A ciência está a acelerar e o desenvolvimento de novas tecnologias está a contribuir para isso. Que o diga Pedro Matos Pereira, investigador no Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier (ITQB-NOVA), da Universidade Nova de Lisboa. "A tecnologia influencia tudo o que fazemos no laboratório. Uma das tecnologias que eu exploro - e no desenvolvimento da qual também participo - é a microscopia de fluorescência que hoje em dia permite ver (e que não permitia há dez ou 20 anos), em grande detalhe, o que se passa dentro das nossas células", explica Pedro Matos Pereira, cuja pesquisa se foca "em bactérias que até há pouco tempo não sabíamos que podiam entrar nas células humanas".
"Uma bactéria é mil vezes mais pequena do que um fio de cabelo, e agora conseguimos ver em grande detalhe o que se passa dentro dela. Conseguimos ver proteínas, estruturas, a maneira como ela se divide, conseguimos ver um sem número de coisas que antes não conseguíamos ver", avança o investigador, que é bolseiro da Fundação La Caixa, na DV Talk sobre a forma como a tecnologia influencia os projetos de investigação científica, que será transmitida esta terça-feira, às 15 horas, e que conta também com a participação de Pedro Couto, Associate Director da Accenture Tecnology.
A equipa de Pedro Matos Pereira também faz uso, por exemplo, da Inteligência Artificial (IA). "A IA é utilizada na microscopia para acelerar a maneira como adquirimos data, e para explorar os dados que nós temos, porque o olho humano é sujeito a bias, e nós conseguimos utilizar os computadores para ter uma visão mais neutra. E, por outro lado, nós temos outras circunstâncias em que a IA pode ser utilizada....tudo o que são processos repetitivos podem ser automatizados. Além de permitir escalar a quantidade de dados que conseguimos analisar, que para uma pessoa só não seria possível", afirma.
Para o investigador do ITQB-NOVA, o potencial da IA no futuro da ciência "é gigante" e é transversal a todas as áreas do conhecimento. O fator humano será sempre necessário, mas "automatizando processos aceleramos a descoberta, e tudo isso é música para os ouvidos de qualquer cientista", sublinha.
Sobre se os laboratórios nacionais estão bem equipados, com a tecnologia mais recente, Pedro Matos Pereira diz que "há uns bem equipados e outros menos bem equipados, tem a ver com capacidade de financiamento. Por exemplo, há uns anos houve um projeto de infraestururas que permitiu equipar muitos laboratórios com microscópios fantásticos. Houve um grande boom na investigação que se faz em Portugal, mas entretanto essse projeto acabou e não foi substituído". O resultado, acrescenta, é que " é difícil manter uma cadência constante no investimento em investigação, é por ondas... E a única fonte que nos permite ter acesso a crème de la créme da tecnologia geralmente são os fundos europeus".
Pedro Couto, Associate Director da Accenture Technology, considera que "os laboratórios não são mais do que um espelho do que existe nas outras organizações". E concorda com Pedro Matos Pereira: se há organismos que são o "crème de la crème", outros há que estão longe disso. A transformação digital, considera o consultor, é uma necessidade para todas as organizações, sejam empresas ou laboratórios, e a covid-19 veio dar um empurrão ao processo. "O que é engraçado é que uma empresa como a minha, que anda a advogar que tem de haver uma transformação digital, foi completamente ultrapassada por uma coisa tão pequenina como a covid -19. A covid-19 veio trazer-nos talvez o maior avanço em termos de transformação digital forçada".
O consultor da Accenture explica que as empresas estão a usar IA, machine learning e robotização de processos "para ganhar valor e alavancagem relativamente aos seus concorrentes. E isso vê-se de uma forma incrível na mudança de processos nos últimos anos", sublinha.
Sobre os muitos milhões de fundos europeus de que o pais beneficiará no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência e do Portugal 2030, Pedro Couto espera "que o dinheiro que aí vem seja bem utilizado e que os projetos a serem desenvolvidos pelas empresas e organismos nos façam, de facto, avançar". Além disso, considera que "durante muitos anos olhou-se para os doutorados como aqueles senhores que trabalham nas universidades e não têm grande coisa para fazer dentro das empresas... É importante ir buscar estas pessoas, sobretudo nestas áreas como a IA e análise de dados", defende.
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