Mexa nas tabelas de retenção por sua conta e risco

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O Governo viu ser aprovada esta semana no parlamento uma nova descida do IRS para 2025 (bem como uma norma para um adicional em 2026), que se sentirá no bolso dos contribuintes em agosto e setembro, mas que terá efeitos retroactivos a janeiro. Não está em causa a percentagem da descida, que representa um alívio que pode ir de 2 a 15 euros mensais na carteira dos contribuintes. Cada um faz o que pode politicamente e, no que toca a impostos, o primeiro-ministro, Luís Montenegro, tem defendido isto mesmo: uma menor carga fiscal, com eventual consequência de maior rendimento disponível para o crescimento da economia pela via do consumo. Logo se verá se resulta ou se o rigor das contas públicas vai fora, juntamente com a agua do banho e com os aumentos de despesa na Defesa.

Mas há questões conexas que precisam de alguma reflexão. As sucessivas mexidas no IRS também têm passado por acertos nas tabelas de retenção na fonte e isso tem dado uma enorme dor de cabeça a muitos contribuintes.

Reconhecidamente menos disciplinados financeiramente do que os cidadãos de outras geografias, os portugueses costumavam usar as retenções na fonte (que depois resultavam num sumarento reembolso do IRS por alturas de maio) como uma forma de poupança à força. Nada podiam fazer para evita-lá mês a mês, mas depois com o reembolso do Fisco equilibravam as contas desfalcadas, pagavam o seguro anual do carro, substituíam a televisão ou a máquina de lavar ou punham (finalmente) de lado um dinheirinho para as férias da família.

As alterações às tabelas de retenção feitas pelo primeiro governo AD mudaram o cenário. Há muitos contribuintes que não só não recebem reembolso, como têm de pagar. E muito. Há casos de pessoas com rendimentos mais baixos que desembolsam o equivalente a um dos seus salários líquidos. Para muitos, segue-se um plano prestacional de pagamento do IRS e, nos casos em que até isto se revele incomportável, uma destino ainda pior.

Os mais frios aconselham aos cidadãos que se preparem melhor, que se adaptem à nova vida e que façam como os outros contribuintes europeus: ponham tudo numa conta à parte para poder cumprir , certinho, quando chegar a altura. Mas as coisas não são assim tão simples, não se mudam hábitos de décadas por decreto. Nem a mais eficaz máquina estatal, a Autoridade Tributária, consegue isso.

É por isso que o Governo deve trabalhar para que exista uma “aterragem mais suave” no momento de entregar a declaração de IRS, calibrando as retenções ao longo do ano para sejam apenas o suficiente para que não haja lugar a pagamento ao Estado. Isso evitaria casos desnecessários de desespero em algumas famílias e, já agora, seria o único desfecho politicamente aceitável para os partidos (todos de direita, já agora) que aprovaram as descidas do IRS. Quando chegarem as autárquicas e, eventualmente, as próximas legislativas antecipadas, o IRS - como sempre - jogará um papel importante.

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