A economia portuguesa está a conseguir manter uma posição excedentária face ao exterior (ou seja, ainda não regista necessidade global de financiamento) porque as famílias residentes têm vindo a acumular alguns trimestres de capacidade significativa de poupança. A taxa de poupança foi muito elevada em termos históricos no segundo e no quarto trimestre do ano passado, por exemplo, mostram novas estatísticas oficiais..As contas nacionais por setores institucionais, ontem (segunda-feira, 24 de junho) divulgadas pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), indicam que a resistência dos níveis de poupança dos particulares, influenciada pelo aumento dos preços de muitos bens e serviços de consumo e puxados pela subida das taxas de juro, parece estar a compensar o regresso do défice nas contas públicas no primeiro trimestre, garantindo que a economia como um todo não se torna deficitária outra vez. Por enquanto, claro..Recorde-se que, na mais recente avaliação da Comissão Europeia (CE), sob o chapéu do chamado Semestre Europeu, concluiu-se que "Portugal já não regista desequilíbrios" macroeconómicos, tendo sido elogiado por isso..O País também já tinha saído (em 2017) da situação de défices excessivos (superiores ao máximo previsto no Pacto de Estabilidade, de 3% do PIB - Produto Interno Bruto), não obstante as contas terem depois resvalado por causa da pandemia. A seguir recuperaram (o saldo orçamental) para terreno positivo..Portanto, atualmente, confirmou há dias a Comissão Europeia, Portugal aparece finalmente como um país globalmente equilibrado a nível económico e financeiro..Para prolongar este status, é preciso, claro, que o governo continue a entregar excedentes orçamentais para reduzir a dívida pública excessiva, como tem acontecido. O atual governo PSD-CDS já prometeu que é para continuar esta trajetória..No destaque da nova edição relativa às contas nacionais até ao primeiro trimestre deste ano, ontem publicado, o INE recorre à medida das médias móveis (o valor médio para as variações dos vários agregados no ano terminado no primeiro trimestre de 2024)..Diz que "a capacidade de financiamento das Famílias situou-se em 2,2% do PIB no 1º trimestre de 2024, o que representa um aumento de 1 ponto percentual (p.p.) face ao trimestre anterior" e que "este comportamento resultou de um aumento de 24,6% da poupança das Famílias"..Assim, continua o INE, a taxa de poupança das famílias residentes em Portugal "atingiu 8% [do RDB ou Rendimento Disponível Bruto], o que representa um incremento de 1,4 p.p. relativamente ao trimestre anterior".."Este desempenho foi consequência do aumento de 2,6% do RDB (1,4% no trimestre anterior), superior ao crescimento de 1,1% do consumo privado"..O INE explica que "as variáveis aqui apresentadas estão em termos nominais, o que, no caso do consumo privado, significa que a sua evolução é marcada pelo crescimento dos preços"..Ou seja, aplicado o efeito da inflação, que foi muito elevada, em termos reais, o consumo privado quase estagnou, "aumentou 0,3% no ano acabado no 1º trimestre de 2024", o que contribuiu para o tal reforço da poupança..O instituto refere que, muito devido a este impulso dado pelas famílias, "a economia portuguesa registou uma capacidade de financiamento de 3,2% do PIB no 1º trimestre de 2024, que representa um aumento de 0,5 pontos percentuais (p.p.) face ao trimestre anterior", e que o "aumento do saldo externo da economia refletiu a melhoria do saldo das Famílias"..Este excedente acabou por acomodar o reaparecimento do défice orçamental público no primeiro trimestre de 2024, ainda que em termos médios no ano que termina em março, a situação financeira das Administrações Públicas ainda continue a ser excedentária, o que se compreende, já os excedentes trimestrais foram muito elevados, sobretudo no terceiro trimestre do ano passado, quando atingiu quase 8%, um recorde..Assim, diz o INE, "o saldo do setor das AP diminuiu 0,3 p.p. no ano terminado no 1º trimestre de 2024, passando de uma capacidade líquida de financiamento de 1,2% para 0,9% do PIB".."Considerando os valores trimestrais e não o ano acabado no trimestre, o saldo das AP no 1º trimestre de 2024 atingiu -118,9 milhões de euros, correspondendo a -0,2% do PIB, o que compara com 1,1% no período homólogo. Face ao mesmo período do ano anterior, verificou-se um aumento de 7,3% da receita e de 11% da despesa", quantifica o INE..CE até deu os parabéns a Portugal.No passado dia 19 de junho de 2024, nas conclusões do ciclo de 2024 do Semestre Europeu, a Comissão concluiu que "Portugal já não regista desequilíbrios macroeconómicos" e que, em especial, "registou progressos significativos na redução das vulnerabilidades relacionadas com a elevada dívida privada, pública e externa, esperando-se que continuem a diminuir".."Após uma interrupção no ajustamento provocada pela crise pandémica da Covid-19, os rácios da dívida do setor privado e da dívida pública reataram a sua descida" e "recuaram substancialmente desde 2021, ajudados pelo forte crescimento do PIB e por um excedente orçamental recente, no caso do rácio da dívida pública"..Este último chegou a estar acima dos 130% no rescaldo da crise do euro e do resgate português, agora está perto de 90%, mas muito além, ainda, do limite máximo de 60% imposto pelo Pacto de Estabilidade..Bruxelas diz ainda que "a posição de investimento internacional líquida [PIIL] claramente negativa de Portugal tem vindo a melhorar substancialmente, ajudada por um crescimento económico acentuado e um excedente da balança corrente, e a sua estrutura permanece favorável à luz da elevada percentagem de instrumentos não reembolsáveis".."O endividamento privado e público e a PIIL negativa permanecem elevados, mas prevê-se que continuem a diminuir no futuro, apesar de o crescimento nominal do PIB se tornar menos favorável".."A balança de transações correntes voltou a registar um excedente no ano passado, prevendo-se que se mantenha positiva neste ano e no próximo, tendo sido alcançado um excedente orçamental"..Já o aumento das taxas de juro por parte do Banco Central Europeu (BCE) "exerceu alguma pressão sobre as famílias endividadas e os preços da habitação têm vindo a registar um forte crescimento desde há vários anos", acrescenta a CE..Em todo o caso, as recomendações a Portugal vêm com várias críticas e avisos sobre a necessidade de cortar despesa (benefícios fiscais, que são despesas em sede de impostos, por exemplo) porque a dívida continua demasiado elevada e é preciso que desça ainda mais.