O setor da aviação em Portugal, o turismo português e a economia nacional precisam urgentemente que a privatização da TAP - que umas vezes parece bem lançada e outras parece perder gás, consoante o calendário - represente não só a diminuição da presença do Estado e dos governos na gestão da companhia, mas também que marque o início de uma reviravolta de fundo no setor.Noutras ocasiões o Dinheiro Vivo teve oportunidade de analisar o processo da TAP, as suas contas e operações, mas hoje é o tema da assistência em escala que merece um escrutínio especial.Parente menor da aviação, por não ter associado o glamour que outros tempos traziam às viagens aéreas, o handling é uma parte essencial da operação de uma companhia e, por conseguinte, dos aeroportos de todo o mundo. As operações das companhias de handling são sujeitadas a regras de segurança e controlo quase tão apertadas como as operações de voo; os seus trabalhadores são tão analisados do ponto de vista da segurança como os tripulantes de cabina e como os pilotos. Mas não usam um uniforme catita nem aparecem nas capas das revistas de bordo. Pelo contrário, andam de colete fluorescente, é pessoal que se suja de óleo a puxar os aviões no taxiway, a carregar toneladas de bagagem. Estão muitas vezes longe da nossa vista, mas são essenciais. Quando falham ou fazem greve, há companhias que se atrasam ou param, há passageiros atarantados nos aeroportos ou em filas intermináveis. O Aeroporto de Lisboa mostra bem isso.O handling em Lisboa está prestes a entrar numa guerra que dificilmente os portugueses entenderão na sua plenitude. Desde logo porque só lhes chamará a atenção se se virem em longas filas no caminho para as Seychelles.Mas também porque não sentem que tenham alguma coisa a ver com isso. A questão é que têm. Esta semana, ficamos a saber que a Menzies (a empresa que comprou a Groundforce e que tem as licenças para fazer a assistência em escala em Lisboa e no Porto) está prestes a perdê-las, porque a ANAC (o regulador do setor) a classificou em segundo lugar no concurso internacional. A primeira classificada foi uma empresa espanhola, a South (detida pela Iberia, do Grupo IAG), em conjunto com a Clece Portugal.Ora a Menzies não aceita ter perdido o primeiro lugar e vai recorrer com todas as armas que tem. A primeira delas poderá ser a de acenar com o fantasma dos despedimentos, numa lógica de “ou ficamos, ou os espanhóis vão despedir a mão de obra”. Mais importante do que apontar aqui as falhas nesse argumento - algo que fazemos nas páginas 8 e 9 desta edição - o que esta postura sinaliza é uma vontade de combater por todos os meios o resultado de um concurso conduzido por uma entidade independente, a ANAC. E, eventualmente, até arregimentando os trabalhadores sindicalizados da empresa para a sua causa. O que nos relembra os tempos em que a Groundforce era propriedade de Alfredo Casimiro, um homem que acabaria por levar uma empresa com quase 3.000 trabalhadores para um processo de insolvência que ainda hoje deixou as suas cicatrizes. Pelo meio, a Menzies comprometeu-se a pagar 40 milhões de euros em dívidas aos credores (com um desfecho ainda incerto) e fez um acordo com a TAP (que detém uma fatia grande da empresa) em que lhe dá descontos no serviço de handling.Posto isto, de que reviravolta falava no início? Simples. O setor da aviação em Portugal precisa de novas formas de trabalhar; da gestão de players fortes, bem capitalizados e com provas dadas nas operações correntes e na forma de as inovar. Seja na companhia de bandeira nacional, a TAP, seja na empresa que lhe vai prestar os serviços de handling. Que seja a Menzies a fazê-lo e, como um grande operador mundial, que se esforce até ao limite para mudar de atitude. Que seja o parceiro que a nova TAP - saída da privatização - precisa para crescer em Lisboa e, depois, em Alcochete. Mas se isso não estiver ao alcance das suas possibilidades, se não for esse o seu objetivo principal, então que deixe a companhia aérea nacional, o turismo e a economia nacional crescer com outros parceiros.