Orçamento de 2024 "não está totalmente alinhado" com recomendações europeias

Há luz verde para o Orçamento do Estado do próximo ano, mas peritos de Bruxelas admitem nova avaliação ao documento português depois das eleições legislativas de 10 de março, e deixam críticas às medidas previstas na proposta de apoio aos custos energéticos.
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A Comissão Europeia deu ontem luz verde à proposta de Orçamento do Estado para 2024 apresentado pelo governo português, embora considere que "não está totalmente alinhado" com as Recomendações Europeias. O reparo deve-se às medidas para aliviar a fatura da eletricidade.

"A principal razão" deve-se ao facto de aquelas medidas "continuarem em 2024", com um impacto orçamental "significativamente" superior ao que Bruxelas tinha projetado. "A estimativa com a qual estamos a trabalhar é a de que em 2023 estas [medidas] representariam 1,3% do PIB, caindo para 0,7% do PIB com a recomendação", afirmou uma fonte da Comissão Europeia, sublinhando que "o compromisso de eliminar ou reduzir gradualmente as medidas de apoio à energia" não segue a linha "esperada", em 2024.

Bruxelas deixa ainda outra advertência sobre o impacto das medidas energéticas, já que alguma da "poupança" que é gerada por via do seu alívio, "não está a ser totalmente utilizada para os fins de consolidação orçamental", referiu um alto funcionário ouvido pelo Dinheiro Vivo.

A par de Portugal, há outros Estados-membros que são alvo do mesmo reparo da Comissão Europeia. A lista tem "seis países", inclui "a Croácia, Alemanha, França, Luxemburgo, Malta e Portugal".

Questionado sobre quais as consequências previstas, caso os governos insistam em manter as medidas, o vice-presidente da Comissão Europeia com as pastas económicas, Valdis Dombrovskis, afirma que, nesta fase, "os países são convidados a prepararem-se", para "aplicar as medidas necessárias", de forma a colocar os planos de orçamento "em conformidade com as orientações orçamentais".

Por outro lado, numa altura em que o país está mergulhado numa crise política, Dombrovskis considerou importante reforçar "uma mensagem positiva", na medida em que, "de acordo com as previsões do outono, espera-se que Portugal atinja o seu objetivo orçamental de médio prazo em 2024".

De acordo com o documento da Comissão Europeia, apesar do reparo a um orçamento expansionista, no qual se regista um aumento da despesa primária "acima da taxa máxima recomendada de 5,7% em 2024", projeta-se que o saldo estrutural de Portugal seja ligeiramente negativo, isto é, "-0,1% do PIB em 2024", colocando o país acima do seu objetivo orçamental de médio prazo, e, portanto, "em conformidade com o recomendado pelo Conselho".

Os peritos de Bruxelas salientam que, "em termos de saldo orçamental, a posição é positiva com um excedente de 0,8% do PIB este ano, e uma situação de equilíbrio orçamental nos próximos anos", além de a dívida seguir "numa trajetória descendente".

Aliás, este é um dos aspetos que mais se destaca, na perspetiva do comissário da Economia, Paolo Gentiloni, que sublinhou "o facto positivo de vermos Portugal muito perto de atingir um nível de dívida inferior a 100%". Bruxelas espera que a dívida pública de Portugal em relação ao PIB atinja 103,4% em 2023, e continue a contrair-se para 100,3% em 2024 e 97,2% em 2025. O governo português projeta a descida abaixo dos 100% do PIB já no próximo ano.

Reconhecendo que "há uma pequena divergência entre a Comissão e as autoridades portuguesas quanto à data em que se atingirá esse nível de dívida inferior a 100%", o comissário frisou que se trata de "uma tendência que consideramos muito positiva".

Crise política
Perante a atual situação de crise política, com eleições marcadas para 10 de março de 2024, o perito da Comissão Europeia reconhece que será necessária uma nova avaliação das "medidas orçamentais", quando um novo governo estiver em funções.
Na apresentação do boletim macroeconómico do outono, o comissário Paulo Gentiloni tinha destacado "a decisão das autoridades nacionais de prosseguirem a aprovação do Orçamento do Estado, apesar da crise que se vive em Portugal". Gentiloni desvalorizou ainda o impacto da crise política, afirmando que "não" crê que esta situação "tenha impacto no investimento neste país".

Bruxelas aguarda, porém, pela clarificação política, para realizar uma nova análise a Portugal. "Obviamente, teremos que abordar a situação orçamental pós-eleição e se um novo governo entrar, e assim que adotar medidas orçamentais", vincou um perito da Comissão Europeia, familiarizado com o tema, ouvido pelo Dinheiro Vivo.

Prudência
A Comissão Europeia recomenda uma gestão prudente dos orçamentos, insistindo que "todos os Estados-membros" devem "eliminar ou reduzir gradualmente as medidas de apoio à energia o mais rápido possível, em 2023 e 2024", sublinhou um alto funcionário, salientando que "as poupanças relativas à redução das medidas de apoio à energia" devem ser orientadas "para fins de consolidação orçamental".

A Comissão também "é da opinião de que Portugal fez progressos limitados" em relação aos elementos estruturais das recomendações orçamentais feitas pelo Conselho. Por essa razão, "convida as autoridades portuguesas a acelerar o progresso".

Bruxelas promete "uma descrição abrangente dos progressos realizados", no âmbito das recomendações específicas por país, que serão apresentas" pela Comissão na primavera de 2024.

Correspondente em Bruxelas

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