É hora de fazer uso do engenho, aguçado pela necessidade
Esta semana ficaram a conhecer-vos vários indicadores que permitem tomar o pulso não apenas à economia nacional, mas também europeia: Portugal reforçou o excedente externo em 2024 para 9,3 mil milhões de euros; os aumentos salariais na Função Pública começaram a ser pagos ontem; os dados do INE revelaram que o número de trabalhadores ricos disparou desde o fim da troika, nunca tendo havido em Portugal tanta gente a ganhar 3000 euros líquidos, ou mais. Ficámos ainda a saber que, ainda assim, os preços das casas em Lisboa, voltaram a subir: 5,5% em 2024, para um valor 55% superior face ao preço agregado da área metropolitana. E as vendas continuaram a subir. Em termos Europeus, e em vésperas de aumento da tensão entre a UE e a administração norte-americana, os números mostraram que o excedente comercial da União Europeia mais do que quadruplicou em 2024, muito graças à queda do preço do gás natural. Vários dos nossos governantes estão, entretanto, no Brasil, a tentar fechar uma série de acordos comerciais que podem ser vantajosos não apenas para Portugal mas também para outros Estados-membros, se finalmente se chegar a entendimento entre o bloco europeu e o Mercosul. Tudo bons sinais, numa altura em que bem que precisamos deles, uma vez que no cenário geopolítico assistimos, também durante os últimos dias, a uma escalada da tensão entre o presidente ucraniano e Donald Trump, e a uma retirada da União Europeia da mesa das negociações entre Rússia e Ucrânia. Já alguma água foi entretanto posta na fervura, mas a verdade é que o ambiente continua volátil, e a economia vai sempre ressentir-se. Apesar dos bons números que, assim apresentados pelos institutos de estatística nos enchem de esperança, a verdade é que muitas famílias continuam a atravessar muitas dificuldades, e a incerteza sobre o que ainda está para vir – seja através de uma guerra comercial com os EUA ou do que o prolongar da guerra entre a Rússia e a Ucrânia – paira como uma nuvem negra sobre todos. No Dinheiro Vivo desta semana, os nossos colunistas instam-nos a olhar para as lições da História e a focarmo-nos naquilo que podemos concretizar. Uma espécie de conselho gratuito não apenas para os nossos leitores mas sobretudo para as empresas nacionais: agora é hora de mostrarem o que valem, num contexto complexo e extremamente volátil. Diz-nos um antigo ditado que “a necessidade aguça o engenho”. É certo, que na última década, fomos mais do que uma vez chamados a usar dessa qualidade tão portuguesa, o engenho, para conseguir atravessar tempos mais tormentosos. Atualmente, é urgente que todos os Estados-membros façam uso dessa capacidade de engenho para que não percamos, na espuma e nos gritos dos discursos vazios, aquilo que a Europa tem de melhor: a experiência e a certeza de quem sabe fazer melhor. Num artigo de opinião de ontem, publicado no El País, o escritor Héctor Abad Faciolince lembrava que apesar de a Europa ter “um PIB inferior aos EUA, a população europeia vive em condições mais simpáticas e muito menos desiguais” do que a congénere norte-americana. E que a grandeza da Europa continua a residir “na defesa da sua beleza, no poder sedutor do seu modelo económico e cultural”. Agarremo-nos às palavras de Faciolince – e ao relatório Draghi, que tantas diretivas nos deixa – e usemos a oportunidade para nos focarmos naquilo que realmente sabemos fazer: unir esforços e lutar por temos melhores e mais serenos.