A vontade de poder e de controlo
A partir de Alain Turing, (1912-1954) e da sua máquina universal, a ideia de sermos governados por números tornou-se, uma possibilidade real. Vivemos num mundo, cada vez mais governado e controlado por algoritmos, que passo a passo e de modo invisível moldam as nossas mentes e as nossas vidas.
Aristóteles definia o movimento como algo originado de um potencial que, quando posto em ação, resultava num produto final. A conceção do movimento, ligada a mudanças no espaço, permanece presente nas ciências e tecnologias, que procuram controlar ou prever as transformações no mundo. A mentalidade tecnocientífica é marcada por essa intenção de controlar o movimento e a mudança. Vontade ilimitada e totalizante, obscurecendo outras formas de abordagem destes fenómenos. Hoje, esta vontade de poder foi externalizada no cibermundo, permitindo o controlo automático tanto do movimento nesse mundo virtual quanto no mundo humano compartilhado.
Este movimento assenta numa relação causal, ao longo de um tempo linear e unidimensional. Este tempo linear permanece incontestado pela tecnociência moderna, que o ignora, embora seja essencial para a previsibilidade científica. Na impossibilidade de explicar um movimento com base em causas claras, recorre-se a probabilidades e correlações estatísticas. No contexto do cibermundo, grandes volumes de dados, big data, são usados para identificar padrões e regularidades, permitindo a extrapolação dessas informações num tempo linear para previsões futuras.
O uso de algoritmos para explorar dados e prever padrões levanta questões sobre a natureza da "Inteligência" Artificial (IA). Algoritmos de “aprendizagem” automática e redes neuronais adaptam-se aos dados ajustando limiares e detetando padrões de forma determinística. A "inteligência" da IA reside no código binário criado por humanos. Exemplos como a previsão meteorológica demonstram a sua precisão, mas a IA enfrenta limitações em prever comportamentos humanos, como em eleições, onde mudanças de contexto ou estados emocionais diferentes do eleitorado, podem alterar os padrões. A questão central é a de saber, se a IA pode olhar para o futuro de forma aberta e criativa, considerando a incerteza, a dúvida e a imprevisibilidade, como fazemos quando imaginamos o futuro.
A IA é determinística, não possui nem um futuro aberto, nem liberdade, características essenciais à inteligência humana, capaz de direcionar inúmeros movimentos para fins existenciais no futuro. Exploramos a tridimensionalidade temporal, passado, presente e futuro de maneira fluida e hermenêutica. Movemo-nos entre eventos de diferentes tempos de forma não linear, associando-os ou dissociando-os livremente, possibilitando uma compreensão profunda dos fenómenos sem pretensões de controlo. Graças à imaginação, à emoção e à experiência subjetiva, podemos refletir sobre o futuro(s) sem intenção de o realizar. Projetamo-nos nele, e interpretamos o passado de maneira aberta e criativa, que não se esgota, num modo de operar algorítmico.
*Conceição Soares, Docente da Católica Porto Business School