando a sua estadia para enviar dinheiro para casa ou trazer as suas famílias.
Odemira, no entanto, não é um mar de rosas. A rápida chegada de um grande número de pessoas trouxe problemas, especialmente no campo da habitação, pelo que resolver essa questão evitaria o surgimento de muitos outros problemas. A questão da habitação requer ação do Estado Central, do Município e dos particulares.
Do Estado, é urgente a produção de legislação que permita a criação de alojamentos coletivos urbanos para uso temporário – algo que Espanha fez há 20 anos. Do Município, espera-se a aceleração da revisão do PDM para permitir mais construções. Dos particulares, especialmente dos agricultores, deverá reconhecer-se-lhes o mérito de, após uma luta de seis anos para obter autorização para construir alojamentos dignos nas próprias quintas, terem criado nos últimos dois anos 2.000 camas com outras 1.000 em construção.
São cerca de 15 milhões de euros que poderiam ser destinados a investimento agrícola, mas que a urgência do tema destinou à construção de casas. Essas novas habitações, muitas vezes mais confortáveis do que as de muitos dos nossos compatriotas, são uma resposta a uma necessidade urgente, destacando o mérito dos agricultores em priorizar o bem-estar dos trabalhadores.
Odemira faz, assim, um balanço globalmente positivo do impacto da imigração no seu território. Vê, no entanto, com bons olhos as medidas recentemente tomadas pelo Governo visando a forma e ritmo das entradas de trabalhadores migrantes em Portugal.A monitorização do equilíbrio entre procura e oferta de mão de obra é essencial para garantir que uns e outros - cidadãos portugueses e imigrantes - entendem e veem satisfeita a complementaridade do que cada um aporta ao desenvolvimento sustentável do País.
Luís Mesquita Dias, presidente da direção da Associação dos Horticultores, Fruticultores e Floricultores dos Concelhos de Odemira e Aljezur