Crescer sem produzir: o paradoxo português

Publicado a

Num momento em que a economia portuguesa regista algum crescimento, é importante não confundir dinamismo conjuntural com transformação estrutural. A verdade incómoda é que Portugal continua ainda demasiado preso a um padrão de desenvolvimento assente em trabalho intensivo e baixa produtividade, o que limita a criação de riqueza e, consequentemente, o aumento sustentável dos salários.

Segundo dados da União Europeia, a produtividade do trabalho em Portugal é cerca de 25% inferior à média comunitária. Pior: o ritmo de crescimento da produtividade tem sido anémico. Em vez de um choque de inovação, o que se observa é uma economia que ainda depende excessivamente de setores de baixos salários, como o turismo, a construção e os serviços não transacionáveis.

Este não é apenas um problema económico – é um problema político. Se é certo que aprodutividade não aumenta por decreto, a verdade é que depende de escolhas estruturais: investimento em I&D, qualificação da força de trabalho, melhoria da gestão nas empresas e um Estado que não seja apenas regulador (e, muito menos, complicador!) mas facilitador da inovação.

Portugal forma quadros altamente qualificados, mas não consegue valorizá-los, tirando partido de todo o seu potencial. Muitos jovens acabam por emigrar à procura de melhores condições e perspetivas. Isto significa que estamos, na prática, a subsidiar o capital humano de outras economias mais produtivas. Simultaneamente, muitas empresas continuam a resistir à mudança, preferindo estratégias de contenção de custos à modernização tecnológica.

A questão essencial é esta: queremos continuar a competir com base em baixos salários e incentivos fiscais de curto prazo? Ou vamos apostar num modelo de crescimento baseado em valor acrescentado, diferenciação e inovação? Para que esta segunda hipótese ocorra, é necessário criar condições para que valha a pena investir em Portugal– não apenas para investidores estrangeiros, mas também para os nossos próprios empreendedores e capitalistas. E aqui aplico a palavra “capitalista” sem qualquer carga ideológica, mas no sentido literal do termo: aquele que detém capital e o utiliza para criar riqueza.

O Plano de Recuperação e Resiliência representa uma oportunidade rara para modernizar infraestruturas, digitalizar a economia e qualificar o capital humano. Mas essa oportunidade será desperdiçada se as reformas estruturais forem tímidas ou dominadas pela lógica da distribuição em vez da transformação.

A baixa produtividade que se observa na economia portuguesa encontra eco também na ineficiência da própria máquina do Estado. A lentidão administrativa, a burocracia excessiva e a falta de liderança efetiva em muitos serviços públicos penalizam não só os cidadãos, mas também as empresas que enfrentam custos acrescidos, atrasos e incertezas na sua atividade.

Esta ineficiência do Estado retira competitividade ao tecido económico, ao mesmo tempo que desincentiva o investimento privado e o empreendedorismo. Um setor público mais leve e ágil, orientado para resultados e centrado no utilizador, poderia ser um catalisador da produtividade nacional, em vez do entrave silencioso que é atualmente.

Por outro lado, a política fiscal vigente continua a penalizar a criação de riqueza, dificultando a capitalização das empresas e limitando os recursos disponíveis para o autofinanciamento da inovação. A elevada carga tributária sobre o rendimento empresarial, combinada com um sistema fiscal complexo e instável, desincentiva o risco e a reinvenção.

Num país onde o investimento em I&D já é estruturalmente baixo, esta realidade agrava a dependência de fundos públicos e a dificuldade em escalar negócios inovadores. A produtividade não aumentará de forma sustentada enquanto o sistema fiscal não for reformulado para premiar o mérito, a iniciativa e a criação de valor.

Em suma , é tempo de deixar de tratar a produtividade como um conceito técnico e encará-la como aquilo que realmente é: o cerne do nosso futuro económico. Sem ela, não há crescimento sustentável, não há salários dignos, nem há país com ambição europeia.

Presidente da Ordem dos Economistas - Norte

Diário de Notícias
www.dn.pt