Acompanhar a transformação laboral

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O mundo do trabalho está em rápida e profunda transformação. A disrupção tecnológica mas também o maior reconhecimento e valorização do trabalho, a melhoria das condições laborais e a conciliação entre vida pessoal e profissional estão no cerne desta transformação. Assistimos à emergência de novas profissões e à extinção de outras, bem como à adoção de novas formas de organização, realização e remuneração do trabalho. Conceitos como teletrabalho, trabalho em rede, freelancing, adaptabilidade horária, gestão por resultados, benefícios flexíveis, salários variáveis, entre outros, não são hoje estranhos à nossa realidade laboral.

A economia atual – que é caracterizada pela digitalização e automação de atividades, pelo uso da Inteligência Artificial, pela adoção de plataformas online e pela criação de modelos de negócio mais inovadores – exige novas relações laborais. Relações, essas, que têm como denominador comum a flexibilidade. A flexibilização do trabalho corresponde a novas regras, contratos e formas de organização laboral em que tanto o empregador como os trabalhadores ganham maior autonomia. Maior autonomia no que respeita a horários e locais de trabalho, a funções e objetivos, a remunerações, benefícios e vínculos contratuais.

Perante a avassaladora alteração de paradigmas nas relações laborais, seria um erro e até uma irresponsabilidade não atualizar o Código do Trabalho. Também nesta matéria a economia portuguesa não pode ficar para trás, colocando em risco a nossa prosperidade futura. Para termos empresas mais produtivas e competitivas, retenção de talento, salários mais justos, condições laborais atrativas e oportunidades de carreira, o Código do Trabalho deve adaptar-se às dinâmicas da economia atual e aos modelos de organização laboral que lhe são inerentes. 

Reconheço que esta é uma matéria altamente sensível, não apenas pelas suas implicações sociais mas também pela natural relutância em abandonar práticas e conceitos enraizados. A revisão do Código do Trabalho não pode, no entanto, ser adiada e o anteprojeto apresentado pelo Governo é um ponto de partida num processo negocial que promete ser longo. Importa que, quer no debate político, quer sobretudo na concertação social, a negociação se foque no que é essencial e realizável, evitando a dispersão, a chicana, a demagogia, o revanchismo. 

Há que desmitificar a ideia de que a versatilidade laboral é uma forma ardilosa de liberalizar os despedimentos. Não é. Trata-se, simplesmente, de conferir capacidade de adaptação às empresas, para que estas possam gerir a atividade dos seus recursos humanos em função dos desafios internos e externos que enfrentam. Também não é verdade que os empregadores tenham um irreprimível impulso de despedir, como se as empresas ganhassem com a instabilidade interna e a precaridade laboral fosse um fator de competitividade. Sejamos claros: é do interesse das empresas contratar e reter bons trabalhadores, valorizando-os e dando-lhes estabilidade, oportunidades e qualidade de vida no trabalho. Mais ainda nos dias de hoje, em que a mão de obra é um bem escasso…

Portugal tem uma cultura democrática e jurídica que garante dignidade, urbanidade e respeito no trabalho. Este património é robusto e inegociável. É necessário corrigir algumas das medidas da última revisão do Código do Trabalho e alinhar esta legislação com a evolução do mercado laboral, retirando rigidez ao normativo em vigor. Tudo isto com o objetivo de preparar a nossa economia para o século XXI, com benefícios equitativos para empregadores e trabalhadores.  

Presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal  

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