
Quem visitou, esta semana, o Modtissimo pôde já experimentar o que será o futuro passaporte digital de produto, o chamado DPP (sigla inglesa), que, a partir de 2027, terá de acompanhar todos os artigos de moda no espaço comunitário, permitindo ao consumidor saber onde e como foi feita a peça que quer comprar, designadamente ao nível do consumo de´água e energia, emissões de CO2 ou a incorporação de resíduos. Todos os 28 coordenados do Green Circle no salão do têxtil e vestuário na Exponor foram avaliados e estavam acompanhadas do respetivo passaporte desenvolvido pelo Citeve.
O iTechSyle Green Circle é uma iniciativa do Citeve - Centro Tecnológico do Têxtil e Vestuário, com a curadoriadacomponente de desenvolvimento criativo a cargo de Paulo Gomes, destinada a promover os produtos têxteis portugueses, ao nível da sustentabilidade e da economia circular, juntos dos clientes internacionais. E os coordenados apresentados na edição de setembro do Modtíssimo seguem, depois, para as várias feiras internacionais em que o setor marca presença. Em fevereiro, três empresas partilharam já os seus dados para o passaporte digital, e na edição desta semana o repto foi lançado a todas as participantes.
Nem todas as peças expostas puderam já conter o dito DPP, porque algumas das empresas não estão ainda preparadas para disponibilizar a informação, admite Braz Costa, diretor geral do Centro Tecnológico. Mas a grande maioria já ostentava a etiqueta com o respetivo QR Code que dá acesso à plataforma que indica o índice global da peça, considerando as quatro dimensão da sustentabilidade: ambiental, circular, económica e social. Por exemplo, a consulta do passaporte digital de um Casaco Capa preto submetido pela Lemar mostra que o índice global da peça é de 70%, ou seja tem a classificação C - sendo A o mais sustentável e F o menos -, sendo de 74% a nível ambiental e circular (classificação C) e de 62% a nível económico e social (classificação D).
Pela etiqueta ficamos ainda a saber que se trata de uma casaco de mulher com 1,4 quilogramas de peso total, que é reciclável e não tem químicos perigosos usados na sua composição: a peça foi feita a partir de poliamida 6 e de poliamida reciclada, com 83% de incorporação de resíduos, tendo sido gastos 111 litros de água na sua produção e 306 gramas de químicos. A pegada de carbono é de 11,02 kgs.
O objetivo da Comissão Europeia, no âmbito do Green Deal, é promover decisões de compra mais conscientes e elegeu, como ponto de partida para o arranque desta revolução, três setores altamente poluentes : a eletrónica, as baterias e a moda, ou seja, o têxtil, vestuário e calçado. E embora, a nível europeu, se esteja ainda a trabalhar nas regras específicas para cada tipologia de produto, o que se espera é que, no início do próximo ano, haja já uma definição de quais as informações opcionais e quais as que terão que constar obrigatoriamente no passaporte digital, e sobretudo quais as que estarão visíveis para a cadeia de valor e para o consumidor final.
Sendo certo que a adaptação necessária é imensa, designadamente ao nível das questões da rastreabilidade, é esperado que a implementação do DPP aconteça por etapas, apontando-se para o arranque efetivo em 2027, que depois irá sendo aprofundado nos anos seguintes.
O facto de 70% da roupa vendida no espaço europeu ser importada da Ásia, é um desafio acrescido. “Com uma agravante. É que tudo o que vem de fora e não cumpre a legislação europeia, em matéria de substâncias nocivas, por exemplo, nunca mais sai, na medida em que vamos ser obrigados a fazer a reciclagem de todos os artigos têxteis, que produzimos ou que importamos, o que significa que o lixo ou o veneno que aqui entrar, vai-se perpetuar”, diz Braz Costa, mostrando-se convicto que “haverá um esforço e uma pressão grande para que as condições sejam iguais para todos”.
Da parte do Citeve, o trabalho de casa começou já a ser feito por antecipação, com o passaporte digital a ser desenvolvido no âmbito do be@t, o projeto de bioeconomia sustentável que envolve mais de meia centena de parceiros, entre empresas e entidades do sistema científico e tecnológico, e representa um investimento total de 138 milhões de euros, cofinanciados pelo Plano de Recuperação e Resiliência e pelos fundos europeus Next Generation EU.
Foram mais de 100 os parâmetros identificados e com o qual foi construído o índice utilizado e desenvolvido o algoritmo para o calcular. “E estamos já a negociar e a colaborar com outras iniciativas parecidas na Europa para, no fundo, convergirmos para uma solução final”, diz o responsável do Citeve. Que admite que esta é uma ferramenta em permanente evolução, estando agora o Citeve a preparar o seu lançamento com o serviço associado de preparar equipas que possam chegar junto das empresas e indicar-lhes o que precisam de fazer para cumprir com estas novas obrigações.
Da parte da indústria há já quem tenha tomado a iniciativa de contactar o Citeve para implementar o DPP, mesmo antes de este ser exigido. “São empresas que perceberam que o seu mercado vai valorizar esta solução”, diz. A palavra final cabe sempre à marca, mas o importante é que “a oferta portuguesa irá já artilhada com esse manancial de informação”.