
As câmaras municipais de Monção e Melgaço uniram-se e criaram, em 2020, o projeto Nutrir, coordenado por Nuno Vieira e Brito, com o objetivo de valorizar os produtos da região do Alto Minho. As primeiras produções deverão chegar ao mercado no próximo ano, após um investimento global à volta dos sete milhões de euros.
Passar das ideias à prática implicou o lançamento de uma candidatura no âmbito do programa Recursos Humanos Altamente Qualificados, liderada pelo Instituto Politécnico de Viana do Castelo e a cargo da Comissão de Coordenação de Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), para criar um núcleo de estudos e transferência de conhecimento em prol da região.
Foi então possível contratar três doutoradas, que se fixaram na Escola Superior de Desporto e Lazer, em Melgaço, cada uma com a missão de contribuir para um plano estratégico com três vertentes distintas: viticultura e enologia; recursos endógenos (vegetais e animais); e paisagem e sustentabilidade do território. Com um só foco: “Revitalizar a alma da região e de tudo o que lhe é intrínseco”, como diz Nuno Vieira e Brito.
Para cada uma das três áreas definiram-se linhas de estudo que permitissem acomodar a transferência de conhecimento para os produtores e empresas, sabendo que “40% do território em causa tem interesse para a conservação da natureza”, embora tenha vindo a perder população, um trajeto que os promotores do projeto pretendem reverter.
Quanto ao vinho, o estudo visou identificar castas tintas minoritárias, mas autóctones da região, bem como apurar a melhor localização das vinhas (na montanha ou na várzea), e o seu compasso (distância entre elas), face às alterações climáticas. O estudo avançou também para o Vale do Lima, neste caso específico, para a casta loureiro e a sua importância naquela zona. “No caso do vinho, algumas castas minoritárias já estão identificas e caracterizadas, com a definição de um terroir da região Monção/Melgaço em fase de conclusão”.
Na parte do território e sua sustentabilidade, e relativamente ao aproveitamento dos recursos, o processo implicou, numa primeira fase, inventariar as tradições e as crenças sobre o uso de certas plantas, registando a indicação terapêutica para cada uma delas, bem como os modos de preparação e administração. Dessa análise - prossegue Nuno Vieira e Brito -, fez-se uma seleção de 15 plantas, em particular na Serra da Arga e no Parque Nacional da Peneda-Gerês, para, em laboratório, “identificar e quantificar o teor de compostos que poderiam ser utilizados na promoção da saúde humana e animal, na cosmética e nas indústrias alimentar e têxtil”.
Destaca, em especial, o sanguinho de água, planta adequada a locais húmidos e cuja análise revelou capacidades antioxidantes, com elevado teor de antocianinas, o que ultrapassa o mero interesse nutracêutico (combinação dos termos “nutrição” e “farmacêutico”) , revelando potencialidades para ser usada como corante alimentar, mas também na indústria têxtil, motivo pelo qual os promotores do projeto Nutrir fizeram uma parceria com o CITIVE (centro de investigação para os têxteis), para estudar a sua incorporação em fibras vegetais, para lhes dar a cor azul-roxa.
Na parte dos recursos endógenos animais, a investigação centrou-se sobretudo nas zonas de montanha onde é característico o fumeiro tradicional. “Mas - como diz Nuno Vieira e Brito - há muitas tradições que se estão a perder”. Por esse motivo, recorreu-se ao programa “Interior +”, no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), ainda em curso.
Apesar de em Melgaço já haver uma Indicação Geográfica Protegida (IGP) para o fumeiro, entendeu-se que se deveria estimular a produção animal, de forma sustentável, e a sua transformação para ser colocada no mercado, como forma de “manter as populações no território e garantir o equilíbrio da paisagem”. A prova é que já há uma produtora de fumeiro que deverá avançar para a criação do seu próprio emprego e montar uma pequena indústria transformadora.
O programa Recursos Humanos Altamente Qualificados terminou no final de 2023, mas os promotores tencionam continuar com o financiamento e admitir mais jovens qualificados. No início eram as três doutoradas, agora são sete no total, graduados com doutoramentos e mestrados, demonstrando que a ambicionada criação de valor na região do Alto Minho começa nas pessoas.
No último mês de junho, o Nutrir promoveu um encontro oficial para divulgação do trabalho até aqui realizados, no qual participaram os parceiros do programa, onde se incluem empresas e instituições portuguesas, bem como galegas, uma vez que do lado de lá da fronteira decidiram replicar o projeto.