Portugal é dos menos amparados pelo BCE e taxa de juro volta a subir

Desde meados de 2022, Banco Central Europeu parece ter tido mão mais pesada com Itália, Alemanha e Portugal nos programas de dívida, mas menos com Irlanda e Eslovénia. Taxa de juro portuguesa furou novamente barreira dos 3%.
Christine Lagarde, presidente do BCE. Fotografia: Kirill KUDRYAVTSEV / AFP
Christine Lagarde, presidente do BCE. Fotografia: Kirill KUDRYAVTSEV / AFPKirill KUDRYAVTSEV / AFP
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Portugal está entre os países da Zona Euro menos amparados pelo Banco Central Europeu (BCE) no âmbito dos dois programas de compras de dívida pública (o PSPP, criado em 2014 para combater a crise do euro, e o PEEP, criado em 2020 por causa da pandemia), que têm vindo a ser descontinuados de forma gradual desde o início de 2022.

Esta redução no valor dos títulos detidos e conservados no balanço do Eurossistema (BCE e bancos centrais nacionais) é significativo e, na reta final do ano passado, a taxa de juro de mercado portuguesa (longo prazo, nas OT - Obrigações do Tesouro a dez anos) registou uma subida muito pronunciada.

Estava em 2,5% no início de dezembro e ontem furou a barreira dos 3%, pela primeira vez desde meados do ano passado, o que pode agravar os custos da dívida, que entram como despesa no Orçamento do Estado.

De acordo com um levantamento feito pelo DN, desde julho de 2022, quando se iniciou o aperto monetário (subida de taxas de juro diretoras, incluídas) para reduzir a inflação, então muito elevada (chegou a ultrapassar os 10%) e propulsionada pela guerra contra a Ucrânia, o Eurossistema (BCE e Banco de Portugal) cortou nos volumes que detém em dívida portuguesa (no total dos dois programas referidos, PSPP aqui e PEPP aqui) em mais de 10%.

Nesse mês de julho, conservava no seu balanço o equivalente a 89,6 mil milhões de euros em dívida pública portuguesa. Ontem, quarta-feira, o BCE atualizou estes dados e revelou que no final de dezembro tinha na sua posse 80,2 mil milhões de euros.

É uma redução de 9,4 mil milhões de euros em apenas dois anos e meio, valor que se traduz no corte referido de 10,5%.

Os títulos não foram "reinvestidos", foram despejados nos mercados, o que equivale a uma venda de grandes proporções, que contribui em tudo menos para reduzir a taxa de juro nacional nos mercados secundários.

Este grau de "desinvestimento" do BCE só é maior nos casos de Itália (menos 14%), Áustria (menos 14%), Alemanha (menos 13%), Chipre e Finlândia (ambos com reduções superiores a 11% no volume de dívida ainda detida pela rede de bancos centrais).

A mão de Frankfurt tem sido menos pesada para países como Eslovénia (corte de 1,6%) ou Irlanda (corte de 6,6% desde julho de 2022), indicam cálculos feitos pelo DN ao ponto da situação em dezembro de 2024.

Como se sabe, o BCE continua a desfazer-se das obrigações que comprou aos países do euro (programa PSPP, da crise do euro, e PEPP, da pandemia), mas está a fazê-lo, neste ciclo recente, com maior velocidade no caso de Portugal do que na maioria dos países.

O objetivo da instituição presidida por Christine Lagarde é fazer este 'desmame' de forma equilibrada e "proporcional", respeitando o peso dos países na Zona Europa (a chave de capital que cada Estado-membro detém no BCE).

No entanto, percebe-se que nesta fase de aperto monetário, o amparo tem sido menos generoso para Portugal.

Como referido, é natural que isso contribua para aumentar as taxas de juro soberanas ou, pelo menos, subir a pressão do custo da dívida portuguesa, o que tem acontecido, apesar dos "resultados positivos" entregues por Portugal em termos orçamentais (excedentes e reduções significativas no peso da dívida).

No ponto em que estamos, o cenário é de incerteza muito elevada quando aos impactos nas economias, isto apesar de as taxas de juro do BCE já terem começado a descer novamente. Lagarde admite que o grau de restrição imposto pelo BCE ainda é elevado e necessário porque a inflação não está devidamente ancorada aos desejados 2% no médio prazo. Há solavancos por causa das guerras e das ameaças cada vez maiores ao comércio internacional, referiu a líder do BCE.

Por exemplo, como noticiou recentemente o DN, a República Portuguesa parece não estar a colher, pelo menos nesta fase, grandes benesses no custo da nova dívida emitida: a taxa média global das novas emissões (BT - Bilhetes do Tesouro, OT - Obrigações do Tesouro, etc.) está congelada desde maio, não saiu do planalto dos 3,4%, valor onde se manteve estacionada até novembro, mostram números do Ministério das Finanças (IGCP, a agência que gera a dívida pública nacional).

E, como referido, a taxa das OT a dez anos furou ontem a barreira dos 3%, o valor mais alto dos últimos seis meses.

Aquela estagnação no custo da nova dívida emitida -- uma medida calculada pelo IGCP, tutela do ministro Joaquim Miranda Sarmento -- é problemática porque Portugal continua a ter uma das dívidas mais elevadas da Zona Euro.

O País tem vindo a reduzir este fardo, é certo, mas se as novas emissões não ficarem mais baratas, a fatura paga em juros, que continua a subir, ano após anos, vai demorar mais a inverter esta tendência, atrasando a consolidação orçamental imposta pelas regras europeias (Pacto de Estabilidade).

Portugal conta pagar só em juros 7,2 mil milhões de euros em 2024, mais 6% do que em 2023, segundo as Finanças, no Orçamento do Estado.

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