
O governo estabeleceu em 42 cêntimos o preço por litro de vinho que os produtores nacionais poderão enviar para queima, de modo a minimizarem os excedentes que têm e a arranjarem espaço nas adegas para a próxima vindima. No Douro, por se tratar de uma região de montanha, com custos de produção mais elevados, o valor será majorado em 33 cêntimos, com o pagamento, no total de 75 cêntimos por cada litro de vinho certificado entregue para destilação. Uma valorização que a Federação Nacional das Adegas Cooperativas de Portugal (Fenadegas) compreende e aceita, mas lamenta que não seja extensiva a todas as outras regiões de viticultura de montanha no país, como é o caso do Dão, de Trás-os-Montes ou de Távora-Varosa, entre outras. “Para estes produtores, que têm custos de produção acrescidos, receber 42 cêntimos por litro não é uma ajuda, é um suicídio”, diz o presidente da Fenadegas.
António Mendes não poupa nos elogios ao ministro da Agricultura, por ter conseguido que a União Europeia atribuísse 15 milhões de euros para uma nova destilação de crise em Portugal, a quarta em cinco anos, quando ninguém achava que fosse possível. Mas considera que a implementação da medida não está a ser justa. “Como é que a tutela nos dá indicações que não podemos vender um vinho abaixo do preço de custo e quer que percamos 25 cêntimos por litro ao enviarmos os excedentes para destilação?”, questiona. Para este responsável, um milhão de euros chegaria muito provavelmente, diz, para fazer a majoração positiva das regiões de montanha. “Eu sei que, no caso do Douro, é dinheiro que sai dos cofres do IVDP (Instituto dos Vinhos do Douro e Porto), mas nós também temos dinheiro no Instituto da Vinha e do Vinho que poderia ser usado para colocar alguma justiça neste processo”, considera.
Sem consenso
Curiosamente, no Douro, o reforço dos apoios com recurso a verbas do IVDP não é consensual, com Rui Paredes, presidente da Federação Renovação do Douro, a lamentar que a valorização dos vinhos durienses na destilação seja feita com dinheiro que vem de taxas pagas pelo setor, “e que deviam ser alocadas à promoção”. Para o responsável, o ideal seria que o governo “alocasse à destilação parte das verbas que ficaram por usar do VITIS”, o programa de reestruturação e conversão de vinhas. “Pudera, as pessoas não estão disponíveis para investir. Neste momento, esta não é uma atividade lucrativa, bem pelo contrário”, frisa.
Também o presidente da Associação das Empresas de Vinho do Porto considera justa a majoração do preço dos vinhos durienses, mas lembra que é feito com taxas pagas pela região. “O governo não está a dar nada ao Douro”, sustenta António Filipe, defendendo que é preciso tomar também medidas estruturais, designadamente com “apoios ao abandono voluntário” da viticultura. “Não há forma nenhuma de escoarmos estas quantidades enormes que produzimos”, diz, lembrando que as vendas de vinho do Porto, em volume, estão em queda continuada há mais de 20 anos.
Bruxelas admitia que os 15 milhões pudessem ser “complementados, até 200%, com fundos nacionais”, mas o governo decidiu, apenas, usar cerca de 3,5 milhões de euros dos saldos de receitas próprias do orçamento do IVDP para permitir uma valorização dos vinhos da região. Sendo que, dos 15 milhões, 30% serão para escoar vinhos durienses. Significa isto que, no máximo, serão escoados por esta via 35,7 milhões de litros, dos quais 10,7 milhões no Douro. Isto quando a própria Fenadegas estima que os excedentes possam rondar os 120 milhões de litros. Outros apontam 200 milhões.
Francisco Toscano Rico, presidente da Andovi, não quer avançar para já com estimativas se as verbas disponíveis chegam ou não, quer é saber se o governo estará disponível para disponibilizar as verbas do IVV, tal como fez no Douro. “O IVV tem dois milhões de euros cativos do orçamento de 2024 e muitos mais em saldo de gerência”, sustenta. Mas acrescenta que reforçar o envelope só por si “não resolve o problema, será apenas mais um paliativo”. É preciso mais fiscalização, quer da ASAE, quer dando meios às comissões vitivinícolas regionais para melhor controlarem a origem dos vinhos, designadamente os importados.
Refira-se que Portugal tem vindo, desde 2019, a importar 300 milhões de litros de vinho ao ano. Definido está já que, quem importou vinho nas últimas três campanhas, não poderá submeter excedentes à destilação. O prazo de submissão de candidaturas arranca às 9 horas de hoje e termina às 17 horas do dia 16 de agosto.
O regime de apoio destina-se exclusivamente à destilação de vinhos tintos a granel, com denominação de origem (DOP) ou indicação geográfica protegida (IGP), estando excluídos os vinhos licorosos. Cada produtor ou vitivinicultor só poderá candidatar à destilação - com vista à produção de álcool destinado exclusivamente a fins industriais ou energéticos - até 30% do volume total de vinhois que declarou como aptos à certificação DOp ou IG na campanha de 2023/2024. Um limite criticado pelo presidente da Andovi. "30% não faz sentido quando vamos ter excedente de candidaturas; com isto só estamos a prmitir que alguns inflacionem ainda mais [os excedentes] a contar com o rateio. E traz mais custos administrativos e financeiros com a certificação dos vinhos, quer para as empresas quer para as CVR", diz Francisco Toscano Rico, que preferia que cada operador pudesse candidatar apenas o equivalente a 20% da sua produção na última vindima.