Principais bancos com metade dos balcões e menos 12 mil trabalhadores do que há dez anos

Redução de agências e pessoal desde 2013 foi drástica. Evolução tecnológica e mudança nos hábitos dos consumidores são as justificações apresentadas pelo setor, mas sindicatos apontam “obsessão com os lucros” como principal motivação e exigem ao regulador “algum serviço público”.
FOTO: Artur Machado/GI
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Na última década, as seis principais instituições bancárias a operar no país reduziram a sua rede de distribuição conjunta em 48% e dispensaram cerca de 30% dos trabalhadores, de acordo com um levantamento feito pelo DN/Dinheiro Vivo aos relatórios financeiros dos bancos BPI, Caixa Geral de Depósitos (CGD), Millennium BCP, Montepio, Novobanco - que nasceu do Banco Espírito Santo - e Santander Totta.

O emagrecimento foi expressivo e, em termos absolutos, significa que, enquanto, em 2013, estas entidades totalizavam cerca de 3999 balcões de atendimento em território nacional, no final do ano passado contabilizavam 2084, ou seja, menos 1915. O BPI e o Novobanco foram os que mais reduziram, em 380 e 353 sucursais, respetivamente, o que equivale a 55% da sua rede comercial de há dez anos. O Montepio, por seu turno, encerrou 49% das agências (-224), o Millennium 48% (-375), o Santander 47% (-293) e a Caixa 36% (-290).

Do lado dos trabalhadores, a mesma tendência se verificou: de 40 704 passaram a 28 432, traduzindo isto um decréscimo das equipas em 12 272 pessoas. Nas seis instituições, as entradas não compensaram as saídas, nomeadamente na que pertence à Lone Star - viu sair 43% da sua força de trabalho, o correspondente a 3162 colaboradores. O BPI e a CGD dispensaram 32% (-2011) e 31% (-2806), pela mesma ordem, e o BCP e o Montepio cerca de 2342 e 1043 empregados, uma redução de 27% em ambos os casos. Já o Totta registou a menor diminuição em termos absolutos (-908) e percentuais (16%).

Segundo os dados divulgados no final do exercício passado, a Caixa Geral de Depósitos liderava em número de profissionais (6243) e agências (515) na atividade doméstica, precedida pelo Millennium - 6242 e 399, respetivamente - e pelo Santander, que tinha 4615 trabalhadores e 332 sucursais. O BPI (4263/316) surge em seguida, juntamente com o Novobanco (4209/290) e o Montepio (2860/232).

Fatores económicos, como a crise financeira de 2008, que impôs melhorias ao nível da eficiência operacional dos bancos, tecnológicos e até mesmo sociais, que se repercutiram na crescente digitalização do setor e nos hábitos dos próprios consumidores, ajudam a explicar os cortes. Nas contas, nomeadamente na rubrica dos custos com pessoal, o efeito também foi visível, com todas as instituições, à exceção do Santander, a apresentarem baixas: em conjunto, a despesa reduziu-se em torno dos 34%, o mesmo que dizer 726 milhões de euros.

“Obsessão com o lucro”

Confrontando com os números da última década, António Fonseca, presidente do Mais Sindicato, uma das estruturas afetas à UGT, afirma que a justificação apresentada pelas entidades patronais para o decréscimo de colaboradores e balcões é a de que “o trabalho vai ficando cada vez mais automatizado e, por isso mesmo, não é necessário tanta gente”. 

Dependendo da política de cada banco, explica, as saídas efetivam-se através de reformas antecipadas ou rescisões por mútuo acordo. Mas, recentemente, houve mesmo quem tivesse recorrido ao despedimento coletivo - é o caso do Millennium BCP e do Santander, contra quem este sindicato diz ter, no conjunto, mais de 40 ações em tribunal.

Embora reconheça que, ao longo do tempo, os bancos se tenham tornado mais avançados tecnologicamente, o dirigente sindical considera que o declínio registado não está, na realidade, contrabalançado com a evolução técnica. Se, há dez anos, “abriam um balcão em todas as esquinas”, no âmbito de uma política de proximidade com o cliente, hoje o cenário configura o inverso. E outro motivo é invocado: “A obsessão com o lucro”.

“É a regra do mais fácil, quando uma empresa quer ter mais lucros, corta nos trabalhadores e nos respetivos rendimentos”, aponta o responsável, salientando que esta é uma máxima que em nada compadece com a atual conjuntura de multiplicação de resultados. O sindicato defende que o Banco de Portugal, cuja função é regular e supervisionar o setor, deveria exercer pressão “para que os bancos estivessem obrigados a fazer algum serviço público e não pensassem exclusivamente nos lucros”.

António Fonseca ressalva, no entanto, que os sindicatos não têm nada contra os ganhos das instituições, desejando apenas que estas sejam saudáveis financeiramente, para que possam não só distribuir dividendos aos acionistas, como também prestar um serviço de qualidade à população e refletir esse desempenho na valorização dos seus colaboradores. Neste momento, “não é o que acontece”. 

Por um lado, aumentam as queixas de trabalhadores relacionadas com as dificuldades que os clientes têm em aceder a um serviço presencial, por outro, “tem-se assistido a uma degradação da classe profissional”. A última, causada pela progressiva substituição da mão humana pelas máquinas, assim como pelo alto desgaste da atividade, que tem levado ao agravamento das situações de burnout reportadas ao Mais, e pelas condições salariais, uma vez que os cortes verificados nas equipas “não refletem nenhuma melhoria” a esse nível.

Rendibilidade conjuntural?

No início de 2022, o secretário-geral da Associação Portuguesa de Bancos (APB), Norberto Rosa, afirmou que, apesar de terem apresentado lucros no exercício anterior, os bancos precisavam ainda de “fazer mais cortes na sua estrutura para reduzir custos", tendo em vista a melhoria da sua rendibilidade. 

Em 2023, recorde-se, as seis maiores instituições bancárias do país reportaram um resultado líquido histórico de 4,3 mil milhões de euros, acompanhado por avanços significativos naquele mesmo indicador. 

Nesse sentido, a APB justifica ao DN/Dinheiro Vivo que tais patamares de rendibilidade, relativos ao ano passado, “têm caráter conjuntural, reversível, enquanto as estruturas de custos têm caráter mais duradouro (estrutural)” e que, por esse motivo, “não é razoável extrair a ilação entre uma e outra coisa”. 

Já António Fonseca, em análise àquela consideração, e numa altura em que os sindicatos se encontram a reivindicar um aumento salarial de 6% para 2024 (rejeitado até agora por todos os subscritores do Acordo Coletivo de Trabalho), admite que há momentos melhores e piores, insistindo, porém, na ideia de que, “[para os bancos], quando os resultados eram maus, era porque eram maus. Agora que são bons, não são suficientemente bons. E até já andam a alertar que, em 2024 e 2025, vão ser inferiores”.

Adicionalmente, a associação refere que os "ajustamentos que os bancos têm vindo a fazer nas suas redes e estruturas de recursos humanos não se norteiam apenas por considerações de custos, mas também - e, por vezes, principalmente - por adaptação à evolução das tecnologias e às preferências dos clientes”. Por último, diz, “cada banco concebe e executa a sua própria estratégia, em concorrência com os demais, não havendo, nem podendo haver, qualquer ação conjugada do setor”.

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