Penúria

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Imaginem-se na seguinte situação: realizam investigação

científica experimental numa instituição universitária que dispõe

(teoricamente) de autonomia. Só se for a nível do que tem para

administrar, já que o nível do financiamento do ensino superior

depende daquilo que o governo lhe confere.

Neste ano, para surpresa dos reitores, surge um corte adicional de

30 milhões de euros além do acordado na elaboração do OE 2014. O

CRUP declarou cortar relações com o ministro da tutela para logo de

seguida tentar um último apelo junto do primeiro-ministro. Em vão.

Há assim que espalhar o mal pelas aldeias: o Estado já não

financia o necessário para pagar os salários, os reitores informam

as faculdades, e estas, os departamentos, de que a verba em falta tem

de ser compensada com mais receitas próprias. Como? Com projetos de

investigação e com serviços prestados a terceiros. Como o

financiamento de projetos também conta com verbas minguantes e a

investigação aplicada não tem uma elasticidade infinita para

crescer, os investigadores não têm dinheiro para o indispensável:

para cumprir com os encargos devidos para manter patentes, o que leva

a que estas se percam; para pagar as despesas com a vinda de

cientistas estrangeiros que façam parte de júris de doutoramento

que pretendem ser reconhecidos lá fora (opta-se pelos mais

baratinhos - amigos espanhóis, de preferência - pagos pelo bolso

dos interessados...); para - depois de longos e tortuosos processos

de aceitação científica - pagar às revistas científicas de

referência, em cada campo de investigação, os 1000 a 1500 euros

que elas exigem para publicar os trabalhos já validados.

Laboratórios fecham. A revista Nature já prediz o recuo de anos na

ciência em Portugal.

Estes são os problemas reais, concretos, com os quais se

defrontam aqueles que lutam por fazer subir Portugal na lista do

saber, medido por critérios aceites por todo o mundo: patentes,

artigos científicos, número de referências. Para eles, o estado de

penúria do financiamento público lança-os numa situação próxima

da bancarrota - quando o ar do tempo convida a regozijarmo-nos com o

fim da emergência financeira. Assim, como pode, de boa-fé,

exigir-se a excelência?

Redator principal

Escreve à sexta-feira

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