Portugal levará mais de três anos a repor o emprego destruído na pandemia de 2020

Só o ano de 2020 fará evaporar 114 mil postos de trabalho. Depois, serão repostos 107 mil até 2023. Não chega.
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O mercado de trabalho português parece ser, cada vez mais, o elo mais fraco da retoma pós-pandemia. Segundo contas do Dinheiro Vivo (DV) com base nas novas projeções do Banco de Portugal (BdP), será preciso mais três anos, no mínimo, para o país recuperar os empregos perdidos só durante este ano de pandemia (2020).

Em 2020, o BdP estima que o emprego possa recuar 2,3% (o pior registo desde 2013, em plena era do ajustamento do governo PSD-CDS e da troika), o que equivale a menos 114 mil postos de trabalho.

No entanto, a retoma esperada até 2023, inclusive, não dá para apagar isto. De acordo com os nossos cálculos assentes nas novas projeções reveladas por Centeno, a economia só deve conseguir criar 107 mil empregos em três anos.

O novo governador do banco central, Mário Centeno, não esconde que o cenário é complicado e "muito incerto". O terceiro trimestre deste ano até correu menos mal do que se pensava, mas a reta final nem por isso. Surgiu uma segunda vaga da pandemia que conduziu a novas medidas de confinamento e esse efeito depressivo (na confiança e nas atividades) terá um efeito de arrastamento 2021 adentro.

"No final de 2021, o produto interno bruto (PIB) português ainda estará 3,4% abaixo do nível do final de 2019", ilustrou.

Na conferência de imprensa de apresentação do novo boletim económico, Centeno não excluiu sequer que podemos cair numa terceira vaga, mas desdramatizou dizendo que "é expectável que se uma terceira vaga suceder, toda esta aprendizagem, e num contexto em que já há vacinação, se possa esperar um efeito muito mais contido na economia".

Mesmo com vacinas, com fundos europeus e muito dinheiro a fundo perdido, o Banco de Portugal não vê uma retoma fulgurante na medida em que se consegue apagar a recessão de 8,1% esperada para este ano.

Já a retoma da economia portuguesa em 2021 foi fortemente revista em baixa pelo Banco de Portugal, em linha com que já tinha sido feito pelo BCE em relação à zona euro, na semana passada.

Mário Centeno revelou que a recuperação vai ser, afinal, na ordem dos 3,9% no ano que vem, bem abaixo dos 5,2% previstos há seis meses, quando a economia estava a sair do confinamento geral.

No entanto, a economia vai crescer menos do que se esperava, cerca de 3,9% em 2021. Mas depois avança mais do que o previsto em junho, cerca de 4,5% em 2022, calcula o BdP.

"As projeções mantêm a estimativa para o PIB de 2020 divulgada em outubro, devido à conjugação de dois fatores de sentido oposto: a recuperação no terceiro trimestre foi superior ao antecipado, mas a evolução da pandemia e das medidas de contenção levaram à revisão em baixa da atividade no quarto trimestre", explica o banco central no boletim económico divulgado esta segunda-feira.

Depois disto, "as projeções assumem que as restrições são gradualmente retiradas a partir do primeiro trimestre de 2021, embora a atividade permaneça condicionada até ao início de 2022, altura em que uma solução médica eficaz estará plenamente implementada. A atividade económica deverá retomar o nível anterior à pandemia no final de 2022", espera o banco central.

Claro que esta retoma prevista pelo BdP assenta bastante nas decisões de política monetária, que permitem manter os juros em quase zero, e nas medidas orçamentais de resposta à crise.

O banco central refere que a recuperação "traduz-se numa melhoria no mercado de trabalho, perspetivando-se um aumento do emprego a partir de meados do próximo ano". Mas é uma melhoria envergonhada. A expansão do emprego fica bastante aquém na expansão da economia.

Em termos gerais anuais, o emprego deverá cair 2,3% neste ano e depois quase estagna. Não avança nada em 2021 (0%) e em 2022 ganha uns meros 1,3% e no ano seguinte fraqueja, subindo apenas 0,9%.

Sem grande criação de emprego, e mesmo com fundos europeus e subsídios a fundo perdido, a taxa de desemprego aumenta para 7,2% da população ativa em 2020 e ainda piora para 8,8% em 2021. Em 2022, o alívio do desemprego pode ser apenas marginal, para cerca de 8,1%. Portanto, o desemprego alto veio para ficar durante alguns anos.

Seja como for, todas estas previsões estão fragilizadas por uma "elevada incerteza, estando dependentes da evolução da pandemia e da rapidez da vacinação em larga escala"; mas assentam no pressuposto de que Portugal (e os restantes países europeus) vai ter bastante dinheiro (muito dele a fundo perdido) vindo da Europa para gastar em novos investimentos (verdes, de preferência) e novas tecnologias.

"Ao longo do horizonte de projeção (2020-23), os beneficiários finais em Portugal receberão em média 3,4% do PIB por ano relativos a subvenções europeias, um valor superior à média no período de 1989 a 2019 (2,6% do PIB), estimando-se que se atinjam máximos em 2022 e 2023", acena Mário Centeno.

"Estas estimativas são superiores às do Boletim Económico de junho de 2020 (2,5% do PIB, em média, no período 2020-22), essencialmente devido à incorporação do novo instrumento NGEU [Next Generation EU]", mostra o banco central.

Portanto, agora, e muito mais do que no passado, Portugal vai depender proporcionalmente mais das subvenções.

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