
A transição digital está a ocorrer a uma tal velocidade que muitas pessoas ficarão de fora deste movimento e depois terão dificuldade em entrar no mercado de trabalho, sentindo-se infoexcluídas. Foi neste contexto, explica Marta Cunha, diretora executiva da R4E Portugal, que foi criada uma iniciativa chamada
“R4E, Reskilling for Employment”, altura em que várias empresas começaram a olhar para o tema da requalificação profissional “de uma forma mais profunda”. Segundo Marta Cunha, começou-se a olhar para a requalificação e para o reskilling “nesta lógica de que devia ser possível a qualquer pessoa que neste momento tem de mudar de função por via destas transições ou outro motivo, encontrar uma nova ocupação”.
Seguiu-se o programa “Promove”, que se diferencia pelo facto de serem as empresas a definirem os conteúdos dos programas de requalificação. E, no decorrer de tudo isto, surge, agora, a “ - Career Network.” Na prática, e de forma simplista, “estamos a juntar num só sítio aquilo que de melhor se faz em Portugal em termos de requalificação”. Uma “espécie de agregador de cursos que já existiam e cursos que vão existir”, com o diferencial de assumir a empregabilidade como um ponto fundamental. A ideia não é fazer uma formação só porque sim, mas “numa perspetiva de que o resultado final vai levar a pessoa a uma mudança da sua vida”. Como é que isso se aufere? Pois, comparando o número de pessoas que fizeram a formação com o número de quantas estão empregadas ao fim de X tempo. “Esses dados de impacto é que nos vão dar a real certeza de que estamos a conseguir chegar ao nosso objetivo final, que é mudar as vidas das pessoas para melhor, porque conseguimos tirá-las do desemprego e empregá-las”.
A plataforma também quer desmistificar a ideia de que a requalificação está direcionada apenas aos desempregados e/ou aos empregos não valorizados, ou seja, que está direcionada para um determinado subconjunto da população que é mais indiferenciado. Na verdade, aponta Marta Cunha, todos, e independentemente até da formação anterior que tenham, vão ter necessariamente de fazer o que se chamamos de aprendizagem ao longo da vida. Isto, porque “hoje as competências que temos tornam-se obsoletas muito rapidamente”.
Mas a NCN é mais do que um simples agregador de cursos de formação. A plataforma utiliza a inteligência artificial em duas vertentes. Por um lado, analisa as competência das pessoas e, com base nas mesmas e no objetivo final estabelecido, aponta quais as competências que essa pessoa precisa de adquirir e quais as formações necessárias para o conseguir. Por exemplo, se uma pessoa era comercial e quer assumir-se como software developer. São funções diferentes, com competências diferentes. Que podem ser adquiridas.
“Dentro da nossa plataforma vamos ter percursos mais direcionados para uma população que está numa situação de maior fragilidade, uma população que está neste momento desempregada e que pode procurar uma formação mais ou menos profunda, mas também outro tipo de cursos para outro tipo de pessoas que possam ter outras necessidades no momento”, explica Marta Cunha. O que leva a que a plataforma conte com uma variedade de cursos - presenciais, remotos, gratuitos ou subsidiados - “sempre para irmos ao encontro da maior audiência possível”.
A inteligência artificial também será utilizada pelas empresas, numa vertente em que irá combinar as competências que constam nas vagas publicitadas e as competências dos candidatos. Desta forma o processo de recrutamento não só é mais célere como eficaz. “Os anúncios de emprego são transformados em listagens de competências, e a plataforma vai automaticamente fazer a ligação com os vários perfis que já lá estão disponíveis, de pessoas requalificadas e vai dar a percentagem do match da ligação entre as competências que eu estou à procura enquanto empregador e as competências que aquela pessoa tem”, explica a diretora executiva da R4E Portugal, que acrescenta que, desta forma, o recrutador em vez de receber 100 (ou mais) currículos, “o que me vai acontecer nesta plataforma é que ela vai ordenar os currículos em função dos métodos de competências que aquela pessoa tem face ao meu anúncio”.
E não se pense que a inteligência artificial “trabalha” uma ou duas competências. Como aponta Marta Cunha, há 30 mil competências listadas.
A plataforma foi lançada a meio de outubro e já tem cerca de mil utilizadores. O que leva Marta Cunha a acreditar que, efetivamente, a plataforma vai “atingir um número muito elevado de pessoas”.
Projeto em Portugal e Espanha
A Península Ibérica toma a dianteira na implementação da plataforma de requalificação “NCN - New Career Network”, que “pretende ajudar a colmatar a necessidade de requalificar 20 milhões de europeus, juntando no mesmo local candidatos, empregadores e entidades formadoras”. O projeto integra a iniciativa Reskilling for Employment (R4E) da European Roundtable for Industry (ERT), associação que reúne cerca de 60 líderes das maiores empresas europeias, entre as quais a portuguesa Sonae e a espanhola Telefónica.
Marta Cunha lembra que Portugal foi o país de maior sucesso com o programa de requalificação Promove, “porque conseguimos fazer uma parceria público-privada, que é algo que nos outros países foi mais difícil de conseguir” e que foi da iniciativa portuguesa avançar com a NCN. Mas o que se pretende “é que o ecossistema viva para além da Sonae”.
Embora a rede esteja a começar em Portugal e Espanha, a ideia é que depois se estenda aos vários países europeus. Sendo que “Finlândia e Suécia serão provavelmente os próximos”.