Em Pedreira, cidade de 39 mil habitantes do estado do Maranhão, no nordeste do Brasil, foram extraídos 540 mil dentes em 2021. Isto significa que, em média, cada cidadão arrancou 14 dentes, incluindo na conta os bebés que ainda nem os têm.
Noutra cidade, realizaram-se 12,7 mil radiografias de dedo no mesmo ano. E, noutra ainda, foram comprados tratores 259% acima do preço de mercado.
Estas e outras distorções são fruto do “Orçamento Secreto”, chamado ainda de “Tratoraço”, por causa do último dos casos acima citados, de “maior escândalo da história no planeta Terra”, pela hoje ministra Simone Tebet, na altura em que era ainda apenas candidata presidencial pelo centro em 2022, ou de “Bolsolão”, por ter nascido na gestão de Jair Bolsonaro.
O “Orçamento Secreto” nasceu, de facto, do medo de Bolsonaro ser alvo de impeachment pelo Congresso. Para apaziguar os ânimos da casa legislativa, o então presidente destinou cerca de três mil milhões de euros aos congressistas na forma de “emendas parlamentares”, uma verba que faz do conhecido Mensalão do PT, julgado em 2011, mera brincadeira num cofrinho de crianças.
Essas “emendas parlamentares” são nacos do orçamento da nação atribuídas aos deputados, que depois as aplicam nos respectivos feudos sem necessidade de explicar nem onde, nem como, nem quanto – daí o “secreto” a seguir a "orçamento'.
Uma vez aplicado o dinheiro nos tais respectivos feudos, os políticos compram a gratidão dos eleitores e facilmente se reelegem. Pelo meio, claro, os mais despudorados ainda desviam verbas em tratores, em aparelhos de radiografia ou em máquinas de extração dentária.
Para fazer face à pouca vergonha, um juiz do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu suspender na última semana de 2024 essas transferências financeiras, atendendo a um pedido do PSOL, partido semelhante ao português Bloco de Esquerda. Flávio Dino, o juiz que chegou ao STF após ter sido ministro da Justiça do atual governo, foi ainda mais longe e pediu à Polícia Federal para apurar qual o destino de um total de 4,2 mil milhões de reais em emendas parlamentares – isto é, para tornar o "Orçamento Secreto" mais transparente fez dele um caso de polícia para constrangimento dos envolvidos.
O Congresso, por isso, está zangado. Com o STF, que quer, pasme-se, saber onde o dinheiro público vai ser gasto, e, por tabela, com o presidente Lula da Silva, que decidiu nomear para o STF aquele juiz “chato” que pretende acabar com a farra do “Orçamento Secreto”.
A farra que permitiu comprar tratores 259% acima do preço de mercado, 12,7 mil radiografias de dedo no mesmo ano e a extração de 540 mil dentes numa cidade com 39 mil habitantes entre outras dentadas no erário público.
Os próximos episódios do caso serão já em 2025.
Em São Paulo, Brasil